MAI faz marcha-atrás: direito à greve nas polícias não vai ser discutido

Margarida Blasco garantiu que modelo de policiamento de proximidade pela PSP vai ser revisto.

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A ministra da Admnistração Interna, Margarida Blasco, no encerramento do I Congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia TIAGO PETINGA / LUSA
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A ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, abriu este domingo a porta à discussão sobre o direito à greve nas polícias, colocando este tema dos sindicatos entre os pontos a discutir nas negociações previstas para Janeiro. Horas depois, contudo, o ministério fez marcha-atrás e esclareceu que o direito à greve não fará parte dessas discussões.

"Vamos começar no dia 6 de Janeiro um conjunto de revisões e é um ponto que pode estar e estará, com certeza, em cima da mesa. Neste momento não vou dizer se sim ou se não, porque vai ter de ser submetido a um estudo", afirmou a governante, em declarações a jornalistas no final do primeiro congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), que decorreu este fim-de-semana na Faculdade de Direito de Lisboa.

Contudo, algumas horas mais tarde, um esclarecimento do Ministério da Administração Interna enviado às redacções referia que "a posição do Governo é clara: nesse diálogo pode ser discutida a representação laboral e os direitos sindicais. Mas não o direito à greve".

Luta dos sindicatos

O reconhecimento do direito à greve na polícia foi também abordado pelo presidente da ASPP/PSP, Paulo Santos, que manifestou a sua satisfação pela abertura demonstrada pela ministra. O dirigente sindical lembrou ainda que o acordo assinado em Julho sobre o suplemento de condição policial já previa as negociações sobre outras matérias no início do próximo ano.

"Forçámos para que ficasse plasmado um processo negocial que, a partir de Janeiro de 2025, pudesse permitir uma revisão da carreira, das tabelas remuneratórias e dos suplementos. Agora, com esta abertura da senhora ministra para se fazer uma discussão em torno do direito à greve, parece-nos importante acrescentar esse ponto como sendo imprescindível para que o sindicato possa ter a sua liberdade e a sua acção plena", referiu.

O presidente da ASPP/PSP realçou que os agentes vão continuar a lutar pelo direito à greve, salientando que isso mesmo foi reconhecido por diversos oradores especialistas em direito, como o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia ou o juiz conselheiro jubilado Bernardo Colaço. "É um direito elementar, constitucional e mais uma vez confirmado por quem de direito e conhece bem a legislação. Não temos a greve barrada pela Constituição; temos, sim, uma interpretação que, na nossa opinião, é errada e vamos aproveitar esta ideia que foi lançada para promover uma discussão e todo o tipo de diligências que permitam à classe política consagrar um direito que para nós é elementar", acrescentou.

O tema é alvo de discussão há décadas. Em 2006 António Costa, então ministro da Administração Interna de José Sócrates, disse que "nunca, jamais, e em tempo algum" tal direito seria assegurado. No ano passado o PCP entregou um projecto de lei nesse sentido no Parlamento, tendo repetido a iniciativa já este ano. O Chega incluiu o direito à greve das forças de segurança no seu programa eleitoral.

Rever policiamento de proximidade

Ainda no congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia, Margarida Blasco garantiu também que o modelo de policiamento de proximidade pela PSP vai ser revisto. A governante defendeu sua importância junto das comunidades e prometeu também um maior investimento do Governo. "A PSP tem um programa há muitos anos que tem de ser revisitado e que é a polícia de proximidade. Isso passa por ter mais quadros formados e um diálogo que tem de ser feito com as autarquias, com a Segurança Social, com as associações dos bairros. Estou crente que esse trabalho vai ser feito", afirmou, sublinhando: "É muito importante que o cidadão confie na sua polícia. O Governo confia na polícia".

A governante explicou que há 500 futuros agentes a serem formados neste momento e que essa revisão passa também por um reforço das condições dos polícias. "Vamos fazer um investimento na formação e, para isso, precisamos de abrir concursos para agentes, para chefes, para oficiais. Estamos atentos e, neste constante diálogo que temos com os sindicatos e os polícias, um dos programas que vamos reavivar é o policiamento de proximidade", reforçou.

Entre os equipamentos que serão alvo de investimento estão bodycams, tasers e novas viaturas para a Polícia de Segurança Pública (PSP), mas Margarida Blasco lembrou que estas questões têm de passar por concursos públicos até poderem chegar aos agentes no terreno. "Os concursos públicos são morosos e temos de cumprir a lei. Agora, há a nossa intenção de fazer um investimento em bodycams, tasers e no material que é necessário para a actuação da polícia. Obviamente que está inscrito e estamos à espera que os concursos terminem", vincou, esclarecendo, sobre os dois concursos públicos já impugnados relativamente às bodycams, que a decisão está nos tribunais e que o Governo aguarda por esse desfecho.

Margarida Blasco manifestou também a expectativa de que "brevemente" haja conclusões sobre o inquérito que ordenou à Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI) sobre as circunstâncias da morte do cidadão cabo-verdiano Odair Moniz, após ser baleado por um agente da PSP na Cova da Moura (Amadora). A ministra criticou ainda os desacatos na sequência desse caso e lembrou o motorista da Carris que ficou gravemente ferido dias depois, ao ser atingido num autocarro com um cocktail-molotov.

"Os tumultos que ocorreram durante a semana passada foram provocados por pessoas que só estão a praticar crimes, não podemos dizer isto com outras palavras. Há um motorista da Carris ferido, um autocarro que estava a servir a comunidade... Tenho a certeza de que a comunidade está com a sua polícia, porque sabe que a defende quando chama", disse.

Já sobre a relação da polícia com as comunidades de alguns bairros, como o Bairro do Zambujal ou a Cova da Moura, ambos no concelho da Amadora, Margarida Blasco reiterou que as pessoas dessas comunidades "conhecem a polícia" e que não se deve generalizar que estão contra os agentes.