Preocupação e onda de solidariedade com a iraniana detida por protestar em roupa interior

O vídeo do protesto de Daryayee contra o hijab obrigatório e da sua detenção tem sido visualizado por centenas de milhares de pessoas nas redes sociais.

Foto
Imagem retirada de vídeo partilhado nas redes sociais
Ouça este artigo
00:00
04:27

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

Uma estudante iraniana foi detida e levada para um hospital psiquiátrico depois de se ter despido em protesto contra o hijab (lenço islâmico) obrigatório e o assédio dos seguranças da Universidade Islâmica Azad, de Teerão, na imposição desta política do regime. “Acompanharei de perto este caso, incluindo a resposta das autoridades”, avisou a relatora especial da ONU para os direitos humanos na República Islâmica, Mai Sato, enquanto a Amnistia Internacional denunciou “alegações de espancamento e violência sexual durante a detenção” de Ahoo Daryayee.

O internamento psiquiátrico, inicialmente denunciado por associações de estudante, foi confirmado, entretanto, pelo jornal Farhikhtegan, ligado à Universidade Azad. A Newsletter Amir Kabir, uma publicação de estudantes na rede social Telegram, acrescenta que a transferência para um hospital psiquiátrico aconteceu sob ordens dos serviços secretos dos poderosos Guardas da Revolução.

A jovem foi detida no sábado e há imagens do protesto e da detenção – que parecem ter sido gravadas por estudantes, que assistem a tudo por trás de uma janela no interior do edifício da universidade.

O vídeo começa com Daryayee já despida, em cuecas, soutien e meias, sentada, no exterior, respondendo a um homem que a interpela e parece dar-lhe ordens, depois de pé, caminhando para trás e para a frente e gritando para o ar. A certa altura, a estudante sai do passeio, atravessa a rua e continua a caminhar, afastando-se, e é seguida à distância, por pelo menos três homens e um mulher de chador negro (a túnica tradicional, que cobre todo o corpo e a cabeça, com excepção do resto), até que um carro pára junto dela e estes a forçam a entrar.

Pouco depois, o director de relações públicas da Azad, Amir Mahjoub, fez uma declaração a afirmar que a jovem tinha sido enviada para uma esquadra por causa de “graves perturbações psicológicas”, repetindo a narrativa que já estava a ser promovida por meios de comunicação social ligados aos Guardas da Revolução.

Media estatais divulgaram ainda um vídeo onde um homem se identifica como marido da estudante e dizia que ela, mãe de dois filhos, tem problemas de saúde mental, levando muitos activistas dos direitos das mulheres a lembrar que o regime já tentou rotular muitas iranianas que se insurgiram contra a discriminação que sofrem afirmando que têm perturbações mentais, conseguindo, várias vezes, que um familiar ou amigo da família admita isso mesmo em público.

Foi o que aconteceu com algumas das adolescentes e jovens assassinadas ou detidas pelas autoridades durante os protestos do movimento conhecido como “Mulher, Vida, Liberdade”, desencadeado pela morte de Jina Mahsa Amini, em Setembro de 2022, sob custódia da “polícia da moralidade”, que a detivera porque o seu lenço deixaria ver algumas madeixas de cabelo. Nalguns casos, como no de Sarina Esmailzadeh, de 16 anos, foi encenado um suicídio e a Amnistia diz que os familiares foram alvo de “assédio intenso para os obrigar ao silêncio”.

Repressão e dissidência

“As mulheres pagam o preço da rebeldia, mas não se curvam perante a força”, lê-se numa publicação na página da Nobel da Paz Narges Mohammadi na rede X (antigo Twitter). “A estudante que protestou na universidade transformou o seu corpo – há muito utilizado como instrumento de repressão – em símbolo de dissidência”, continua Mohammadi, presa por “propaganda contra a República Islâmica”.

“Quando eu protestei contra o hijab obrigatório, depois de as forças de segurança me deterem, a minha família foi pressionada a declarar que eu era doente mental”, contou, na mesma rede, Azam Jangravi, uma das Raparigas da (rua) Enghelab (Revolução), em referência ao protesto que teve lugar na capital do Irão, em 2017, quando Vida Movahed se pôs em cima de uma caixa de electricidade de cabelos à mostra e agitando o seu hijab branco, preso a um pau, como uma bandeira, num gesto repetido por outras iranianas.

“A minha família não o fez, mas muitas famílias sob pressão fazem-no, pensando que é a melhor forma de proteger aqueles que amam”, escreveu ainda Jangravi. “É assim que a República Islâmica tenta desacreditar as mulheres, pondo em causa a sua saúde mental”, sublinhou.

O vídeo do protesto e da detenção de Daryayee tem sido visualizado por centenas de milhares de pessoas nas redes sociais e o caso gerou uma enorme onda de solidariedade, com publicações identificadas pela hashtag #GirlofScienceResearch – ela é a aluna da Faculdade de Ciência e Investigação da Universidade Azad – (em inglês e em farsi), ao mesmo tempo que artistas têm criado e partilhado ilustrações de homenagem e apoio.

Vários grupos internacionais, incluindo o movimento feminista Femen, apelaram a que a próxima sexta-feira, dia 8 de Novembro, seja Dia de Acção pela #StudentofScienceReseach, pedindo às pessoas para partilhares fotografias e vídeos seus usando a mesma hashtag.

Sugerir correcção
Ler 36 comentários