Justiça diz que castigar criança com banhos de água fria ofende dignidade humana

Influencer partilhou a sua actuação no Instagram, com o objectivo de ajudar pais a lidar com birras.

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Numa das vezes a criança foi submergida pela mãe na piscina, apesar de estar vestida com uniforme do colégio Adriano Miranda
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A influencer que mergulhou a filha de três anos e meio em água fria para lhe acalmar as birras ofendeu a dignidade humana da criança, diz a sentença que condenou Joana Mascarenhas a uma pena suspensa pelo crime de violência doméstica. A progenitora também foi obrigada a submeter-se a um plano de reinserção social e a pagar mil euros à filha, mas vai recorrer da condenação.

O caso remonta ao Verão do ano passado. A influencer de 36 anos estava com a filha na piscina do prédio onde residem, na Avenida de Berna, no centro de Lisboa, quando a criança começou a chorar alto. Acto contínuo, pegou nela e submergiu-a na piscina até ao queixo, apesar de estar ainda vestida com o uniforme do colégio.

Um segundo episódio do mesmo género ocorreu escassas semanas depois. Depois de a criança acordar a chorar e aos gritos durante a madrugada, por não querer estar sozinha, Joana Mascarenhas levou-a para a casa de banho e deu-lhe um duche de água fria, com o pijama vestido, até que se calasse. A seguir despiu-a – a criança ficou só de fralda -, enrolou-a numa toalha e pô-la a dormir na cama consigo.

O caso soube-se porque foi a própria mãe a partilhá-lo no Instagram, satisfeita por poder “ajudar outros pais a lidarem com situações idênticas”, ou seja, com manhas. Em tribunal disse-se arrependida, alegando ter lido na Internet que a água ajudava a relaxar. Mas no vídeo que publicou nesta rede social dava outro tipo de explicação: “Ninguém tem de levar com os gritos de uma criança que está só a medir pilinhas.” E perguntava: “Quem ganhou?”, numa referência ao facto de o choque com a água fria ter feito em ambas as ocasiões cessar a birra.

“Ainda que Julieta não apresente, neste momento, medo ou receio da água, tal não significa que este comportamento, face à tenra idade da criança, não seja apto a provocar impacto no seu desenvolvimento emocional”, considera a juíza que proferiu a sentença nesta semana. A conduta da influencer é qualificada como “atentatória da integridade física e emocional da criança”.

“A arguida sabia que estava a molestar física e psiquicamente a filha, submetendo-a a um tratamento indigno, susceptível de a atemorizar, de lhe causar frio, choque térmico, desconforto e angústia. Sabia que com a sua conduta condicionava gravemente a sua saúde e bem-estar psicossocial, ofendendo-lhe a dignidade humana”, lamenta a magistrada, que lhe aplicou uma pena suspensa de dois anos e meio de cadeia. Como em todas as penas deste género, se for apanhada a reincidir neste comportamento Joana Mascarenhas irá parar à prisão.

Quando a influencer contou ao companheiro o episódio do chuveiro este retorquiu-lhe: “Se calhar não devemos fazer isso.” Uma amiga sua que testemunhou em tribunal disse não reconhecer Joana Mascarenhas neste comportamento: “Teve um momento de desespero, estando a precisar de ajuda” para lidar com as birras.

O Ministério Público também pedia que o tribunal decretasse um período de afastamento entre mãe e filha, mas não o conseguiu.

A sentença diz ainda que reacções deste tipo são desadequadas e desproporcionais ao comportamento infantil, “excedendo de forma inaceitável o poder-dever de educação à luz da consciencialização ético-social da actualidade”.

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