Um cientista afirma que Colombo era um judeu sefardita de Valência. Os seus colegas não estão tão convencidos

Novo documentário sobre o suposto ADN de Colombo diz que o navegador era um judeu de Valência. Mas os cientistas criticam o investigador que os estudou: nunca publicou relatórios para revisão.

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Turistas visitam o mausoléu de Cristóvão Colombo na catedral de Sevilha, em Espanha, a 11 de Outubro Marcelo del Pozo / REUTERS
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Um investigador espanhol afirma ter apurado que Cristóvão Colombo, o navegador que alcançou o continente americano a 12 de Outubro de 1492, era um judeu sefardita natural de Valência. José Antonio Lorente desenvolveu esta tese depois de analisar o material genético "muito parcial, mas suficiente" supostamente pertencente a Cristóvão Colombo e de o ter comparado com o do filho, Fernando Colombo. Essas conclusões surgem agora num novo documentário transmitido este sábado, 12 de Outubro, Dia da Hispanidade, pela televisão espanhola RTVE que "responde aos grandes enigmas" sobre o explorador. Mas estão envoltas em críticas.

Até agora, julgava-se que Cristóvão Colombo​ tinha nascido na cidade italiana de Génova em 1451 e que veio a morrer, em 1506, em Valladolid, Espanha. Mas, ao fim de 22 anos de estudos científicos, um investigador forense da Universidade de Granada veio afirmar que, afinal, nada disso seria verdade: em público, Cristóvão Colombo aparentava ser católico, mas em privado seguia as tradições e os costumes dos judeus sefarditas. E isso traduz-se numa "incompatibilidade total" com a ideia de que nasceu, cresceu e estudou em Génova, porque os judeus sefarditas foram expulsos dessa região muito antes do nascimento do navegador, no século XII.

Isso mesmo foi transmitido por José Antonio Lorente, autor de Colón ADN, Su Verdadero Origen (em português: "Colombo ADN, a sua verdadeira origem"), ao arquitecto Francesc Albardaner, ex-presidente do Centro de Estudos Colombinos de Barcelona e autor do livro El Origen Catalán de Colom: Ciencia Histórica o Fanatismo Patriotero (em português, "A Origem Catalã de Colombo: Ciência Histórica ou Fanatismo Patriótico"), conta o ABC. Afinal, Cristóvão Colombo seria originalmente dos antigos territórios de Aragão, onde viveriam 200 mil judeus. Em Itália seriam apenas 14 mil — e, embora a Sicília pertence à Coroa de Aragão no século XV, falava-se italiano nessa região. E não há qualquer indício da língua italiana nos textos escritos por Colombo, que estavam todos em castelhano.

Esta tese foi constituída depois de José Antonio Lorente ter analisado tanto o ADN nuclear (o material genético presente no núcleo das células e que corresponde a uma mistura da informação transmitida por ambos os progenitores), como o ADN mitocondrial (o presente nas mitocôndrias, fonte da energia das células, transmitido unicamente pela mãe) recolhidos nas ossadas de Fernando Colombo, filho de Cristóvão. Segundo o investigador, tanto o cromossoma Y (transmitido unicamente pelo pai) como o ADN mitocondrial exibem "rasgos compatíveis com a origem judia".

E as descobertas não se ficam por aí: Francesc Albardaner teoriza, no mesmo documentário, que Cristóvão Colombo seria filho de um imigrante vindo de Ligúria (a região onde fica Génova), que era de uma família de tecedores de seda residente em Valência e que seria "judeu de cultura, judeu de religião, judeu de nação e sobretudo de coração", uma vez que "transpira judaísmo nos seus escritos". As comparações entre o alegado ADN de Cristão Colombo com os restos mortais bem preservados do filho comprovam ainda que as ossadas no túmulo na Catedral de Sevilha são mesmo do explorador, o que deixaria cair por terra a ideia de que, afinal, os restos mortais de Colombo estavam afinal na República Dominicana.

Mas estas conclusões não convencem toda a gente. Um antropólogo forense que chegou a participar nas primeiras análises aos restos mortais exumados do alegado túmulo de Cristóvão Colombo em Sevilha, Miguel Botella, disse ao El País que as ossadas não passavam de pequenos 150 gramas de fragmentos de ossos. As análises com laser demonstraram que todos pertenciam à mesma pessoa — um homem entre os 50 e os 70 anos — e que se tinham retirado os tecidos moles para preservar apenas os ossos, mas não terá sido possível recuperar material genético após a exumação. Miguel Botella acabou por sair do projecto em 2005.

Isso corrobora a opinião transmitida por Antonio Alonso, especialista em genética e ex-director do Instituto Nacional de Toxicologia e Ciências Forenses, ao mesmo jornal espanhol após a transmissão do documentário: "Infelizmente, do ponto de vista científico, não se pode fazer qualquer avaliação depois de ver o documentário, porque não oferece um mínimo de dados sobre o que foi analisado", considerou: "A minha conclusão é que o documentário não mostra o ADN de Colombo em nenhum momento e nós, cientistas, não sabemos que análises foram efectuadas."

O próprio autor do documento já tinha dito em 2010, enquanto a investigação estava em curso, que o material genético atribuído a Cristóvão Colombo vinha de fragmentos "muito pequenos" de ossos, em quantidades insuficientes para chegar a conclusões definitivas. E nenhum dos dados que José Antonio Lorente foi transmitindo publicamente nas últimas duas décadas sobre a sua investigação resultaram, até agora, em estudos científicos revistos pelos pares. Em declarações ao El País, o cientista defende-se dizendo que publicará todos os dados quando os estudos da sua equipa terminarem e que o programa transmitido na RTVE é meramente um filme, não um documentário de cariz científico.

Mas o argumento não satisfaz as dúvidas Antonio Alonso, que é um dos nomes maiores do estudo da genética em Espanha: "É incompreensível que se apresentem à sociedade dados que a comunidade científica ainda não aprovou, o que coloca em risco os próprios dados e as hipóteses apresentadas", concluiu.

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