Samantha Harvey vence o Booker Prize de 2024 com Orbital

O mais importante galardão britânico de literatura foi atribuído esta terça-feira a Samantha Harvey numa cerimónia em Londres. A obra acompanha as reflexões de seis astronautas no espaço.

Foto
A vencedora do Booker Prize, Samantha Harvey, ganha o troféu Iris e um prémio monetário equivalente a 60 mil euros ANDY RAIN / EPA
Ouça este artigo
00:00
04:18

Samantha Harvey venceu o Prémio Booker Prize de 2024 graças à obra Orbital. A decisão do júri foi anunciada na noite desta terça-feira, 12 de Novembro, numa cerimónia que decorreu no Old Billingsgate, na capital inglesa de Londres. O prémio inclui o troféu Iris, assim chamado em homenagem à escritora irlandesa Iris Murdoch, e uma gratificação de 50 mil libras esterlinas, o equivale a cerca de 60 mil euros.

"Nenhum discurso no Booker foi feito num mundo perfeito, mas é difícil não reconhecer as imperfeições do mundo em que vivemos actualmente", começou por dizer a escrita no seu discurso: "Nós somos, como o Carl Sagan diz no seu livro Cosmos, 'a personificação local de uma consciência evoluída para o autoconhecimento, somos matéria estelar a matutar sobre as estrelas'. Eu acrescentaria que somos matéria terrestre a matutar sobre a Terra. Penso que o meu romance é um exercício dessa reflexão."

Samantha Harvey prosseguiu: "Ver a Terra a partir do espaço é como uma criança a olhar para um espelho e a perceber pela primeira vez que a pessoa no espelho é ela mesma. O que fazemos à Terra fazemos a nós mesmos e o que fazemos à vida na Terra, humanos ou não, fazemos a nós próprios". A escritora voltou a citar Sagan quando sublinhou que "a nossa lealdade é para com as espécies e para com o planeta". "Precisamos de falar pela Terra", defendeu o divulgador científico.

"Gostava, por isso, de dedicar este prémio a quem fala a favor, e não contra, a Terra. A quem fala a favor, e não contra, a dignidade de outros humanos e outras vidas. A todas as pessoas que falam a favor da paz. Este prémio é para vós", terminou a escritora.

Orbital conta a história de seis astronautas que estão na Estação Espacial Internacional a realizar um trabalho científico considerado vital, mas que lentamente se começam a questionar sobre o que seria a vida sem a Terra — e o que seria a Terra sem a humanidade. Todos os dias, em todos os momentos, dão 16 voltas completas ao planeta e cruzam-se incessantemente com paisagens de uma beleza espectacular — um mundo que os continua a atrair mesmo estando fisicamente separados dele.

A certa altura, "recebem a notícia da morte de uma mãe e, com ela, o pensamento de regressar a casa", resume o júri do prémio no site oficial: "Observam o tufão que se aproxima de uma ilha e das pessoas que amam, admirados com a sua magnificência e receosos da sua destruição. A fragilidade da vida humana preenche as suas conversas, os seus medos, os seus sonhos. Tão longe da terra, nunca se sentiram tão parte, ou protectores, dela."

Mais mulheres e nacionalidades entre os candidatos

Os seis finalistas incluíam o maior número de escritores do sexo feminino desde que o prémio foi lançado, há 55 anos. Eram cinco: Anne Michaels com Held, Rachel Kushner com Creation Lake, Samantha Harvey com Orbital, Yael van der Wouden com The Safekeep e Charlotte Wood​ com Stone Yard Devotional. ​O único escritor do sexo masculino entre os finalistas era Percival Everett, autor de James.​

A lista final também incluía autores de cinco nacionalidades diferentes, incluindo o primeiro escritor holandês a ser seleccionado e o primeiro australiano a surgir entre os candidatos ao maior prémio literário britânico em 10 anos. Dois dos nomeados para o Booker Prize deste ano já tinham constado na lista final para o prémio em edições passadas: Rachel Kushner em 2018 graças a The Mars Room e Samantha Harvey em 2009 com The Wilderness.​​

Samantha esteve para desistir de escrever o livro que, desta vez, lhe garantiu o galardão. Questionada pelo motivo, explicou que se perguntava sobre porque é que alguém teria interesse em ler a obra de "uma mulher sentada numa secretária em Wiltshire a escrever sobre espaço, a imaginar sobre o que seria estar no espaço se já tanta gente tinha estado lá". "Achava que não tinha autoridade para escrever este livro", confessou a autora. Agora, a novelista assume que a obra teve um impacto maior do que julgava — até nela mesma. "As horas que passei a olhar para a Terra a partir do espaço mudaram-me profundamente", admitiu.

Os livros que estiveram a concurso foram escolhidos de um conjunto de 156 obras publicadas entre Outubro de 2023 e Setembro de 2024. A decisão final foi tomada por um júri coordenado pelo artista inglês Edmund de Waal. O painel inclui ainda a novelista jamaicana Sara Collins; a editora de literatura de ficção do The Guardian, Justine Jordan; a escritora chinesa Yiyun Li; e o músico e compositor britânico Nitin Sawhney.

Sugerir correcção
Comentar