Governos da UE concordam em adiar por um ano regulamento da desflorestação

Algumas empresas e Estados pressionaram Comissão Europeia a atrasar directiva que proíbe comércio de bens relacionados com destruição das florestas. Outras empresas criticam este passo atrás.

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Operação contra tráfico de madeira e mineração ilegal na Amazónia brasileira UESLEI MARCELINO/REUTERS
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O Conselho da União Europeia (UE) prolongou nesta quarta-feira por mais um ano o prazo para a entrada em vigor da regulamentação que visa combater a desflorestação, proibindo a importação para os Vinte e Sete de produtos relacionados com o abate de florestas em todo o mundo.

O regulamento está em vigor desde 29 de Junho de 2023 e deveria ser aplicado na totalidade a partir de 30 de Dezembro deste ano. Com esta alteração, só começará a ser aplicado a 30 de Dezembro de 2025, para as maiores empresas, e a 30 de Junho de 2026, para empresas de menor dimensão.

"Este adiamento permitirá aos países terceiros, Estados-membros, operadores e comerciantes preparem-se plenamente para as suas obrigações de devida diligência, para garantir que algumas matérias-primas e produtos vendidos na UE ou exportados a partir da UE não tenham custos de desflorestação", justifica o comunicado de imprensa da União Europeia.

Alguns governos, empresas e responsáveis pelo comércio externo tinham pressionado fortemente a União Europeia para que não entrasse em vigor no fim deste ano a pioneira regulamentação que visa combater a desflorestação no mundo inteiro.

"É um passo atrás que desaponta profundamente", comentou, em comunicado, a WWF Europa.

"Com esta decisão, os Estados-membros aceitam explicitamente que durante mais 12 meses sejam destruídas florestas para benefício do consumo europeu. Não só desrespeitam decisões democráticas já tomadas e os 1,2 milhões de europeus que apelaram ao fim da desflorestação, como traem as empresas que já investiram fortemente para poder cumprir o regulamento", afirmou Anke Schulmeister-Oldenhove, gestora de florestas no Fundo Mundial para a Natureza (WWF, na sigla em inglês) Europa.

O grupo europeu de oleaginosas Fediol afirmou que os seus membros — que incluem gigantes do comércio como a Cargill e empresas de transformação alimentar como a AAK — sofrerão perdas devido a este adiamento. Isto porque investiram fortemente para garantir que as matérias-primas que usavam cumpririam a directiva europeia.

"Incorrem numa perda financeira por terem estado prontos a tempo", disse à Reuters a directora-geral da Fediol, Nathalie Lecocq.

Os transformadores de cacau e os fabricantes de chocolate enfrentam o mesmo cenário, com os comerciantes a afirmarem que lhes venderam sementes isentas de desflorestação com um prémio de até 6%, o que equivale a 360 euros por tonelada.

Mas a Federação Europeia dos Produtores de Rações Animais (FEFACT), a Copa-Cogeca (o grupo de pressão dos agricultores da UE), e vários outros sectores afectados pelo regulamento acolheram favoravelmente a proposta de adiamento, depois de terem avisado que a aplicação atempada das regras resultaria em prejuízos para muitas pequenas empresas.

Esta directiva estipula que não podem ser comercializados produtos nos países da União Europeia cuja produção tenha dado origem a desflorestação, sob pena de pagarem multas que podem ir até 20% do facturamento das empresas. As matérias-primas em causa podem estar em bens que tanto podem ser mobília, como carne, ou perfumes, ou chocolate, só para citar alguns exemplos.

A WWF apela ao Parlamento Europeu para que rejeite a proposta da Comissão Europeia para o adiamento, aprovada nesta quarta-feira pelo Conselho (onde estão representados os Governos dos Vinte e Sete).

E pede aos eurodeputados que "actuem no interesse da sustentabilidade a longo prazo, em vez de darem prioridade às pressões de curto do prazo de algumas empresas. "É essencial que a UE tenha um ambiente regulatório previsível para encorajar o investimento continuado em práticas sustentáveis", diz a organização de defesa da natureza.