Espanha: acusações de assédio afastam da política Íñigo Errejón, fundador do Podemos

Errejón, um dos rostos mais conhecidos da esquerda espanhola, despediu-se da vida política esta quinta-feira, envolvido num escândalo de assédio e machismo.

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Íñigo Errejón no Congresso espanhol, em Janeiro passado Ana Beltran / REUTERS
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Íñigo Errejón, um dos fundadores do Podemos e, mais tarde, do Más Madrid, demitiu-se esta quinta-feira do cargo de porta-voz da plataforma de esquerdas Sumar e anunciou a sua saída da política. O ex-deputado é alvo de várias acusações de assédio sexual, que o obrigaram a afastar-se do grupo parlamentar, que tem no feminismo uma das suas principais bandeiras.

Num comunicado divulgado esta quinta-feira, 24 de Outubro, nas redes sociais, o político madrileno de 40 anos afirmou que, “depois de um ciclo político intenso e acelerado”, atingiu “o limite da contradição entre a personagem e a pessoa”. “Entre um modo de vida neoliberal e ser o porta-voz de um partido que defende um mundo novo, mais justo, mais humano.”

As declarações surgem após ter sido divulgada, na passada segunda-feira, uma denúncia anónima pela jornalista espanhola Cristina Fallarás. Essa acusação referia-se a um “político muito conhecido”, residente em Madrid, descrevendo-o como um “abusador psicológico”, "um verdadeiro monstro", responsável por comportamentos de assédio e sexistas.

São já conhecidos três casos de assédio envolvendo Errejón: a denúncia tornada pública por Cristina Fallarás; outra denúncia anónima feita nas redes sociais há um ano e que acabou por ser apagada pela autora (alegadamente após ser pressionada por uma deputada do Más Madrid); e um terceiro caso já entregue às autoridades espanholas.

Esta sexta-feira, a actriz e apresentadora Elisa Mouliaá avançou com uma acusação formal contra Ínigo Errejon. Relata ter sido tocada, apalpada e beijada sem o seu consentimento, depois de se encontrar com Errejón numa festa, em Setembro de 2021.

Apesar do tom de admissão de culpa, sem nunca negar as acusações de que é alvo, Errejón nunca faz referência às vítimas no seu comunicado.

“Na linha da frente política e mediática, resiste-se e é-se mais eficaz — pelo menos foi o meu caso — com uma postura muitas vezes emancipada do cuidado, da empatia e das necessidades dos outros”, escreveu o agora ex-porta-voz da coligação Sumar, que inclui o Más Madrid. “Isto gera uma subjectividade tóxica que, no caso dos homens, é multiplicada pelo patriarcado.”

“Estou num processo pessoal e de acompanhamento psicológico, mas o que é certo é que, para avançar e cuidar de mim, preciso de deixar a política institucional, as suas exigências e os seus ritmos”, escreveu Errejón, despedindo-se da vida política e apontando também culpas aos “ritmos e exigências” da profissão.

Yolanda Díaz, líder do Sumar e vice-presidente do Governo espanhol, reiterou ao final da tarde desta quinta-feira que “o Sumar começou um processo de recolha de informação quanto aos testemunhos que têm surgido sobre Iñigo Errejón”. “Como resultado desse processo, hoje deixa todos os seus cargos”, confirmou, na rede social X.

Desde segunda-feira que o Más Madrid diz estar a trabalhar para esclarecer as denúncias que vieram a público, pressionado pelos restantes grupos parlamentares que exigem saber se o comportamento de Errejón era já conhecido dentro do partido.

Entretanto, a deputada do Más Madrid Loreto Arenillas, antiga chefe de gabinete de Errejón, foi acusada de ter pressionado uma das alegadas vítimas do co-fundador do Podemos para que não o denunciasse. Como indica o site do partido, Arenillas, de 31 anos, é “especialista em violências machistas” e está há vários anos envolvida na luta pela igualdade de género.

Na imprensa espanhola, vários jornais avançam que os membros do Más Madrid saberiam há já um ano das acusações dirigidas a um dos seus fundadores, depois de correr a informação de que Loreto Arenillas estaria a tentar impedir que uma denúncia de assédio sexual contra Íñigo Errejón, referente a Junho de 2023, se tornasse pública.

Contactada pelo El País, Arenillas não respondeu a um pedido de esclarecimentos sobre o caso. Do gabinete de comunicação do partido, o mesmo silêncio.

“Se existem indícios de actos criminosos, como parece acontecer, têm de ser feitas denúncias imediatamente” e o caso tem de avançar para a justiça, defendeu Juan Lobato, secretário-geral do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) em Madrid.

A presidente da Comunidade de Madrid, Isabel Díaz Ayuso, do Partido Popular, também reagiu e apelou a que os partidos políticos não encubram este tipo de casos: “Espero que isto não volte a acontecer, que sempre que aconteça algo deste género seja imediatamente denunciado. Quantas mais mulheres se calarão ou quantas mais vezes isto acontecerá sem que ninguém tome medidas.”

Do Más Madrid, a ministra da Saúde, Mónica García, cancelou parte da agenda desta sexta-feira para se reunir com a direcção da coligação Sumar e admitiu que não “soube fazer o suficiente” para perceber os comportamentos de Errejón.

“Não tenho palavras para expressar o meu profundo pesar, a minha preocupação e apoio a todas as vítimas. Estamos cansadas, todos os casos devem ser revelados”, disse, citada pelo El Mundo, em referência ao caso que considerou “perturbador”. “O nosso compromisso é contra o machismo, venha ele de onde vier.”

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