Plano de insolvência da FTX está aprovado, maioria dos lesados recupera (quase) tudo
Gestores de insolvência da FTX recuperaram mais dinheiro do que aquele que é preciso para ressarcir lesados da plataforma de criptoactivos. Quem tinha até 45,5 mil euros investido vai recuperar tudo.
O plano de insolvência da FTX, que prevê que os investidores da plataforma de criptoactivos agora encerrada possam recuperar quase a totalidade daquilo que investiram e perderam quando a empresa faliu, foi aprovado no tribunal onde decorre o processo de insolvência. A decisão foi conhecida nesta segunda-feira, depois de os gestores da insolvência da FTX terem conseguido chegar a acordo com reguladores e fisco dos Estados Unidos, com quem travavam litígios.
O plano foi aprovado pelo juiz John Dorsey, que está a julgar a insolvência da FTX no tribunal de Delaware, Estados Unidos, onde decorre este processo. O plano determina que 98% dos clientes da plataforma de criptoactivos – aqueles que detinham até 50 mil dólares (cerca de 45,5 mil euros, à cotação actual) em activos depositados na plataforma – sejam ressarcidos no prazo de 60 dias a partir da data em que o plano comece a produzir efeitos (que ainda não foi definida).
A decisão surge depois de os gestores de insolvência da FTX terem chegado a acordos nos litígios com o fisco norte-americano (o Internal Revenue Service, ou IRS), a Comissão de Negociação de Contratos Futuros de Commodities (CFTC, na sigla em inglês) e a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês). Por si só, o fisco chegou a reclamar 44 mil milhões de dólares à FTX, alegando evasão fiscal, valor que acabou por baixar para oito mil milhões de dólares. No âmbito dos acordos alcançados com a FTX, estes organismos concordaram em permitir que a empresa falida dê prioridade ao ressarcimento dos clientes lesados, para só depois pagar as multas e dívidas fiscais.
Ao todo, de acordo com a informação disponível no plano agora aprovado, a FTX terá entre 14,7 mil milhões e 16,5 mil milhões de dólares (ou entre 13,4 mil milhões e 15 mil milhões de euros, à cotação actual) para pagar aos credores que foram reconhecidos – estes valores serão suficientes para cobrir 118% dos montantes que tinham nas suas contas da FTX em Novembro de 2022, quando a plataforma faliu. Dito de outra forma, a FTX vai devolver aos seus clientes os investimentos que perderam há dois anos e ainda sobrará dinheiro, que será usado para pagar juros e indemnizações a estes credores.
A justificar este excedente está a valorização dos criptoactivos nos últimos dois anos. Em concreto, os gestores de insolvência da FTX beneficiaram, sobretudo, do facto de a solana, criptomoeda em que a empresa falida apostava, se ter valorizado mais de 900% durante o ano passado. Para além de terem levantado estes investimentos, convertendo-os em dinheiro, foram vendendo vários activos, incluindo uma participação na Anthropic, empresa que actua na área da inteligência artificial.
Apesar de o plano ter sido aprovado, nem todos os credores estão satisfeitos com o desfecho. Em causa está o facto de o plano prever restituir o dinheiro perdido considerando as cotações à data de Novembro de 2022. Ora, nessa altura, os activos em que a maioria dos investidores da FTX tinha o dinheiro aplicado valiam significativamente menos do que agora. A título de exemplo, a bitcoin, principal moeda a nível mundial, estava a negociar-se na casa dos 16.800 dólares; esta terça-feira, vale em torno de 63 mil dólares.
Os gestores de insolvência da FTX argumentam, contudo, que o ressarcimento tem de ser feito por via da devolução de dinheiro, e não de criptoactivos, uma vez que os activos que eram detidos por estes clientes antes de a plataforma ter falido simplesmente desapareceram, tendo sido desviados por Sam Bankman-Fried, o fundador da FTX entretanto condenado a 25 anos de prisão. De acordo com John Ray III, presidente da equipa que gere a insolvência da FTX, em Novembro de 2022, a empresa só detinha 0,1% das bitcoins que os clientes acreditavam ter depositado na plataforma.
Não há, ainda, uma data definida para que o plano de insolvência comece a ser executado. Antes disso, a FTX irá constituir um fundo e contratar uma empresa externa para supervisionar o processo de distribuição do dinheiro. Os gestores da insolvência detalham que estão a desenhar os últimos pormenores para avançar com este processo, que envolve mais de 200 jurisdições por todo o mundo.
Portugal estará incluindo nesse leque. Pelo menos, cerca de 100 empresas e investidores individuais com sede em Portugal terão perdido cerca de seis milhões de euros com o colapso da FTX e estão entre o grupo de credores a quem se espera que seja devolvido o dinheiro na totalidade.