Reino Unido cede soberania das ilhas Chagos à Maurícia, mas mantém base militar

Arquipélago integra Território Britânico do Oceano Índico desde 1968 e alberga base aérea operada em conjunto com os EUA. Biden apoia acordo entre Starmer e o Governo mauriciano.

Foto
Imagem de arquivo da base militar de Diego Garcia, arrendada pelo Reino Unido aos EUA Reuters Photographer / REUTERS
Ouça este artigo
00:00
03:25

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

O Reino Unido anunciou nesta quinta-feira que vai ceder a soberania das ilhas Chagos à República da Maurícia. A cedência do conjunto de atóis localizado a mais de dois mil quilómetros da costa oriental de África, que integra o Território Britânico do Oceano Índico desde os anos 1960, será feita através de um acordo que irá permitir o regresso a casa de centenas de pessoas que estão deslocadas há décadas.

O Governo trabalhista de Keir Starmer assegurou, ainda assim, que as Forças Armadas britânicas vão continuar a controlar a base militar aérea de Diego Garcia, operada em conjunto com os Estados Unidos.

Num comunicado, David Lammy, ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, disse que a contestação da soberania do arquipélago, pela Maurícia, a par dos desafios jurídicos internacionais associados a essa disputa, estavam a pôr em causa o usufruto anglo-americano da base militar a longo prazo.

“O acordo de hoje [quinta-feira] garante esta base militar vital para o futuro. Vai reforçar o nosso papel na salvaguarda da segurança global”, celebrou o chefe da diplomacia britânica.

“Diego Garcia é o local de uma base militar conjunta dos EUA e do Reino Unido que desempenha um papel vital na segurança nacional, regional e global”, concordou Joe Biden, Presidente norte-americano, noutro comunicado, apoiando o acordo.

O Reino Unido, que colonizou vários territórios naquela região do Índico desde 1814, separou as ilhas Chagos da Maurícia – antiga colónia que alcançou a independência em 1968 – em 1965 para criar o Território Britânico do Oceano Índico. E no início dos anos 1970, em plena Guerra Fria, expulsou quase 2000 habitantes do arquipélago para a Maurícia e para as Seychelles, para construir a base militar Diego Garcia, que tinha arrendado aos EUA em 1966.

Em 2019, a Assembleia Geral das Nações Unidas adoptou uma resolução não vinculativa, baseada num parecer consultivo do Tribunal Internacional de Justiça que concluía que a descolonização britânica daqueles territórios não respeitou o direito internacional e que acusava Londres de ter forçado injustamente a população local das ilhas Chagos a abandoná-las.

Críticas dos tories

Três anos antes, porém, já depois de ter prolongado o arrendamento de Diego Garcia aos EUA até 2036, o Governo conservador do Reino Unido insistiu que os habitantes expulsos do arquipélago e os seus descendentes não seriam autorizados a regressar.

O acordo anunciado nesta quinta-feira marca uma abordagem diferente do novo executivo de Keir Starmer para o caso. Em declarações reproduzidas por Downing Street, o primeiro-ministro enfatizou o seu “dever inabalável com a segurança nacional e mundial” durante um telefonema com o seu homólogo mauriciano, Pravind Jugnauth.

A cedência da soberania das ilhas Chagos “completa a descolonização da nossa república”, disse o primeiro-ministro da Maurícia, nesta quinta-feira, reagindo ao acordo.

A oposição conservadora ao Partido Trabalhista britânico reagiu, no entanto, negativamente ao acordo.

James Cleverly, que foi ministro dos Negócios Estrangeiros no anterior governo e que é candidato à liderança do Partido Conservador, recorreu ao X para acusar o Governo de Starmer de não ser “patriótico”. “Fracos, fracos, fracos”, escreveu sobre os trabalhistas.

Em declarações à BBC, Tom Tugendhat, outro aspirante ao cargo ainda ocupado pelo ex-primeiro-ministro, Rishi Sunak, disse que o acordo não dá garantias para o futuro e sugere que “a Maurícia pode arrendar” outras ilhas do arquipélago de Chagos “a qualquer outro, incluindo, por exemplo, a China”.