Palcos da semana: de Alkantara até aos céus, com direito(s) a Finta e risos
Nos próximos dias temos Alkantara Festival, o novo álbum dos Virgem Suta, a “comédia poética” de Duvivier, o festival de teatro da Acert e um novo Ciclo de Cinema de Direitos Humanos.
Entre o inferno e o desejo
O Alkantara Festival sempre foi espaço para desassossegar, sacudir (pre)conceitos, activar consciências, desconfortar. Não admira que abra com uma “descida ao inferno”. É assim que Carla Nobre Sousa e David Cabecinha, directores artísticos, resumem A Noiva e o Boa Noite Cinderela, peça da brasileira Carolina Bianchi em torno de feminicídio, violência sexual e trauma.
Esta edição do festival de artes performativas também dá palco ao exílio palestiniano segundo Basel Zaraa. E à herança e resistência indígena na pele de Tiziano Cruz, Uýra Sodoma ou Émilie Monnet e Waira Nina. Ou à ligação dança-identidade ao ritmo do Hatched Ensemble da sul-africana Mamela Nyamza.
A brasileira Keli Freitas apropria-se do imperativo Volta para a Tua Terra em busca da ascendência lusa. Dana Michel levanta uma questão de produtividade (e seu absurdo). A libanesa Alia Hamdan pausa no momento em que o porto de Beirute explodiu. A Vida Secreta dos Velhos – sim, a sexual – é a proposta de Mohamed El Khatib.
São momentos destes que se espalham por Lisboa, num programa que além de dança e teatro também inclui um concerto (Gal Costa na voz de Puta da Silva), conversas, encontros e festas.
Virgem Suta de instinto afiado
Nuno Figueiredo e Jorge Benvinda, autores de alguma da mais curiosa música feita em Portugal nos últimos 15 anos, fazem pop que é mesmo abreviatura de popular, sem prejuízo da sofisticação observadora, do bom tom boémio e também de um instinto mordaz que agora se afia, ainda mais, No Céu da Boca do Lobo.
No álbum recém-lançado tanto cabe um olhar sobre os directos da televisão, a correria desta vida que são Dois dias, o cansaço de a gastar a trabalhar ou os vieses de um Amor ao avesso como o louvor a um povo que dá gosto de tão bem-disposto. É o quarto disco da dupla e o primeiro desde o Limbo que saiu num já longínquo 2015.
Duvivier no céu do Camões
Já muito testemunhámos o interesse do brasileiro Gregório Duvivier pelas palavras, fosse como comediante, “porta-fundista”, entrevistador, espécie de Sísifo no teatro ou interlocutor de Ricardo Araújo Pereira numa alegre troca de impressões sobre vocábulos chamada Um Português e um Brasileiro Entram Num Bar.
“Tem na língua portuguesa não somente uma pátria, mas uma obsessão”, como sublinha a nota de imprensa do seu novo espectáculo, trazido a Portugal em plena comemoração dos 500 anos do nascimento de Camões.
Essa obsessão tem um único limite (ou não): O Céu da Língua. Não deve ser apresentado como show nem stand-up, para evitar o estrangeirismo. Duvivier prefere falar de uma “comédia poética”. Tudo começa no princípio – era o Verbo. “E logo em seguida vieram os erros de concordância…”
Pela lente dos direitos humanos
O cartaz pode ser reduzido, mas é de luxo e revelador de uma intenção ambiciosa: alertar para o “actual retrocesso civilizacional como resultados dos conflitos bélicos, das desordens territoriais, das desigualdades sociais e das alterações climáticas, cada vez mais agudas”, comunica a organização. A Associação Grande Coisa, o Cineclube de Amarante e a autarquia unem-se para erguer o primeiro Ciclo de Cinema de Direitos Humanos. Vai à tela e não só.
Em domingos consecutivos, projecta os filmes O Outro Lado da Esperança, de Aki Kaurismäki, com a presença do realizador e seguido de uma conversa; Eu Capitão, de Matteo Garrone, seguido de uma conversa com a médica, humanitária e activista Ana Paula Cruz; e O Sal da Terra, de Wim Wenders e Juliano Ribeiro Salgado, a dar o tema a uma mesa-redonda.
Este último documenta o projecto Génesis, do fotojornalista brasileiro Sebastião Salgado (pai de Juliano), a quem pertencem as imagens mostradas numa exposição paralela, O Olhar de Sebastião Salgado. Ecos de Êxodos, onde podem ser revistas – e comparadas com a actualidade – as imagens (duras) de migrações que captou há quase 25 anos, em viagens pelo mundo fora.
É hora de Finta
É com uma Hora Vazia de Zé Mágico que sobe a cortina do 30.º Finta - Festival Internacional de Teatro Acert. Esta “imersão sensorial e introspectiva (...) que explora a natureza do destino e do livre-arbítrio” é uma das três estreias em cartaz, ao lado de uma nova criação de Teresa Machado e outra de Andréa Fernandes.
Formiga Atómica, A Algures, Squadra Sua, Le Puant, Sara Barros Leitão e Leandre Clown são outros criadores em cena. No total, vão 15 espectáculos ao palco desta edição, entre teatro, novo circo, dança, música e outras artes, proporcionados por companhias e artistas de cinco países. Uma exposição, um documentário, oficinas e actividades para crianças e seniores completam a oferta.