“A calamidade climática é a nova realidade”: dez fenómenos extremos de 2024

Num ano de recordes de temperatura, recordamos dez fenómenos climáticos extremos que o planeta testemunhou em 2024. Dos furacões nos Estados Unidos aos incêndios em Portugal, passando pelo Sara verde.

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Sobejam exemplos de fenómenos climáticos extremos em 2024. “A calamidade climática é a nova realidade. E nós não estamos a acompanhar”, afirmava António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, esta quinta-feira, na apresentação de um relatório das Nações Unidas. Abaixo, fazemos uma selecção de dez exemplos de que a Terra está a arder e que a humanidade está exposta, nas palavras de Guterres.

Incêndios destroem vida selvagem no Pantanal

O Pantanal, no Brasil, começou a arder no final de Maio – o que é invulgarmente cedo para esta zona húmida com flora e faunas únicas no mundo –, e os incêndios continuaram durante os meses de Junho, Julho e Agosto, devido à seca extrema, que transforma a matéria vegetal húmida em combustível. Estima-se que, no primeiro semestre de 2024, o fogo destruiu cerca de 2,3 milhões de hectares do Pantanal, segundo dados actualizados do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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Jacaré morto em incêndio no Pantanal, em Corumbá, no estado de Mato Grosso do Sul, no Brasil REUTERS/Ueslei Marcelino

As alterações climáticas provocadas pela acção humana tornaram as condições propícias a incêndios no Pantanal quatro vezes mais prováveis, de acordo com um estudo da World Weather Attribution. Se os diferentes países industrializados continuarem a lançar carbono para a atmosfera, ao contrário do que preconiza a meta do Acordo de Paris, a tendência é que a temperatura média global aumente e, com ela, a intensidade e a frequência de fenómenos climáticos extremos.

Calor mortal em Maio na Índia

Uma forte onda de calor nos estados de Bihar e Odisha, no Leste da Índia, causou a morte de mais de 20 pessoas por insolação em Maio. Embora as altas temperaturas sejam comuns durante o Verão indiano, os valores registados este ano estão acima da média esperada para o período. No final de Maio, em pleno período de eleições, a Índia viu-se obrigada a encerrar as escolas devido a temperaturas que chegaram aos 47,8 graus Celsius. O pior, contudo, ainda estava por vir: Nova Deli, capital da Índia, testemunhou a temperatura recorde de 49,9 graus Celsius no dia 28 de Maio de 2024.

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Um homem tenta apagar o fogo que deflagrou em aterro em Nova Deli, na Índia, a 31 de Maio de 2024, devido ao calor extremo

Ondas de calor fatais em vários países

Centenas de pessoas morreram nos Estados Unidos, no México, no Médio Oriente devido às altas temperaturas registadas em Junho. Na Arábia Saudita, onde os termómetros registavam temperaturas superiores a 50 graus Celsius, 1301 pessoas perderam a vida devido ao forte calor na maior peregrinação muçulmana a Meca. Também a Europa viu os termómetros a subir: em 21 de Junho, foram instalados ventiladores à porta do Coliseu de Roma para refrescar os turistas, por exemplo. O mês de Junho foi, de resto, o mais quente do que qualquer Junho que o planeta já havia registado, com uma temperatura média do ar à superfície de 16,66 graus Celsius.

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Pessoas tentam refrescar-se à frente de um dispositivo instalado para o efeito à volta do Coliseu, em Roma, Itália, no dia 21 de Junho de 2024 REUTERS/Yara Nardi

Fogo obriga milhares a deixar casas na Califórnia

Uma onda de calor e um tempo invulgarmente seco criaram as condições propícias para um conjunto de incêndios florestais na Califórnia, na costa oeste dos Estados Unidos (EUA), que levaram mais de dez mil residentes a deixar as suas residências em Setembro. O tempo quente provocou nesse mesmo mês dezenas de outros fogos rurais nos EUA. As chamas eram tão intensas e a extensão tão alargada que o incêndio de algum modo possuía a sua própria meteorologia: nuvens de fogo capazes de gerar tempestades de raios.

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Bombeiros trabalham no rescaldo de incêndio em Clearlake, na Califórnia, EUA Jungho Kim/REUTERS

Cheias no Norte de África transformam o deserto

No Norte de África, algumas das regiões mais áridas do planeta registaram em Setembro uma precipitação cinco vezes superior à média esperada para o mês. As chuvas fortes afectaram mais de quatro milhões de pessoas em 14 países, de acordo com o Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas. As inundações, por sua vez, mataram ou deslocaram milhares de habitantes e perturbaram actividades agrícolas em zonas onde, agora, já não há alimentos suficientes para as populações.

Como consequência, houve partes do deserto do Sara dramaticamente mais verdes do que o habitual. A NASA documentou uma mudança súbita na paisagem depois de uma tempestade ter descarregado fortes chuvas no Noroeste do Sara, nos dias 7 e 8 de Setembro, encharcando partes de Marrocos e da Argélia, onde tais aguaceiros são raros.

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Imagens de satélite mostram que partes do deserto do Sara estão mais verdes do que o habitual NASA

Rios transbordam na Europa Central

Diferentes rios da Europa Central – incluindo o famoso Danúbio – transbordaram em Setembro, na sequência de chuvas torrenciais associadas à tempestade Boris, deixando muitas cidades da Eslováquia, Hungria, Polónia e República Checa submersas ou afectadas por inundações e detritos. As inundações provocaram mais de 20 mortos. O Governo polaco chegou a declarar o estado de calamidade. Na República Checa, milhares de pessoas tiveram de deixar as suas habitações e outras tantas ficaram sem electricidade e água potável.

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Cheias em Pechea, perto da cidade de Galati, na Roménia ROMANIAN GENERAL INSPECTORATE FOR EMERGENCY SITUATIONS HANDOUT/EPA

Incêndios trágicos regressam a Portugal

Portugal testemunhou em Setembro vários incêndios, que afectaram duramente o distrito de Aveiro – sobretudo os concelhos de Oliveira de Azeméis, Albergaria-a-Velha, Sever do Vouga e Águeda –, e que foram exacerbados por condições meteorológicas extremas, de acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). Os fogos provocaram a morte de sete pessoas. Governo declarou situação de calamidade em todos os municípios atingidos.

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Portugal voltou a testemunhar incêndios trágicos em 2024 Adriano Miranda

Furacão Helene atinge os EUA em Setembro

A passagem do Helene, um furacão de categoria quatro, pelo Sudeste dos Estados Unidos (EUA) no final de Setembro provocou mais de 230 mortos e causou prejuízos de milhares de milhões de dólares em seis estados norte-americanos. É, por isso, considerado o furacão mais mortífero a atingir o território continental dos Estados Unidos desde o Katrina, em 2005.

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Destruição causada pelo Helene em Old Fort, Carolina do Norte, EUA Eduardo Munoz / REUTERS

Em Outubro, é a vez do furacão Milton

No dia 9 de Outubro, cerca de duas semanas após a passagem do Helene, o furacão Milton​, atingiu a costa oeste do estado norte-americano da Florida classificado com a categoria três, causando pelo menos 17 mortes. A tempestade trouxe ventos fortes, inundações e até tornados.

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Passagem do furacão Milton pela Florida Reuters

Chuva diluviana submerge Valência

As inundações que atingiram a região de Valência, na Espanha, há cerca de uma semana, constituem a tragédia mais recente do catálogo de catástrofes alimentadas pelas alterações climáticas este ano. O número de mortos confirmados é de 219, e as autoridades possuem ainda o registo de 93 pessoas desaparecidas. Entre 29 e 30 de Outubro, choveu ao longo de oito horas o equivalente a um ano de chuva em várias localidades da Comunidade Valenciana, de acordo com meteorologistas espanhóis.

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Cheias devastadoras em Valência, Espanha MIGUEL ANGEL POLO/EPA