Polícia guineense acaba com vigília de professores ao cassetete em Bissau
Presidente deposto da Assembleia Nacional da Guiné-Bissau pede ao povo que saia à rua para evitar que o país se torne um “não-Estado”. Feridos e detenções na repressão do protesto de professores.
No dia em que o presidente deposto do Parlamento da Guiné-Bissau pediu ao povo que saia à rua para evitar que o país se transforme num “não-Estado”, uma vigília de professores contra o aumento das mensalidades nas escolas de formação foi interrompida pela polícia de forma violenta, com o uso de cassetetes e detenções arbitrárias de manifestantes.
A cerca de meia centena de professores que se preparava para realizar o seu protesto pacífico em frente ao Ministério da Educação, em Bissau, nem teve tempo de esboçar a sua vigília pois a polícia guineense recorreu logo ao uso da força para impedir a sua realização.
“A polícia chegou e começou logo a bater-nos com cassetetes, sem que nada o justifique”, disse à Lusa Januário Meb, presidente da comissão de professores em fim de formação na ESE – Unidade Tchico Té, na capital guineense. Denunciando ter sido “violentamente agredido”, Meb afirmou que a polícia deteve “pelo menos dez estudantes”, tendo-lhe sido retirados todos os pertences, incluindo os telemóveis.
“Sinto-me honrado por participar numa manifestação desta natureza”, acrescentou, “pena é que aqueles que ontem beneficiaram de escola gratuita do Estado nos estejam a negar o direito de estudar”.
O ministro da Educação, Henry Mané, que duplicou os preços das mensalidades, justificando-se com a necessidade de fazer com que as escolas de formação de professores “possam andar com os próprios pés”, reagiu aos protestos de maneira abrupta, dizendo que “quem não quiser estudar numa escola pública pode ir para a escola privada”.
Num país onde o salário médio ronda os 60 mil francos CFA (91,50 euros), a subida das propinas de cinco mil francos CFA (7,62 euros) para dez mil francos (15,25 euros), para os alunos da licenciatura, e 7500 francos CFA (11,45 euros), causa mossa no fraco orçamento familiar.
A repressão da vigília dos professores chegou no mesmo dia em que Domingos Simões Pereira, líder da coligação PAI-Terra Ranka, que venceu as eleições legislativas com maioria absoluta em Junho do ano passado, veio pedir ao povo guineense que saia às ruas para impedir a “anarquia total” de ter um Estado a funcionar à margem da Constituição e ao sabor dos desejos do seu Presidente, Umaro Sissoco Embaló.
Se até 27 de Fevereiro, data em que deveria expirar o mandato do chefe de Estado, e que o próprio já disse que não irá cumprir, pois pretende só marcar as eleições presidenciais para o próximo ano, “o povo não assumir a sua responsabilidade de sair à rua e exigir a reposição da normalidade, vai concretizar-se o tal não-Estado”.
Simões Pereira convocou para esta quarta-feira uma conferência de imprensa para analisar a actual situação política, depois de o Presidente ter anunciado o adiamento das eleições legislativas de 24 de Novembro que tinha marcado à revelia das direcções de quase todos os partidos com assento parlamentar.
Com o fim do mandato de Embaló a 27 de Fevereiro, “todas as instituições que têm a vocação e responsabilidade de zelar pela aplicação da lei, ou foram sequestradas ou foram subtraídas na sua competência, ou foram simplesmente atrofiadas nas suas competências”, sublinhou, citado pela Lusa.
Para Domingos Simões Pereira, citado pela Lusa, o Presidente guineense “aniquila a Constituição” e põe “em causa a existência de outros órgãos de soberania”, por isso, é importante que o povo saia à rua reclamar os direitos à reunião, à manifestação e à organização que “este regime tenta subtrair”.
O presidente da Assembleia Nacional Popular, destituído inconstitucionalmente pelo chefe de Estado pouco mais de cinco meses depois do começo da legislatura (quando a Constituição especifica que devem passar pelo menos 12 meses), anunciou uma manifestação nacional em data a anunciar depois da reunião interna da coligação desta quinta-feira. “Será um apelo da nação ao resgate da democracia e do Estado de direito democrático.”