“Ganha Portugal” ou “revela derrota”: as reacções à luz verde do PS no OE2025

Governo recebeu garantia de que terá OE2025 viabilizado pelo PS e as reacções de partidos e deputados oscilam entre a satisfação e a desilusão, havendo mesmo quem critique a “fragilidade” da decisão.

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Secretário-geral do Partido Socialista, Pedro Nuno Santos, presta declarações a propósito do Orçamento do Estado para 2025 ANTÓNIO COTRIM / LUSA
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As reacções começaram a chegar meros minutos depois de o líder do PS, Pedro Nuno Santos, anunciar que vai propor à comissão política nacional que o partido se abstenha na votação do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), quer na generalidade quer na votação final global.

Na noite desta quinta-feira, a duas semanas da primeira votação, e a poucas horas do arranque do congresso do PSD, Montenegro recebeu a garantia de que terá o OE2025 viabilizado pelo PS, acreditando assim que foi afastado o fantasma da crise política que podia acabar em eleições antecipadas. Mas as reacções de partidos e deputados oscilam entre a satisfação e a desilusão, havendo mesmo quem acredite que esta decisão "revela fragilidade, derrota e cedência à pressão interna por parte da liderança socialista" de Pedro Nuno Santos.

O primeiro-ministro, um dos primeiros a reagir ao anúncio de Pedro Nuno Santos, saudou “democraticamente” a decisão, destacando o “sentido de responsabilidade” do principal partido da oposição. “Aquilo que posso dizer, do ponto de vista democrático, é saudar o sentido de responsabilidade e de prevalência do interesse nacional que o PS expressa ao viabilizar este importante instrumento que pode contribuir para a execução do programa de Governo”, declarou Luís Montenegro.

Luís Montenegro vincou o “esforço muito significativo de aproximação às preocupações essenciais do PS”, dada a “humildade” do Governo em reconhecer que não tem maioria absoluta. “Vejo com esperança a decisão do PS, de respeito pela vontade do povo e de não contribuir para acrescentar incertezas”, adiantou.

Também o líder parlamentar do PSD considerou que a proposta “é responsável” e representa uma vitória para Portugal. “A decisão de Pedro Nuno Santos de viabilização total do Orçamento do Estado para 2025 é responsável e revela que o interesse nacional prevaleceu”, escreveu Hugo Soares, numa publicação no X (antigo Twitter). O líder parlamentar e secretário-geral do PSD defendeu que a proposta orçamental do Governo para 2025 é boa “para os jovens, para os trabalhadores, para os pensionistas e para as empresas”. “Uma certeza: ganha Portugal”, acrescentou.

Em entrevista ao programa Vichyssoise da Rádio Observador, Luís Filipe Menezes, antigo presidente do PSD, referiu que a decisão do secretário-geral significa "um velório da 'geringonça'" e que Pedro Nuno Santos, com esta posição, "esvaziou um pouco de interesse" o congresso do PSD. Menezes também acredita que o PS podia ter viabilizado o Orçamento sem entrar em processo negocial. "Não se tinha comprometido", apontou.

Já Francisco Assis, eurodeputado socialista, disse estar "satisfeito com a decisão" por ser a que "melhor serve o interesse público na presente conjuntura nacional" e defendeu Pedro Nuno Santos, dizendo que é um "político sério" e não é "calculista ou cínico", sabe "ouvir e decidir".

"Pedro Nuno Santos demonstrou possuir, o que me não surpreende, a coragem de um líder e a ponderação de um estadista. Desautorizou todos quantos o associam a um sectarismo radical e dogmático. O PS é e será sempre um grande partido da esquerda democrático e empenhado, esteja no poder ou na oposição, em contribuir para afirmação de um país cada vez mais livre, mais próspero e mais justo", disse Assis em declarações ao PÚBLICO.

Também Fernando Medina apelidou a decisão de Pedro Nuno Santos de "boa e desejável" e disse que é a que "melhor protege os interesses do país" nesta fase. Medina negou que exista falta de união dentro do PS, explicando que, num partido de grande dimensão "existem pessoas com diferentes visões em sensibilidades". "O que o Partido Socialista fez foi um processo que, não correspondendo à sua matriz original de não viabilizar orçamentos da oposição, constatou aquilo que era a incapacidade e uma certa bagunça no espaço da direita relativamente ao orçamento, que disponibilizar-se a negociar", referiu o socialista em entrevista ao Canal Now na noite desta quinta-feira.

"Fragilidade, derrota e cedência à pressão interna"

A Iniciativa Liberal considerou, por outro lado, que a decisão revela "fragilidade, derrota e cedência à pressão interna" por parte da liderança socialista. Esta posição foi transmitida no Parlamento pelo presidente da Iniciativa Liberal (IL), Rui Rocha, que acusou Pedro Nuno Santos de ter “mergulhado o país num drama” ao longo de meses para anunciar agora uma decisão sobre o Orçamento em relação à qual “não tinha fuga possível”.

“Do ponto de vista do PS, esta era uma proposta de Orçamento que não se podia recusar. Do ponto de vista do país, esta proposta negociada com o PS é um mau Orçamento”, disse, adiantando que a IL vai decidir este domingo o seu sentido de voto face ao diploma do executivo. Perante os jornalistas, o líder da IL acusou Pedro Nuno Santos de ter mergulhado o país “durante meses, numa dúvida face à qual o secretário-geral do PS chega agora à conclusão de que não fazia nenhum sentido”.

O Chega não se mostrou surpreendido pela decisão de Pedro Nuno Santos e considerou que PS está a "assumir o encargo da governação, a suportar o Governo". André Ventura falava aos jornalistas na Assembleia da República e indicou que este anúncio “não é mais do que o corolário de um processo” identificado pelo Chega “de que PS e PSD estavam a construir juntos uma governação conjunta, um orçamento de bloco central”, que levou o partido a excluir-se das negociações em torno do OE2025.

"Faz todo o sentido, com este tipo de orçamento, que seja o PS finalmente, depois de toda uma encenação durante meses, a assumir que é o parceiro de governação de Luís Montenegro e deste orçamento", sustentou. Ventura defendeu também que o processo negocial tem a vantagem de clarificar "quem fica a sustentar o Governo e quem fica a liderar a oposição, que é o caso do Chega".

"Cheque em branco"

O Bloco de Esquerda teceu críticas a Pedro Nuno Santos e ao PS por viabilizarem uma proposta que "reflecte o programa de Governo" sem chegar a qualquer acordo com o executivo. “Este anúncio é feito pelo secretário-geral do PS, apesar de não haver um acordo e apesar de o orçamento reflectir o programa de governo do PSD, como aliás o primeiro-ministro disse ontem. E portanto, o PS viabilizou o orçamento do programa da direita, como se um governo de maioria absoluta do PSD se tratasse em Portugal”, acusou Mortágua.

Nas palavras da dirigente bloquista, “quem viabiliza um orçamento de direita não é alternativa à direita”, frisando que o “Bloco de Esquerda, sem nenhum desalento e com toda a convicção, é uma alternativa ao Governo de direita e ao orçamento do programa do PSD”.

A líder parlamentar do PCP também criticou a decisão, que acredita que só favorecerá "os grupos económicos”. Em declarações aos jornalistas, no Parlamento, Paula Santos afirmou que os comunistas não “aceitam intervir com base na pressão e chantagem” da ideia de “ou há orçamento ou há eleições”. Paula Santos considerou que Pedro Nuno Santos “determinou a sua disponibilidade para o agravamento da injustiça fiscal” e mostrou a “convergência do PS” com o Governo no “sentido do favorecimento dos grupos económicos, que é o que no essencial consta desta proposta de Orçamento”.

“Eu queria deixar muito clara a oposição do PCP em relação à proposta deste Orçamento, por tudo aquilo que ela representa, do que contém e que não contém, sublinhar a necessidade de uma política alternativa, porque o país não está condenado a este caminho que nos querem impor”, acrescentou. A líder parlamentar dos comunistas reiterou ainda que os “trabalhadores podem contar com a intervenção” do PCP para defender alternativas, nomeadamente ao nível do reforço de rendimentos e investimento no serviços públicos.

Paulo Muacho, do Livre, não saudou nem se mostrou contra a decisão do líder socialista. Disse apenas esperar que não signifique “um cheque em branco” ao Governo. “O que entendemos e esperamos é que este anúncio não seja um cheque em branco ao Governo, que não seja um cheque em branco ao PSD e CDS e que haja a possibilidade de, num processo de especialidade, se poder avançar e melhorar o orçamento de estado tal como ele está”, considerou o deputado do Livre

Muacho afirmou que “é um facto que o país teve eleições há pouco tempo, e é um facto que nada perspectiva que havendo novas eleições o quadro político se alteraria de forma significativa” e disse respeitar a posição do PS.

Interrogado sobre se é positivo não serem convocadas novamente eleições legislativas, Paulo Muacho respondeu que “depende do que se puder mudar e melhorar” no Orçamento do Estado na fase de especialidade. “Se for uma decisão apenas para passar um cheque em branco ao Governo do PSD e CDS não será provavelmente uma posição positiva. Se houver a possibilidade de na especialidade se melhorar algumas das coisas que o Governo quer fazer que são negativas para o país, então aí pode haver uma melhoria relativamente ao que temos neste momento”, sublinhou.

Já a deputada única do PAN espera que esta decisão seja uma oportunidade para “corrigir os retrocessos” que o documento apresentado pelo Governo tem.

Em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, Inês de Sousa Real disse que a abstenção do PS “deve representar uma oportunidade para que em sede de especialidade se possa corrigir os retrocessos” do OE2025 em áreas como a protecção animal e do ambiente e também “em matéria de direitos sociais e humanos, como é o caso do combate à pobreza e à vulnerabilidade extrema.

A porta-voz do partido Pessoas-Animais-Natureza apelou também a PS e PSD para que, na especialidade, “dêem oportunidade aos partidos que de forma construtiva têm sempre feito oposição, como é o caso do PAN”. “Da nossa parte não nos demitiremos de apresentar propostas de alteração para vermos espelhadas as causas que representamos aqui na Assembleia da República no Orçamento do Estado”, indicou.