Especialistas elogiam passos recentes da AIMA, alguns com reservas, após ano difícil

Agência para a Integração, Migrações e Asilo foi criada há um ano, a 29 de Outubro, quando o SEF foi extinto. Novo Governo anunciou Plano de Acção para as Migrações em Junho deste ano.

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Filas à porta da Agência para a Integração, Migrações e Asilo ao longo do último ano Nuno Ferreira Santos
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As mais recentes alterações na Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) corrigiram alguns dos problemas de nascença da estrutura, que comemora um ano na terça-feira, consideram especialistas da área.

Em declarações à Lusa, Gonçalo Matias, da Universidade Católica, diz-se defensor, há muitos anos, da criação de uma estrutura como a AIMA, porque "Portugal precisa desesperadamente de imigrantes e os saldos demográficos portugueses só se conseguem aguentar positivos graças à imigração".

"Uma política de migração activa para captar imigrantes só se faz através de uma agência para as migrações" e não através da "acção policial", diz quando se assinala o primeiro aniversário da extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, na terça-feira, 29 de Outubro.

A AIMA "arrancou de uma forma muito deficiente, porque por um lado não tinha as competências e os meios para fazer essa promoção de Portugal enquanto destino de migrações e falhou nesse objectivo", mas, "por outro lado, herdou 400 mil processos pendentes, o que é uma herança pesadíssima e muito injusta para uma estrutura que começa a sua actividade", acrescenta Gonçalo Matias.

Aplicação do plano das migrações

Só com o Plano de Acção das Migrações, em Junho, que definiu a passagem desses processos pendentes para uma estrutura de missão, liderada pelo até então presidente da AIMA, e o fim das manifestações interesse – um recurso jurídico que permitia a regularização de quem estivesse em Portugal com visto de turista –, é que "começaram a ser resolvidos os problemas", considerou.

Para Gonçalo Matias, "as manifestações de interesse foram um mecanismo de emergência lançado para responder às necessidades das empresas que precisavam muitíssimo de imigrantes".

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Primeiro centro da estrutura de missão da AIMA no Templo Hindu, em Telheiras para o processamento dos pedidos de autorização de residência Rui Gaudêncio

No entanto, essas soluções "tornaram-se, de alguma forma, permanentes e não garantiam que o país tinha controlo sobre as pessoas que estavam a entrar e isso permitiu também que surgissem e prosperassem redes de tráfico humano à volta desse negócio”, o que, no seu entender, criou “uma situação insustentável”.

"Foi muito importante controlar, reganhar controlo sobre as fronteiras através do fim das manifestações de interesse", afirmou Gonçalo Matias.

Algumas medidas "precipitadas"

Já o investigador e geógrafo humano Jorge Malheiros considera que foi "precipitado o fim das manifestações de interesse" bem como a opção de criar uma Unidade de Estrangeiros e Fronteiras dentro da PSP, confirmando que "cada vez mais há uma ideia de securitização e há uma visão dos imigrantes como criminosos".

Apesar disso, também elogia os passos mais recentes da AIMA, diz que "o espírito [da estrutura] está completamente deturpado naquilo que foi a sua origem" e destaca a "maior ligação ao tecido associativo", como é exemplo o centro de atendimento na comunidade hindu de Lisboa ou o regresso dos programas de apoio.

Desde o Verão, "há os primeiros sinais positivos", que incluem também uma "estratégia de resposta aos pedidos que estão em atraso", com a criação da estrutura de missão e tudo indica que "está montado um esquema de procedimento que permite, em princípio, acelerar o processo de respostas aos atrasados", afirmou o docente do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa.

Por outro lado, "há um discurso também positivo de garantir" que o Estado integra a análise dos dados sobre imigrantes, ao incorporar o Observatório das Migrações e a produção de balanços sobre entradas e processos de integração.

Pessoas que estavam a trabalhar "num limbo"

Contudo, Jorge Malheiros lamenta que o discurso sobre imigrantes esteja focado "na atracção de talento e pouco na questão das relações interculturais" que são "mais importantes do que nunca para mitigar ou prevenir situações de confronto na sociedade e o crescimento de uma onda mais xenófoba, com vários actos de violência para com os imigrantes”.

O Plano de Acção para as Migrações "dá alguns sinais de como algumas coisas vão ser”, diz. “Desde logo, aquilo que é mais óbvio que todos conhecemos, que é a suspensão das manifestações de interesse e a impossibilidade de regularização dentro do país, deixando num limbo de pessoas que já estavam a trabalhar no país e que contavam com este mecanismo para eventualmente se regularizar", afirmou ainda Jorge Malheiros.

A directora da Obra Católica Portuguesa de Migrações, por sua vez, admite que a AIMA recebeu uma "herança pesada" de 400 mil processos pendentes e espera que o próximo ano seja mais positivo.

"Espero que esta ideia de ser a AIMA a ir ao encontro das pessoas de facto resulte", afirmou à Lusa Eugénia Quaresma, referindo-se à estratégia recente da organização de fazer agendamentos com os imigrantes para resolver os processos. A AIMA recebeu 400 mil processos pendentes do antigo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e deparou-se com várias dificuldades operacionais, criticadas por imigrantes, associações e especialistas.

"A fase de transição não é fácil e tiveram muito pouco tempo para responder à pressão administrativa de regularização de muitos migrantes de norte a sul do país", reconheceu Eugénia Quaresma, recordando que, de início a "grande dificuldade era a comunicação", sem resposta adequada aos "canais normais" por parte dos requerentes.

Agora, "eu espero que no próximo ano as coisas estejam a funcionar normalmente, sem termos de esperar tanto para que eles, de facto, consigam cumprir prazos".