Advogados de portas da AIMA abordam imigrantes e cobram até 170 euros por serviços

Segundo associações, profissionais cooptam clientes nas portas dos centros de atendimento da AIMA, muitas vezes para cobrar por serviços gratuitos, aproveitando-se da fragilidade de imigrantes.

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Advogados se posicionam nas portas dos postos de atendimento da AIMA para abordar imigrantes e cobrar por serviços Nuno Ferreira Santos
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Associações que trabalham com imigrantes em Portugal têm encaminhado uma série de alertas à Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA) sobre presença constante de advogados nas portas dos centros de atendimento do órgão. Os relatos feitos nas reuniões semanais que as entidades têm com a agência apontam que os profissionais abordam os imigrantes com promessas fáceis, cobrando entre 150 e 180 euros (R$ 900 e R$ 1.080), sem revolver qualquer pendência.

“No desespero, as pessoas pegam tudo, mesmo que tenham de se endividar para isso”, diz a diretora de uma das associações, que pediu anonimato, por causa dos termos da parceria fechada com a AIMA para os novos centros de atendimento a imigrantes. “Sabemos que os advogados têm de trabalhar, mas esse negócio de abordagem na porta dos centros da AIMA chega a ser abusivo. Tudo o que esses profissionais oferecem aos imigrantes pode ser resolvido sozinho”, assinala. “A forma como esses advogados atuam é semelhante ao que vemos nas portas das cadeias no Brasil”, emenda.

Essa mesma diretora repassou à AIMA relatos de advogados que chegam com 30 pessoas por semana aos postos de atendimento. “Houve um caso recente de uma advogada que entrou com uma pessoa em um dos centros. Enquanto o imigrante falava com o atendente, a advogada foi ao toalete e, quando retornou, o cliente já tinha sido liberado, por precisou apenas fazer a biometria. Ela ficou falando para as pessoas que estavam lá que o imigrante havia saído sem pagá-la”, relata. “Casos como esse têm se tornado frequentes”, acrescenta. A AIMA abriu nesta semana mais quatro novos centros. Faltam os de Porto e o de Braga.

Na avaliação de Timóteo Macedo, da Associação Solidariedade Imigrante, a indústria de advogados para a área de imigração é resultado da ineficiência da AIMA em atender quem precisa dela. Há mais de 400 mil processos pendentes de resolução, deixando quem não pode pagar um advogado em situação de vulnerabilidade. A jurista Beatriz Sidrim ressalta que, diante do quadro atual, a AIMA “criou imigrantes de primeira e de segunda classes”. Para ela, “quem pode pagar advogado passa na frente da fila de espera e os mais pobres ficam para trás, o que é injusto”.

Questionada pelo PÚBLICO Brasil sobre os advogados de portas da AIMA, a Ordem dos Advogados de Portugal ressalta, em nota, que, nos termos do seu estatuto, "é expressamente proibida a angariação de cliente à advocacia". A entidade ressalta, no entanto, que "desconhece tais fatos, porque nada lhe foi reportado nesse sentido, pelo que, não poderá, naturalmente, tecer quaisquer comentários sobre alegações que são genéricas e que não identificam fatos concretos ou profissionais que alegadamente os estão a praticar".

Linhas congestionadas

Na reunião entre as associações e a AIMA realizada nesta segunda-feira (21/10), os presentes ressaltaram aos representantes da agência que o maior problema no atendimento aos imigrantes não foi resolvido: o acesso ao serviço de agendamento. Ou seja, os cidadãos não conseguem marcar um horário para ser recebidos com o intuito de resolver suas pendências.

“Isso acontece, sobretudo, porque as empresas que atuam no mercado da imigração e os escritórios de advocacia têm verdadeiras centrais telefônicas, com 10, 15 pessoas trabalhando para ficar ligando para a AIMA para agendar seus clientes. Com isso, congestionam as linhas para os demais imigrantes acessarem o agendamento”, ressalta a mesma diretora da associação.

Em relação aos novos centros de atendimento da AIMA, a avaliação geral das associações é de que, da porta para dentro, os serviços estão funcionando muito bem. Entre a conferência dos documentos e a coleta de dados biométricos, o tempo médio de atendimento é de 10 minutos. “O problema está fora dos centros, na dificuldade das pessoas de conseguirem marcação para ser atendidas”, complementa a representante da associação.

A expectativa é grande em relação à abertura dos centros de missão no Porto e em Braga, onde há muitos brasileiros. Toda a equipe que vai trabalhar no posto do Porto já foi selecionada, mas ainda falta montar a estrutura operacional, a parte tecnológica. Em Braga, os funcionários estão em processo de seleção, etapa que deve ser concluída nesta semana. Depois, começará a montagem operacional. No total, serão 15 novos postos da AIMA.

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