Há cada vez menos lampreias: rio Mondego com menor quantidade desde que há registos

Escassez deverá levar a limitações à pesca em 2025 e outras restrições. Apesar do declínio da oferta, o mercado até reagiu bem à falta de lampreia com animais a serem vendidos a 100 ou 150 euros.

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Lampreia com e sem pele Nelson Garrido
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O Mondego teve em 2024 o ano com menor efectivo de lampreias adultas no rio desde que há registos, revelou hoje um investigador da área, referindo que serão aplicadas medidas de limitação à pesca em 2025.

"Foi o ano com menos efectivo de adultos reprodutores no Mondego", disse à Lusa Pedro Raposo Almeida, director do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) e especialista em peixes anádromos (espécies que, como a lampreia, se reproduzem em água doce, mas que se desenvolvem até à forma adulta no mar).

Em Fevereiro deste ano, o investigador tinha já defendido a proibição da pesca de lampreia. "A situação piorou. É uma sucessão de anos maus. 2017, 2019, 2022 e 2023 foram anos maus, motivados pela seca e por outras situações que ainda não se consegue explicar, visto que há um desconhecimento do que acontece com a espécie no mar, em que pode haver mais mortalidade", afimou Pedro Raposo, director do Mare e especialista em peixes anádromos (espécies que, como a lampreia, se reproduzem em água doce, mas que se desenvolvem até à forma adulta no mar).

Segundo o investigador, era já esperado em 2024 "um ano desastroso, porque o pescador não apanhou lampreia", mas nos registos da passagem da lampreia no açude-ponte de Coimbra foram contabilizados 1969 espécimes, muito abaixo daquilo que seria ideal para a sustentabilidade daquele animal (acima dos 10 mil), mas longe dos números mais baixos até agora registados no açude-ponte (em 2017, foram contabilizados 295 espécimes, e 717 em 2019).

No entanto, Pedro Raposo Almeida sublinhou que esse dado isolado não permite explicar a evolução do efectivo, já que este ano terão sido pescadas menos lampreias na Figueira da Foz e em Montemor-o-Velho do que aquelas que passaram o açude-ponte, em Coimbra. "Em 2017, por exemplo, estima-se que houve 12 mil animais capturados", notou, esclarecendo que o efectivo presente no rio era muito superior ao deste ano, em que não houve "sequer cinco mil no rio, o que, para o Mondego, é catastrófico".

Reunião para tomar medidas

Estes dados foram comunicados na terça-feira, numa reunião na Figueira da Foz que juntou pescadores, a Universidade de Évora/MARE, representantes da Direcção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM), Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), Autoridade Marítima, PSP e Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente da GNR.

A reunião, realizada no âmbito do projecto de investigação internacional DiadSea, liderado pela Universidade de Évora/MARE, foi também uma oportunidade para comunicar e estabelecer o regulamento para 2025, que trará limitações à pesca da lampreia.

Segundo o especialista, ficou estabelecido que até 2030 será abolido o botirão no estuário do Mondego, uma arte de pesca que consiste numa rede estacada (fixa) de grandes dimensões dirigida à lampreia. "O que vamos fazer é tirar todos os anos dez dias ao período de pesca com recurso a esta arte, até não se utilizar mais em 2030", vincou. De acordo com o investigador, com esta arte, os animais são "encaminhados para um saco de onde entram e já não saem", sendo possível "estar sempre a pescar com um esforço mínimo". "É preciso dar uma maior chance à lampreia de conseguir subir o Mondego", vincou.

Pedro Raposo Almeida referiu que os pescadores do estuário do Mondego perceberam a necessidade de se avançar com medidas para assegurar a presença da lampreia no rio, cujo efectivo está em forte declínio. "Eles perceberam que as coisas não estavam nada bem, até porque este ano não apanharam e entenderam que era preciso fazer alguma coisa", notou. Para o investigador, caso não haja uma evolução positiva do efectivo de lampreia no Mondego, poderá ter de ser pensado outro tipo de restrições para 2026.

Lampreias a 100 ou 150 euros

Apesar de todos os problemas, Pedro Raposo Almeira considera que há um trabalho positivo nos últimos dez anos, nomeadamente no envolvimento da comunidade de pescadores. "Dentro da hecatombe que todos nós observámos este ano, percebeu-se uma coisa. O mercado até reagiu bem à falta de lampreia, ou seja, pagou e pagou muito bem, com animais a serem vendidos a 100 ou 150 euros", notou. Disse ainda acreditar que é possível assegurar uma pesca "sustentável, pescando menos, mas com um rendimento superior".

Sobre a escassez de lampreia nos rios portugueses, o investigador tinha já referido em Fevereiro que "esta não é uma situação exclusiva de Portugal, em Espanha e França também se regista escassez de lampreia, mas o país conta com a agravante de ser o limite sul de distribuição da espécie".

"Se fôssemos coerentes, deveríamos fechar a pesca. A qualquer animal deveria ser dada a oportunidade para se reproduzir, se não daqui a 7 anos [ciclo de vida da lampreia] será ainda pior", defendeu o investigador.

Quanto às razões que podem explicar esta diminuição progressiva da espécie, Pedro Raposo Almeida admitia que o declínio poderá estar associado a alguma alteração no mar, onde as lampreias passam cerca de cinco anos da sua vida, antes de subirem o rio para se reproduzirem.

"Nenhum cientista português ou estrangeiro sabe o que se passa [no mar]. Colocamos como hipótese que as alterações climáticas tenham alterado os comportamentos das lampreias no mar e que possam estar a afastar-se da zona", referiu, dando conta de que está em curso o projecto de investigação europeu que procura perceber melhor a distribuição e mortalidade de espécies migradoras no mar, no qual o Mare participa.