PSD e CDS mudam voto e chumbam visto humanitário de asilo proposto pelos liberais

PSD recorreu aos argumentos do Chega, de que a medida seria um chamariz para a entrada de estrangeiros em Portugal. IL defendeu que permitia aos cidadãos viajarem em segurança.

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Liberal Mariana Leitão critica recuo de PSD e CDS Rui Gaudêncio
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O PSD e o CDS chumbaram na quarta-feira, na votação na especialidade, a criação de um visto humanitário que poderia ser pedido nos consulados portugueses no estrangeiro para que cidadãos fugidos de conflitos não tivessem que o requerer à chegada, na fronteira – com todas as dificuldades e demoras que isso implica –, como acontece actualmente. Este visto serviria para a entrada e permanência temporária apenas em Portugal, antes de o cidadão instruir o seu futuro processo de autorização de residência.

Os dois partidos do Governo tinham-se abstido na votação na generalidade, há duas semanas, permitindo a aprovação do diploma, mas agora recuaram e votaram contra, levando à rejeição do projecto. O Chega, tal como no plenário, também votou contra.

O CDS colocou como condição “imprescindível” a existência de uma referência à base de fundamentação para a concessão de visto, fosse uma lista de cidadãos perseguidos a nível internacional, ou informação sobre conflitos étnico-militares de entidades como o ACNUR [Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados] ou a ONU [Organização das Nações Unidas].

Já o PSD baseou-se no parecer da AIMA [Agência para a Integração, Migrações e Asilo] para argumentar que o visto de asilo por razões humanitárias já existe e que os postos consulares não dispõem de competência para a concessão de asilo com excepção dos casos relativos aos cidadãos afegãos.

Na verdade, na proposta da IL não seria o posto consular a decidir, mas o Ministério dos Negócios Estrangeiros em Lisboa. Recorrendo a argumentos próximos do Chega, o deputado social-democrata Nuno Gonçalves alegou que a possibilidade de aceder a este visto nos consulados “iria agravar o efeito de chamada global e massiva”, afirmando que Portugal seria o único país da União Europeia a prever o visto de asilo nos países de origem.

A liberal Mariana Leitão ainda argumentou que num cenário de guerra ou calamidade, com fronteiras fechadas, os cidadãos não conseguem sair e viajar para Portugal. Daí o alargamento aos postos consulares do pedido de visto de asilo, que actualmente só se pode fazer à chegada a uma fronteira nacional.

Na discussão na especialidade, só o Livre e o PCP apresentaram propostas de alteração, mas como os partidos não se entenderam e o PSD avisara que ia votar contra, o diploma acabou por ser votado em conjunto, e chumbado.

O Livre propunha algumas alterações cirúrgicas para acertar a linguagem e as normas com a actual lei do asilo, a recolha de informação junto de entidade de direitos humanos, assim como a previsão de um prazo de validade territorial (só para território nacional) e temporal (de um ano), ou ainda o número de entradas. O PCP começara por propor que se retirasse a questão da justificação de situações de conflito, mas acabou por concordar.

Ao PÚBLICO, a liberal Mariana Leitão lamenta este chumbo e, sobretudo, o passo atrás de PSD e CDS em relação a um texto igual ao que já tinham ajudado a aprovar. “Não deixa de ser curioso que sejam partidos que criticam o Governo italiano por não permitir que cidadãos estrangeiros tenham estatuto de asilo a agora mudarem o sentido de voto numa questão que permitia esse estatuto”, aponta a deputada da IL.

Mariana Leitão rejeita a ideia de que a regra seria um chamariz e que haveria concessão automática, como afirmou o PSD. “Haveria sempre um pedido que dependia da aprovação do processo. Obter o visto num consulado permitia que a pessoa viajasse em segurança do país de origem para Portugal e depois tratasse do resto do processo aqui.”

A liberal rejeita a ideia de que a medida “pusesse em causa qualquer política de imigração”, até porque esta questão “tem a ver com políticas de asilo e depende do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Misturar as duas coisas é criar uma falsa questão.”

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