COP29: contas “suspeitas” no X promovem Governo do Azerbaijão para “fingir” apoio popular
A ONG Global Witness acredita ter descoberto esquema digital na rede social X para criar uma impressão artificial de apoio popular ao Governo do Azerbaijão, que organiza este ano a Cimeira do Clima.
Uma investigação da organização Global Witness descobriu uma rede suspeita de 71 contas no X (antigo Twitter) que parecem ter como missão promover mensagens oficiais do Governo do Azerbaijão sobre a Cimeira do Clima (COP29). Este país produtor de petróleo recebe na capital, Bacu, a partir de segunda-feira, as negociações climáticas das Nações Unidas que têm como objectivo precisamente reduzir a queima de combustíveis fósseis no planeta.
“O Azerbaijão está a poucos dias de acolher o evento climático mais importante do ano. É de importância vital que haja espaço online para uma verdadeira discussão sobre o que podemos esperar de um anfitrião que é um estado petrolífero. No entanto, uma pesquisa rápida nas principais hashtags da COP29 desenterrou uma rede de contas aparentemente não-autênticas que melhoram a reputação do Governo. Estão a substituir as críticas legítimas por uma positividade florida”, afirma Ava Lee, directora da campanha sobre ameaças digitais da Global Witness, citada num comunicado.
A COP29 decorre de 11 a 22 de Novembro no Azerbaijão, país que possui reservas notáveis de combustíveis fósseis. As autoridades de Bacu já anunciaram que têm planos de duplicar a produção de gás ao longo da próxima década.
A organização não-governamental acredita ter descoberto uma campanha digital de astroturfing, neste caso, um esquema orquestrado para criar uma impressão artificial de apoio popular à presidência da COP29, ocupada este ano pelo Governo do Azerbaijão. “Ao inflacionar o alcance dos conteúdos alinhados com o Governo, estas contas estão a abafar as críticas independentes aos direitos humanos condenáveis do país ou ao seu historial de greenwashing”, refere a Global Witness.
Sete das dez publicações com maior envolvimento publicados em Julho eram críticas ao papel do país que vai receber a Cimeira do Clima no conflito com a Arménia. Esses conteúdos incluíam hashtags alusivas aos direitos humanos, como a prática de genocídio, ou à libertação de reféns (#freearmenianhostages e #stopgreenwashgenocide). Em Setembro, contudo, a conversa no X em torno das hashtags oficiais #COP29 e #COP29Azerbaijão mudou de tom – coincidindo com a intervenção desta rede de contas pró-Azerbaijão, afirma um comunicado da Global Witness. Todas as dez publicações com maior número de interacções pertenciam à conta oficial da COP organizada pelo Azerbaijão.
“Esta mudança parece ser motivada por um afluxo de contas suspeitas que partilham semelhanças notáveis. Acreditamos que se trata de uma campanha de influência coordenada que está a inflacionar artificialmente o alcance das mensagens do Governo”, lê-se no comunicado. Entre as características comuns estão o aspecto das imagens de perfil, a antiguidade da conta, o padrão de actividade na rede social e, por fim, a interdependência.
Flores e árvores nas imagens
No que toca às imagens, todas as 71 contas apresentam na foto de perfil ou de fundo (banner) fotos de natureza, como flores ou árvores, e sete das contas apresentam exactamente a mesma fotografia. Relativamente à antiguidade, os dados apresentados pela investigação da Global Witness sugerem que 93% dessas contas foram criadas nos últimos seis meses – ou seja, parecem ter sido criadas para um propósito específico.
O padrão de actividade da rede de contas também é semelhante, segundo a mesma fonte. Os 71 perfis amplificam o mesmo conteúdo, limitando-se, na maior parte das vezes, a reproduzir publicações existentes, em vez de produzir conteúdo original. Também utilizam as mesmas hashtags. “Em Setembro, 70% desses retweets eram da conta oficial do COP do Azerbaijão ou de outras contas oficiais do Governo, de partidos ou de políticos do Azerbaijão”, refere a nota de imprensa.
A organização não-governamental também nota que não só há uma actividade coordenada, mas também uma interdependência entre as contas. Por outras palavras, umas estão ligadas às outras e “podem ser controladas por uma pessoa que se liga a cada conta sucessivamente”, refere a nota de imprensa da Global Witness.
Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de imprensa da Global Witness em Londres, no Reino Unido, afirma ter tentado sem sucesso obter uma reacção tanto do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Azerbaijão como dos organizadores da COP29.
Outros 111 perfis foram identificados como tendo publicado posts de apoio a funcionários ligados à COP29, mas não exibiam as tais imagens da natureza características da rede de 71 contas. Após a publicação da investigação, várias das contas foram suspensas e houve publicações que foram substituídas por mensagens da X que indicavam a violação de regras da rede social.
“Isto mostra o subinvestimento consistente da X nos esforços de moderação online. A plataforma tem a responsabilidade de facilitar o debate autêntico, em vez de depender de investigadores externos para fazer o seu trabalho de confiança e segurança”, alerta Ava Lee.
“Tomámos medidas relativamente à maioria das contas assinaladas neste relatório. As nossas equipas de segurança estão constantemente a trabalhar para impedir comportamentos inautênticos coordenados”, garantiu um porta-voz do X, citado pelo diário britânico The Guardian.