Governo reforçou vigilância presencial e cibernética para “parar violência” na Área Metropolitana de Lisboa

Após reunião com autarcas da Área Metropolitana de Lisboa, devido aos desacatos nas últimas noites, ministro da Presidência afirmou que houve “uma atenção especial à segurança dos autocarros”.

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Tem havido tumultos em diversas zonas da Área Metropolitana de Lisboa MIGUEL A.LOPES / EPA
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Foi uma manhã de partilha entre o Governo e os autarcas da Área Metropolitana de Lisboa (AML) das preocupações relativas aos desacatos das últimas noites em diferentes municípios. No final da reunião, que começou por volta das 11h e terminou perto das 14h, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, referiu que o Governo pôs em prontidão “todos os meios de que o Estado português dispõe para garantir a segurança” na AML. O ministro afirmou que foram postos à “disposição e utilização” meios de vigilância “presencial, cibernética e nas redes” sociais para se detectarem e prevenirem os “comportamentos errados”.

Foi disponibilizado um “accionamento de todos os meios de vigilância dos comportamentos incorrectos”, disse António Leitão Amaro (PSD), ao lado da ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, que esteve também na reunião que juntou os 18 presidentes de câmara da AML, mas que não prestou declarações aos jornalistas. O ministro indicou que o reforço das forças e serviços de segurança, designadamente da PSP e da GNR, foi feito de forma “gradual”, mas “com prontidão” para a sua utilização. Quanto ao recurso a esse reforço, afirmou que será feito de “forma proporcional, mas firme, para parar os comportamentos de violência e destruição de bens públicos”.

O membro do Governo acrescentou que foi dada “uma atenção especial à segurança dos autocarros”, mas não especificou quais os municípios ou principais percursos com esse reforço de segurança, nem que de forma foi feito. “Não olhem para os autocarros como um alvo onde podem atacar sem consequências”, disse, assinalando que se vai continuar a avaliar o reforço na segurança deste meio de transporte nas próximas horas.

António Leitão Amaro salientou que o reforço no policiamento de meios humanos e equipamentos já foi feito nos últimos dias. “Nos bairros onde estavam a existir situações de maior vulnerabilidade, houve um aumento significativo das forças.” Realçou ainda que a vigilância não tem sido feita apenas na rua, mas também tem sido “aérea, nas redes sociais e nos contactos que são feitos por todas as entidades do aparelho do Estado”. O ministro considera que a reunião desta manhã teve como um dos grandes objectivos a “reposição da tranquilidade e paz social”. “Reconhecemos e estamos atentos – Governo central e poder local – às legítimas preocupações, dor e revolta que muitos sentem”, afirmou, salientando que essa “expressão” deve ser feita “dentro das regras”.

Questionado sobre o racismo e discriminação que pode ser sentido nos bairros onde tiveram lugar muitos dos desacatos, o ministro negou que seja um tema tabu e que, na próxima semana, haverá encontros entre o Governo e representantes de associações de comunidades de diferentes bairros. “As manifestações, sempre que pacíficas e respeitadoras da liberdade e da segurança dos outros, devem ser ouvidas com atenção”, afirmou, salientando que há “líderes de comunidades e associações que têm estado a trabalhar nos seus bairros e nas suas comunidades para apelarem à demonstração pacífica”.

Além da discussão motivada pelos desacatos desta semana, António Leitão Amaro referiu que foram debatidas durante a reunião “medidas e dimensões mais estruturais” para o futuro, como a necessidade do reforço da segurança de proximidade, o aumento da habitação disponível na AML para pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade e o desenvolvimento de políticas de integração.

Já Basílio Horta, presidente do Conselho Metropolitano de Lisboa (um órgão deliberativo constituído pelos presidentes das câmaras dos municípios que integram a AML), considerou que esta foi uma oportunidade para se fazer “uma reflexão alargada sobre a política de segurança em Portugal”. “[É] importante que o reforço [de meios] não seja apenas nesta fase”, apelou o também presidente da Câmara Municipal de Sintra. Neste concelho, na última noite, foram registadas 66 ocorrências ligadas aos desacatos, indicou.

Quanto à reunião entre os autarcas e o Governo, disse que foi pedido, no geral e “de maneira enfática”, mais policiamento na AML, uma melhoria nos equipamentos das forças de segurança e que as instalações policiais “tenham dignidade”. O reforço das competências da Polícia Municipal e a instalação de videovigilância como uma competência dos municípios são duas das questões que não reuniram consenso entre os 18 presidentes de câmara.

Relativamente aos próximos dias, Basílio Horta (PS) afirmou que “é difícil prever” o que pode acontecer. “É necessário estar atento.”

Já Paulo Silva (CDU), presidente da Câmara Municipal do Seixal, saiu da reunião a dizer que, além do reforço do policiamento, para o seu concelho são importantes medidas ligadas a questões como a “coesão social e a dignificação das carreiras policiais”. Reforçou ainda declarações já feitas nesta quinta-feira, em que referia que o responsável pelo incêndio a um autocarro no concelho do Seixal tinha sido um “grupo organizado”. “Não tenho dúvidas. O grupo apareceu e desapareceu. Se tivesse sido alguém do concelho do Seixal, tinha ido fazer tumultos noutras zonas do concelho. Foi ali com um objectivo pré-definido, cumpriu o objectivo e foi-se embora”, afirmou.

“Se for preciso mais esquadras em Lisboa, a câmara arranja as esquadras”, diz Moedas

Antes de a reunião terminar, Carlos Moedas disse aos jornalistas que aproveitou o encontro desta manhã para reforçar um pedido que tem vindo a fazer: é preciso mais polícias nas ruas, mais visibilidade ou equipamentos para esses agentes e a Polícia Municipal tem de ter mais competências. “Se for preciso mais esquadras em Lisboa, a Câmara Municipal de Lisboa arranja essas esquadras”, disse aos jornalistas o presidente da Câmara de Lisboa.

Carlos Moedas (PSD) referiu que, na última noite, na cidade de Lisboa foram registadas “algumas ocorrências”. O autarca salientou que teve “todos os meios do Estado central” e que a própria Polícia Municipal “pôs à disposição homens e mulheres”, bem como equipamentos como gruas ou carros. “Estive aqui para transmitir a solidariedade [aos municípios mais afectados nestas noites.]”

O autarca lisboeta aproveitou ainda para assinalar um “sentimento de insegurança” que diz existir “em toda” a cidade e insistiu que há falta de meios. “Em 2010, Lisboa tinha mais de 8000 Polícias de Segurança Pública e hoje tem 6700”, disse, referindo ainda a “necessidade do polícia de proximidade”. “A polícia não pode só aparecer quando há algum problema.”

Quanto ao reforço de poderes da Polícia Municipal, que tem vindo a defender, afirmou que esses profissionais “são treinados como PSP”. “A Polícia Municipal tem de ser capaz de deter alguém e de levá-lo para a esquadra”, disse.

A reunião com os autarcas da Área Metropolitana de Lisboa contou com a presença da ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, e do ministro da Presidência, António Leitão Amaro. O encontro, que já estava marcado com outros temas na agenda, decorre no seguimento dos acontecimentos desta semana. Odair Moniz, de 43 anos, morador no Bairro do Zambujal, no concelho da Amadora, foi baleado por um agente da PSP na madrugada de segunda-feira, no Bairro da Cova da Moura, no mesmo concelho, e morreu pouco depois, no Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa.

A PSP referiu que Odair Moniz se pôs “em fuga” de carro depois de ver uma viatura policial e “entrou em despiste” na Cova da Moura, onde, ao ser abordado pelos agentes, “terá resistido à detenção e tentado agredi-los com recurso a arma branca”, o que ainda não foi confirmado. A associação SOS Racismo e o movimento Vida Justa contestaram a versão policial e exigiram uma investigação “séria a isenta” para apurar “todas as responsabilidades”.

Desde a noite de segunda-feira foram registados desacatos no Bairro Zambujal e, já na terça-feira e quarta-feira, noutros bairros da Área Metropolitana de Lisboa, onde foram queimados autocarros, automóveis e caixotes do lixo, e detidas várias pessoas. Está internado em estado grave o motorista de um autocarro que ardeu esta madrugada em Santo António dos Cavaleiros, Loures. Nestes dias, há casos de polícias que receberam tratamento hospitalar devido ao arremesso de pedras e alguns passageiros dos autocarros incendiados sofreram esfaqueamentos sem gravidade. A PSP anunciou que tem identificadas “várias dezenas” de pessoas no âmbito das investigações em curso. A Inspecção-Geral da Administração Interna abriu um inquérito urgente e também a PSP anunciou um inquérito interno. O agente que baleou o homem foi constituído arguido.

Esta quinta-feira, António Leitão Amaro recusou falar sobre as investigações em curso. “O Governo não se pronunciará antes da conclusão do inquérito”, afirmou.

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