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Custo Portugal dificulta a entrada de produtos brasileiros no país
Empresas queixam-se de excesso de burocracia, barreiras tarifárias e não tarifárias e altos custos portuários e pedem ajuda ao Governo.
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Nos últimos anos, empreendedores brasileiros têm buscado expandir suas operações em Portugal, aproveitando as oportunidades culturais e econômicas que o país oferece. No entanto, muitos deles se deparam com um conjunto de práticas, custos e barreiras que tornam a atividade empresarial desafiadora, especialmente, quando se trata de importar produtos e insumos do Brasil. Esse fenômeno, apelidado de Custo Portugal pelos especialistas em comércio exterior, reflete os desafios significativos enfrentados por empresários brasileiros que desejam se estabelecer no país europeu.
Essas dificuldades não estão apenas relacionadas a tarifas alfandegárias elevadas, mas, também, a uma série de barreiras não tarifárias, custos portuários e a complexa burocracia. Essa realidade tem levado muitos empresários a se unirem para formalizar queixas ao governo brasileiro, na esperança de obter uma intervenção diplomática para aliviar as barreiras e facilitar o comércio entre os dois países.
Para começar, todo produto importado deve ser classificado corretamente, o que requer a obtenção do HS-Code (Harmonized System Code) ou NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul). Esse código é utilizado para verificar informações cruciais como taxas de importação, restrições, documentação necessária e se o produto precisa de algum registro prévio em Portugal ou na União Europeia.
Após essa classificação, o importador se depara com as taxas alfandegárias, que são calculadas com base no valor do produto somado ao custo do frete e do seguro internacional. Em Portugal, os dois principais impostos cobrados são o IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado), de até 23%, e os Direitos Aduaneiros, cujas alíquotas variam de acordo com o tipo de produtos. Para os pequenos e médios empresários, essas taxas podem representar uma barreira significativa, principalmente quando há concorrência de produtos similares já estabelecidos no mercado europeu.
Exigências técnicas
Outro fator que complica o processo de importação é a necessidade de atender a diversas exigências técnicas e regulatórias. Dependendo do tipo de produto, como cosméticos ou alimentos, o importador precisa obter documentos específicos, como Certificado de Origem, Ficha Técnica e Certificado Fitossanitário. Além disso, produtos como cosméticos necessitam de um registro prévio junto ao Infarmed, órgão responsável por atestar se o item cumpre todas as normas da União Europeia antes de sua comercialização em Portugal.
Essa burocracia exige tempo, dinheiro e planejamento, e, para muitos empresários que estão iniciando no comércio exterior, a falta de conhecimento sobre essas obrigações pode resultar em atrasos, multas ou até mesmo na perda da mercadoria. A União Europeia não aceita a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) como o órgão sanitário fiscalizador dos produtos importados do Brasil, e isso torna o processo mais burocrático, longo e oneroso. Procurados, o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) e a Anvisa não retornaram.
“Para muitos empresários, o processo de importação é prolongado e custoso, sendo necessário uma série de documentações e trâmites burocráticos. A liberação alfandegária, conforme relatado por várias empresas, pode ser extremamente demorada, comprometendo o fluxo normal de negócios”, explica Rogério Tadeu, especialista em comércio exterior da consultoria Outbox.
Marcelo Cherto, sócio da empresa Oakberry, destaca que a adaptação dos rótulos às exigências locais, como a substituição do termo "orgânico" por "biológico", atrasou consideravelmente a entrada dos produtos no mercado português. Todos os rótulos tiveram quer ser trocados à mão, no meio do caos do Porto de Lisboa. Isso demonstra como os detalhes burocráticos, somados às tarifas e impostos, dificultam a competitividade de produtos brasileiros em Portugal.
Além das tarifas diretas, os empresários brasileiros enfrentam exigências técnicas e legais específicas, que afetam, principalmente, a importação de produtos alimentícios. Para alimentos, especialmente os que possuem origem animal, como lácteos, a União Europeia impõe regulamentações rigorosas. Esses produtos precisam passar por testes laboratoriais e controles de segurança alimentar rigorosos antes de serem liberados para venda, o que aumenta custos e tempo de entrada no mercado.
Drible no porto
Raquel Lopes, empresária do ramo de cachaça, relata que sua primeira carga para Portugal enfrentou inúmeros atrasos, devido à falta de infraestrutura portuária no país. Para ela, é mais barato desembarcar os produtos na Holanda e transportá-los via rodoviária para Portugal, evitando, assim, os elevados custos e a lentidão do processo alfandegário lusitano. Esse cenário exemplifica as dificuldades enfrentadas por muitos empresários, que buscam rotas alternativas para reduzir os custos e acelerar a entrada de seus produtos no mercado.
Outro obstáculo enfrentado pelos empresários está relacionado à adaptação obrigatória das embalagens para o mercado europeu. No caso de bebidas alcoólicas, como a cachaça, há uma exigência de que as garrafas sigam o padrão de 700 ml, em vez dos tradicionais 750 ml utilizados no Brasil. Essa mudança implica em custos adicionais, que afetam, principalmente, os pequenos produtores, tornando inviável a entrada de seus produtos no mercado europeu.
Os custos portuários em Portugal também são motivo de reclamação. As tarifas elevadas para armazenagem de contêineres e a burocracia para o desembaraço aduaneiro são frequentemente citadas como fatores que inviabilizam operações de importação. Ricardo Leitão, proprietário da rede Mercearia da Terra, afirma que a diária de um contêiner parado na alfândega em Portugal custa cerca de 400 euros (R$ 2,4 mil). Esse valor, quando somado a outras taxas portuárias, pode tornar inviável a operação de pequenas empresas que trabalham com margens de lucro apertadas.
Para contornar esses obstáculos, muitos empresários têm optado por utilizar portos em outros países da Europa, como a Espanha e a Holanda, onde o processo alfandegário é mais ágil e menos custoso. Uma vez desembarcados nesses portos, os produtos são transportados por rodovia até Portugal, reduzindo assim os custos e o tempo de espera. Embora essa estratégia exija um planejamento logístico mais complexo, ela tem se mostrado uma solução eficaz para driblar as dificuldades impostas pelos portos portugueses.
Oportunidades, mas nem tanto
Exportar produtos do Brasil para Portugal pode parecer uma oportunidade promissora, mas, na prática, pequenos e médios empresários brasileiros enfrentam uma série de desafios. “O processo envolve uma série de detalhes que, se não forem bem planejados e executados, podem inviabilizar a operação, sobretudo, para os empreendedores que não possuem uma grande infraestrutura financeira e logística”, explica Tadeu.
Escolher o meio de transporte adequado para as mercadorias é outro desafio. O transporte marítimo é geralmente a opção mais barata, porém, demora mais tempo para que os produtos cheguem ao destino. Já o transporte aéreo, apesar de mais rápido, tem um custo significativamente maior. Esse dilema afeta diretamente a viabilidade de importação, principalmente para quem lida com produtos perecíveis ou que precisam chegar rapidamente ao mercado.
Além disso, os pequenos importadores muitas vezes não têm a mesma capacidade de negociação que as grandes empresas, o que pode elevar ainda mais os custos logísticos. A contratação de um seguro internacional é outro ponto essencial, pois protege a carga durante o transporte, mas representa um custo extra para o importador, alerta Tadeu.
Diante dos desafios enfrentados, um grupo de empresários está organizando um documento a ser entregue à Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (APEX) relatando as dificuldades e pedindo ajuda do governo brasileiro para abrir negociações com Portugal a fim de modificar esse cenário. A intenção é discutir maneiras de simplificar o processo alfandegário, reduzir as barreiras tarifárias e não tarifárias e melhorar a infraestrutura portuária, de modo a tornar o ambiente de negócios mais favorável.
CEO da M21 e criador, entre outros projetos, do Chocolat Festival, Marco Lessa é um dos empresários envolvidos nesse movimento. "Portugal pode ser a porta de entrada para mercadorias do Brasil na Europa, mas, para isso, precisamos trabalhar juntos, tanto o setor privado quanto as autoridades dos dois países", afirma. Ele adianta que a ideia é levar uma carta à ApexBrasil, cujo texto ainda está sendo elaborado, devendo tratar de pontos que os empreendedores brasileiros em Portugal consideram urgentes.
Raquel Lopes, do ramo da cachaça, acredita que a resolução dessas questões é essencial para que Portugal se torne, realmente uma porta de entrada para os produtos brasileiros na Europa. "Não faz sentido que seja mais barato levar uma carga do Brasil via Holanda do que diretamente para Portugal. Isso é algo que os governos precisam resolver se querem que Portugal seja a porta de entrada para os produtos brasileiros na Europa", declara.