Há 23 mil alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina desde o início do ano lectivo

Ministro adianta que 567 professores que tinham deixado a profissão decidiram voltar, neste ano lectivo, a dar aulas. Além disso, há ainda mais “3438 novos professores no sistema educativo”.

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O ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, durante o debate sobre política sectorial na Assembleia da República TIAGO PETINGA/ LUSA
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Um mês e meio após o início das aulas, ainda há mais de 23 mil alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina desde que o ano lectivo se iniciou. O ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, adiantou nesta sexta-feira, na Assembleia da República, que há 23.357 estudantes com pelo menos um professor em falta. De acordo com os números avançados pelo governante, desde que o ano escolar se iniciou, houve 54 mil alunos que estiveram “sem aulas a uma disciplina, num determinado momento”. Fernando Alexandre deu ainda nota de que o número de docentes candidatos às escolas onde há falta de professores foi mais do dobro das vagas abertas no concurso extraordinário.

“Há 54.060 alunos que, desde o início do ano lectivo, estiveram sem aulas a uma disciplina num determinado momento. E, destes, há 23.357 que estão sem aulas a uma disciplina desde o início do ano”, referiu Fernando Alexandre, durante o debate sobre política sectorial do ministério que decorre na manhã desta sexta-feira no Parlamento. O PÚBLICO questionou o ministério sobre quantos alunos estavam sem aulas há um ano, para estabelecer uma comparação, mas não obteve resposta. Segundo os cálculos do PÚBLICO de há cerca de um ano, após sete reservas de recrutamento (actualmente já decorreram oito), o número de alunos sem professores a pelo menos uma disciplina situava-se acima dos 40 mil.

Nesta sexta-feira, Fernando Alexandre defendeu ainda que as medidas para captar docentes para o sistema educativo público se têm mostrado eficazes e deu um exemplo: quando o ano lectivo arrancou, havia “4065 horários por preencher”, um número que se situa agora em 720, sendo que destes há 357 horários que estão por preencher desde o início das aulas. Até ao dia 16 de Setembro, último dia do período para o arranque do ano lectivo, as escolas tinham pedido 11.583 horários.

De acordo com o responsável pela pasta da Educação, 567 professores que tinham deixado a profissão decidiram voltar, neste ano lectivo, a dar aulas. Além disso, há ainda mais “3438 novos professores no sistema educativo”.

Mais de 2200 pediram apoio à deslocação

Fernando Alexandre disse ainda que há a registar mais 1016 horas extraordinárias realizadas pelos professores face ao mesmo período de 2023. “Há mais 7431 alunos com aulas graças a essas horas”, sublinhou, notando, contudo, que há “ainda um longo caminho a percorrer”. Já em relação ao número de docentes aposentados que mostraram disponibilidade para voltar a leccionar, o número mantém-se nos 79 professores, à semelhança do que acontecia há uma semana.

Já o número de candidatos às escolas das regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve, onde a falta de professores é mais acentuada, foi mais do dobro do número de vagas que a tutela abriu. Segundo o ministro, concorreu a essas vagas (num concurso extraordinário para preencher quase 2500) um total de 5675 docentes.

Simultaneamente, já pediram apoio à deslocação 2234 docentes, dos quais cerca de metade está deslocada a mais de 300 quilómetros de casa, o que quer dizer que vão receber o valor mais elevado do apoio, 450 euros mensais. Este apoio será pago durante 11 meses e abrange todos os professores colocados naquelas escolas, independentemente do seu vínculo e do seu grupo de recrutamento”, informou o ministério num comunicado enviado às redacções durante a tarde desta sexta-feira.

Este concurso extraordinário prevê a atribuição de um apoio à deslocação a todos os docentes que fiquem colocados a mais de 70 quilómetros de casa. Na mesma nota à imprensa, o Governo refere que o número de horários por preencher deverá reduzir-se ainda mais com o resultado do concurso externo extraordinário”.

Todas as disciplinas serão revistas, não só a de Cidadania

Quanto à revisão do currículo de Cidadania e Desenvolvimento, Fernando Alexandre voltou a referir, como já tinha, aliás, feito no início desta semana, que, além dessa, todas as disciplinas serão actualizadas. “Essa revisão partirá de uma avaliação externa, após concurso público internacional e da análise da própria Direcção-Geral de Ensino Superior ao actual currículo. O processo correrá ao longo deste ano lectivo e esperamos que possa ter efeitos já no próximo”, disse.

Não acreditamos na rotina das últimas décadas, em que o novo Governo trazia sistematicamente um novo currículo. Não é o que pretendemos fazer. As escolas precisam de estabilidade e de foco na aprendizagem, não precisam de disrupção. Mas acreditamos que há espaço no currículo para melhorias porque o currículo tem, por definição, de ser revisto periodicamente, melhorado e actualizado.
É precisamente essa revisão e actualização que faremos em todas as disciplinas”, desenvolveu Fernando Alexandre.

Tendo em conta que Cidadania é uma disciplina à volta da qual, nos últimos anos, surgiram discussões em torno dos conteúdos curriculares, referenciais e os guiões produzidos por organismos da sociedade civil e partilhados no site do ministério”, o governante comprometeu-se com a revisão e assegurou: ​“Vamos olhar para esse debate, vamos esperar pelas avaliações, vamos ouvir a sociedade civil.

E vamos, sobretudo, manter em vista o que importa: a escola deve ser um espaço de promoção de valores constitucionais em que acreditamos, de promoção de uma sociedade livre, plural e cosmopolita”, terminou.

Ao longo do debate, Fernando Alexandre insistiu precisamente em que a actualização do currículo de Cidadania está dependente da avaliação que será feita, um tema que marcou a discussão no Parlamento. “Já disse isto mais do que uma vez: seria uma surpresa mesmo que a disciplina passasse a opção, quanto mais retirar a disciplina do currículo. Pode acontecer se a avaliação for uma surpresa, mas não é isso que esperamos que aconteça”, garantiu.

O tema voltou a entrar na agenda depois de, no domingo, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, ter dito que a sua revisão é uma das medidas prioritárias para o país, notando que é preciso “reforçar o cultivo dos valores constitucionais e libertar a disciplina das amarras a projectos ideológicos e de facção”, como disse.

No debate desta sexta-feira, esta possível “libertação” foi saudada pela bancada do Chega e do CDS-PP. Do lado oposto, houve críticas por parte do PS, Bloco de Esquerda, Iniciativa Liberal, Livre e PAN.

Da bancada do PS, o deputado Miguel Costa Matos acusou Fernando Alexandre de ser “um ministro do passado” e defendeu que a tutela está a construir nas escolas “um passado bafiento”. Já Patrícia Gilvaz, da IL, criticou que Luís Montenegro tenha decidido “anunciar ao país que o grande problema da educação em Portugal é a disciplina da Cidadania” em vez de se focar nos problemas que existem no sector da Educação. Do Bloco de Esquerda, Joana Mortágua quis saber “quais são as amarras ideológicas” a que o primeiro-ministro se referiu.

Já a deputada do Chega Manuela Tender defendeu a necessidade de a disciplina passar a ser opcional e que dela sejam retiradas as referências ao que chamou “ideologia de género”. Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS-PP, saudou a posição do primeiro-ministro e defendeu que esta disciplina deve servir “para ensinar e não doutrinar as crianças”.

O ministro da Educação referiu ainda que o Governo vai aumentar o valor atribuído às creches e que pretende celebrar contratos de associação com instituições privadas para dar resposta às famílias das zonas do país onde há falta de vagas, sendo que haverá actualmente cerca de 20 mil crianças sem vaga. “Tivemos mais 170 salas criadas através da rede pública e municípios, mas não vamos conseguir responder apenas com o público”, disse, para acrescentar que a tutela “não tem preconceitos ideológicos em relação ao sector privado”.

O governante admitiu também que a verba atribuída actualmente está “muito abaixo do valor real de cada sala” e que, por isso, o valor da comparticipação terá uma revisão em breve.

Notícia actualizada às 16h10 do dia 25 de Outubro de 2024 com informação constante do comunicado de imprensa do Ministério da Educação, Ciência e Inovação.

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