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Brasileiros impulsionam o EuroPride 2025 Lisboa, o maior evento gay da Europa
O Pink Money circula com força em Portugal. Empresários gays brasileiros têm atuação forte e os espaços não são restritos a uma comunidade. Recebem a todos com profissionalismo e alegria.
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No verão do próximo ano, Portugal vai sediar o EuroPride 2025 Lisboa, que promete ser um grande evento de celebração da comunidade LGBTQIA+. A cada ano é realizado em uma cidade diferente e a escolha de Lisboa ocorreu em 2022.
O evento vai começar em 14 de junho e terá uma extensa programação até o dia 22 daquele mês, que é o mais festivo da cidade, com a celebração dos santos populares. O objetivo não é que seja um evento restrito a quem integra uma comunidade.
Assim como o Arraial Pride, que atrai todos os públicos que respeitam e defendem o direito à diversidade, será um momento de convívio geral: já vai longe a época que os espaços LGBTQIA+ eram guetos.
“Estou muito envolvido com o Europride. Faço parte da direção e desejamos que seja um momento inigualável, acima de tudo um evento muito agregador. Queremos juntar todas as faunas possíveis e que seja um grande sucesso”, afirma o proprietário do Side Bar, o carioca Júlio César.
O primeiro bar do empresário, que está em Portugal desde 1988, foi o Sétimo Céu, aberto em 1996. Em 2003, inaugurou o Side Bar, na Rua da Barroca, na época um reduto gay do Bairro Alto. Naquele mesmo ano, ele conheceu o marido, o paranaense Eder Martire. Para o empresário, Lisboa já consta do mapa do turismo gay mundial.
“Na minha opinião, foi a partir de 2018 que realmente Lisboa entrou no mapa gay mundial, quando Portugal sediou o Festival Eurovisão da Canção, após a vitória de Salvador Sobral, em 2017. Hoje em dia, a nossa clientela é super cosmopolita, vem de todos os cantos que se possa imaginar. Nunca vimos tantos norte-americanos no bar como estamos vendo ultimamente. A consagração mesmo vai ser o EuroPride, para Lisboa receber a coroa da comunidade e entrar de vez no mapa”, diz.
Diversidade
Portugal, ano após ano, bate recordes seguidos de movimento turístico. Só em 2023 foram mais de 26,5 milhões de visitantes, quase três vezes a população do país. Nesse cenário, Lisboa conta com variados espaços para o público gay, com muitos empresários brasileiros com empreendimentos nesse segmento. Atualmente, os espaços já não são reservados para pessoas LGBTQIA+, são hetero friendly.
“Quando recebemos alguém que não seja do nosso público, explicamos as regras para podermos manter um ambiente tranquilo, saudável e confortável para todos”, explica Stefan Matarazzo, proprietário da Posh Club. “Temos uma convivência com a vizinhança muito tranquila, tanto na Posh, como no Trumps ou no Finalmente. Conseguimos ter ambientes tranquilos no entorno de espaços gays, sejam eles aonde for”, acrescenta Matarazzo.
Vivendo em Portugal há nove anos, o DJ Stefan Matarazzo veio de Vitória, no Espírito Santo, direto para Lisboa. Dois anos após sua chegada, criou o projeto Togheter, uma festa itinerante. A primeira edição ocorreu em Portugal e, atualmente, é realizada em vários países, como Espanha, Inglaterra, Irlanda, França, México, Chile e Brasil. “Com o passar dos anos, a marca Togheter foi crescendo e percebi que já tinha feito uma clientela que confiava na qualidade dos meus eventos", observa.
Matarazzo abriu a Posh com seu marido em 2018. "Conseguimos atravessar a pandemia e manter o negócio e, este ano, inauguramos a Posh na cidade do Porto. Não vamos parar por aí. No réveillon, abriremos nossa terceira casa em um galpão próximo ao aeroporto de Lisboa. Vai se chamar Moon Club e será um espaço direcionado para o público que curte uma cena eletrônica underground, um público mais velho”, relata.
Todos bem-vindos
No Algarve, o carioca Michel Izaú, 44, e o marido holandês, Henk Blindenbach, são proprietários, desde 2022, da Vila Foia, próximo à vila de Monchique. Blindenbach sempre quis ter uma pousada e, quando decidiram deixar os Países Baixos, foram procurar um negócio que já estivesse pronto, com um grande potencial. “Meu marido aprendeu português por minha causa. Então, disse que não queria Espanha ou Itália. Gostaria que fosse em Portugal. Sempre gostamos do desafio de pegar empresas e transformá-las, sempre fizemos isso”, conta Izaú.
O hotel está aberto durante todo o ano, recebendo os mais diversos grupos, caminhantes, ciclistas, motociclistas ou praticantes de yoga. “Recebemos muitos grupos para eventos, dos mais diversos. Desde casamentos, a lutadores de jiu-jitsu. Estamos abertos para todos. Temos a bandeira gay na frente da pousada o ano todo. Acho que todo mundo deve ser bem-vindo, temos um espírito acolhedor. Não importa se é gay, hétero, preto, branco, gordo ou magro. Nós somos um casal gay, mas não definimos a pousada como gay friendly ou hetero friendly” afirma Izaú.
A preocupação com o meio ambiente é uma constante no empreendimento, desde o início. Instalaram painéis solares, reduziram o uso de plástico, utilizando garrafas de vidro. Os sacos de roupa suja são feitos de panos de algodão e fazem o reúso da água. “Fizemos muita coisa nesse sentido, respeitando o ambiente onde estamos. Uma característica do nosso empreendimento é que parte dos nossos funcionários também está dentro do espectro queer. Nós já tivemos bissexuais e gays, ainda não tivemos trans, apesar de quase contratarmos uma, mas também damos sempre abertura a todos de serem o que são dentro do lugar de trabalho”, explica.
A concepção de um espaço para todos tem sido uma receita de sucesso na Vila Foia, que, para 2025, já contam com mais de 1.400 noites vendidas. Por estarem localizados em uma montanha, não dependem apenas do turismo de praia — na alta estação, costumam receber hóspedes que preferem um lugar mais sossegado do que a região das praias do Algarve. “Mesmo no inverno, sempre temos hóspedes”, conta o empresário.
No caso de grupos, é necessário reservar antecipadamente, para garantir as acomodações necessárias. Para o próximo ano, já são vários os períodos reservados, inclusive para um grupo de ursos (designação de uma comunidade gay geralmente formada por homens com barba).
Impacto social
Uma das preocupações de Izaú é com o desenvolvimento turístico da região onde estão inseridos. “Sou presidente da Associação de Turismo de Monchique. Buscamos nos associar aos estabelecimentos e serviços turísticos para desenvolver a comunidade local. Trabalhamos muito com uma pessoa que prepara piqueniques para nossos clientes, temos professoras de yoga que moram na região, sempre tentamos nos associar com a comunidade local”, afirma.
Os empresários promoveram, com a Associação Variações, o primeiro evento Gay Monchique, no topo de uma montanha. Foi um festival com música, aberto para todos, gays ou héteros. "Foi o primeiro evento. Um casal gay português da região nos agradeceu no final da festa por termos realizado o evento. Ainda existe tabu em comunidades menores", diz Izaú. Ele ressalta que a meta é provocar impacto social.
Izaú reforça a importância do espaço para todos. "Organizamos um retiro de uma semana de jiu-jitsu para o qual trouxemos o mestre Royce Grace, campeão mundial. Uma das coisas que fizemos foi levar o Royce para a escola municipal, para uma aula de demonstração aberta a todas as crianças. Não foi só para ensinar autodefesa, mas para estimular a autoestima. Eu e meu marido tentamos encontrar formas de ajudar a comunidade de Monchique” finaliza.