Enxurrada de ações contra a AIMA: somente em uma tarde, 500 processos protocolados

Advogados estão inundando o Tribunal Administrativo Fiscal de ações contra a Agência para Integração, Migrações e Asilo, que não consegue atender imigrantes a tempo e a hora. Há risco de colapso.

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Sem condições de prestar o atendimento que os imigrantes esperam dela, AIMA está no banco dos réus Nuno Ferreira Santos
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O Tribunal Administrativo Fiscal (TAF) vem registrando uma enxurrada de processos contra a Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA). Apenas entre a tarde de quarta-feira (16 de outubro) e a manhã de quinta (17 de outubro), 500 ações foram protocoladas por advogados contratados por imigrantes que se sentem prejudicados pela morosidade da agência em atender os seus pleitos. “O nosso grande temor é de que os tribunais colapsem por conta do excesso de processos”, diz o advogado Alfredo Roque, da VE Consultoria Jurídica, que antecipou os números ao PÚBLICO Brasil.

Ele ressalta que, antes do excesso de ações judiciais, os juízes do Tribunal levavam entre seis e 10 dias para notificar a AIMA e exigir a marcação de agendamento para os autores dos pedidos. “Em 30 dias, estávamos no balcão de atendimento da agência”, afirma Roque. Agora, há processos protocolados há mais de um mês que sequer chegaram às mãos dos magistrados. “Assim, os prazos para as respostas da AIMA, depois da notificação judicial, que iam de 21 e 37 dias, passaram para 45, depois, para 60, e, agora, estão chegando aos 90 dias”, acrescenta.

O advogado destaca que são oito os principais pedidos feitos pelos imigrantes nas ações judiciais, entre eles: reagrupamento familiar, emissão de cartão de cidadão que está com validade vencida, troca de documentos emitidos por meio do acordo de mobilidade da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e agendamento para pessoas que entraram em Portugal com vistos, mas sem marcação na AIMA. “As demandas são muitas, e vêm de todos os lados. Hoje, a maioria das ações movidas por advogados em Portugal tem a ver com a AIMA”, diz ele, baseado em conversas regulares com colegas de profissão.

As ações contra a AIMA, complementa Roque, começaram a ganhar força há cerca de seis meses. À época, os clientes eram, em maioria, brasileiros. “Agora, metade das pessoas que atendemos é de países africanos. E é triste ver como a situação de muitos delas é dramática. Há cidadãos que não têm mais condições de permanecer em Portugal, depois de esperarem tanto tempo por um atendimento da AIMA”, frisa. “Há, também, caso de pessoas que estão em Portugal há mais de cinco anos, que poderiam pedir a nacionalidade portuguesa, mas não conseguem, porque é preciso que a agência emita um documento comprovando esse prazo, o que não ocorre.”

Direito constitucional

O representante da VE Consultoria Jurídica assinala que, em todas as ações impetradas junto ao Tribunal Administrativo Fiscal, há pedido de liminares aos juízes, que as têm concedido. Os processos têm como argumento o direito constitucional de ir e vir, previstos nos Artigos 109 a 111 da Constituição portuguesa. “Não há como se negar um direito constitucional. O que vemos, diante da incapacidade da AIMA de atender os cidadãos estrangeiros que dela dependem, é um cerceamento de direitos”, assinala.

Roque está tão preocupado com o excesso de ações judiciais contra a agência, que teme se repetir, em Portugal, o que se viu no Brasil, na segunda metade dos anos de 1980, quando os tribunais foram inundados de processos cobrando o ressarcimento de perdas provocadas por um plano econômico, no caso, o Plano Bresser. “Foram tantas as ações contra o Governo, que os tribunais pararam de julgá-las até que o Supremo Tribunal Federal (STF) se manifestasse sobre o tema”, relembra. “Não descarto que algo nessa linha ocorra em Portugal”, ressalta.

Ao PÚBLICO Brasil, o gabinete do ministro da Presidência do Conselho de Ministros, António Leitão Amaro, informa que 10 dos 15 novos centros de atendimento da AIMA já estão em funcionamento e os do Porto e de Braga devem entrar em operação em breve. Esses centros fazem parte da força-tarefa para tentar reduzir os mais de 400 mil processos que estão pendentes na agência para migrações. A promessa é de volta à normalidade dos serviços a imigrantes até junho de 2025. Procurada, a AIMA não se manifestou.

Fábio Knauer, da Aliança Portuguesa, acredita que o Governo poderia acelerar o processo de regularização de imigrantes no país se recorresse mais à tecnologia. “Os bancos emitem cartões e entregam na casa dos clientes em menos de uma semana. Por que a AIMA não pode fazer o mesmo?”, questiona.

O advogado Fábio Pimentel, do escritório CPPB Law, acrescenta que o Governo precisa corrigir, rapidamente, os erros do passado para valorizar a presença de imigrantes no país, que têm dado importante contribuição à economia. Apenas os brasileiros pagaram mais de 1 bilhão de euros (cerca de 1,033 mil milhões de euros e de ​R$ 6 bilhões) à Segurança Social em 2023. A advogada Catarina Zuccaro afirma que está recorrendo à “advocacia de guerrilha” para enfrentar a AIMA na Justiça.

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