Guiné-Bissau não assinou carta de apoio a Guterres depois da decisão de Israel

Governo guineense fica de fora da lista de 104 países que mostram “preocupação” por Israel ter declarado o secretário-geral da ONU persona non grata. Da CPLP, a Guiné Equatorial também não assinou.

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Umaro Sissoco Embaló com António Guterres nas Nações Unidas Ariana Lindquist/UN Photo
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A Guiné-Bissau não faz parte dos 104 países que assinam uma carta de apoio enviada a António Guterres, e que manifesta “profunda preocupação” pela decisão do Governo de Israel de declarar o secretário-geral das Nações Unidas como persona non grata. Dos Estados-membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), só a Guiné-Bissau e a Guiné Equatorial não constam entre os signatários, e o Brasil está mesmo entre o grupo por trás da iniciativa.

“Esta carta é assinada por uma generalidade de membros das Nações Unidas, reflectindo um apoio amplo e colectivo de toda a comunidade internacional”, diz a representante permanente do Chile na ONU, Paula Narváez, a quem coube enviar a missiva, em nome de todos, a Guterres, com cópia para o presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas, o camaronês Philemon Yang.

“Em nome de um grupo nuclear composto pelo Brasil, Colômbia, África do Sul, Uganda, Indonésia, Espanha, Guiana, México e o meu próprio país, o Chile, tenho a honra de anexar uma carta conjunta em que manifestamos a nossa profunda preocupação com a recente declaração do ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel, que o declarou persona non grata. Do nosso ponto de vista, tais acções comprometem a capacidade das Nações Unidas de cumprirem o seu mandato, que inclui a mediação de conflitos e a prestação de apoio humanitário.”

Além dos 104 países, também a União Africana, de que a Guiné-Bissau faz parte, assina a carta.

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“Não sei qual é a motivação das autoridades, portanto, do Governo actual e do Presidente da República, para não se alinhar nem com o sentido da maior parte dos Estados-membros da CEDEAO [Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental] nem com a União Africana, nem se alinhar com outros espaços como a CPLP”, disse ao PÚBLICO o ex-primeiro-ministro guineense e ex-secretário-geral da CPLP Domingos Simões Pereira.

Para o presidente do Parlamento que o Presidente guineense dissolveu, devia haver “algum limite” para “a falta de sentido de Estado”. Porque um país como a Guiné-Bissau, cujo processo de libertação tanto beneficiou da acção das Nações Unidas e do “concerto das nações”, devia “acompanhar a dinâmica mundial no sentido de manter o multilateralismo como uma das vias essenciais para se ir dirimindo os conflitos”.

O Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, mantém uma relação estreita com Israel, que terá treinado a sua guarda presidencial, que inclui um serviço de informações. O seu homólogo israelita, Isaac Herzog, chamou-lhe “um verdadeiro amigo de Israel”, aquando da visita oficial de Embaló a Israel em Março. Nessa altura, Herzog, citado pelo site do Governo israelita, referiu que Israel não esquece os seus amigos: “Vocês estiveram connosco mesmo neste momento difícil. Apoiaram a nossa posição na União Africana e deram provas de verdadeira amizade. Israel quer ajudar-vos e ao vosso povo de todas as formas possíveis.”

No mês seguinte, a Flotilha da Liberdade acusou as autoridades guineenses de retirar a bandeira a duas das suas embarcações que se dirigiam com ajuda humanitária para a Faixa de Gaza durante uma inspecção suplementar. “Antes de a inspecção estar concluída, o Registo Internacional de Navios da Guiné-Bissau (GBISR), numa atitude manifestamente política, informou a Coligação da Flotilha da Liberdade de que tinha retirado a bandeira da Guiné-Bissau a dois dos navios da Flotilha da Liberdade", um dos quais era "um cargueiro carregado com mais de cinco mil toneladas de ‘ajuda vital’ para os palestinianos de Gaza”, dizia o comunicado da organização, a 27 de Abril.

Dois dias depois, Umaro Sissoco Embaló desmentia a situação à Lusa, dizendo que “a Guiné-Bissau nunca teve navios”, assegurando nada saber sobre retirada de bandeiras e garantindo que, ao contrário do que afirmou a Flotilha da Liberdade, não tinha cedido a quaisquer pressões do Governo de Israel.

"Eu não falo geralmente com o primeiro-ministro de Israel. Com quem falo é com o Presidente de Israel, que é um amigo, que conheci já há muitos anos. É com quem tenho falado, mas sobre a guerra na Faixa de Gaza", explicou. Mas assegurou que nunca falou com o seu homólogo "sobre embandeiramento dos navios", até porque essa é uma matéria sobre a qual "não é o Presidente da República que trata".

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