Quase 50 desaparecidos em naufrágio com migrantes nas ilhas Canárias. Pode ser o mais mortífero em 30 anos

Barco com 84 pessoas a bordo naufragou a sete quilómetros de El Hierro, nas ilhas Canárias, naquela que pode ser a maior tragédia com migrantes na região em 30 anos. Vinte e sete pessoas sobreviveram.

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O número de migrantes que atravessam da África Ocidental para as Ilhas Canárias aumentou 154% de Janeiro a Julho ADRIEL PERDOMO / EPA
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Quarenta e oito migrantes do Mali, da Mauritânia e do Senegal estão desaparecidos depois de um barco ter naufragado com 84 pessoas a bordo perto da ilha espanhola de El Hierro. As esperanças de os encontrar com vida estão a diminuir, admitiram as autoridades ainda no domingo. A confirmar-se a morte de todos os tripulantes, este pode tornar-se o naufrágio mais mortal em 30 anos de travessias entre África a as ilhas Canárias.

Nove pessoas, uma das quais uma criança, já foram dadas como mortas depois de o barco se ter afundado na madrugada de sábado a sete quilómetros da costa, segundo os serviços de emergência e salvamento. Vinte e sete migrantes foram resgatados com vida enquanto tentavam alcançar a costa espanhola no sábado.

Entretanto, três barcos de patrulha e três helicópteros estão a participar numa nova busca pelos restantes tripulantes desaparecidos, disse um porta-voz da Guarda Costeira espanhola. "Infelizmente, presumimos o pior. As buscas continuam, mas parece que as hipóteses de encontrar alguém vivo são mínimas", disse à Reuters uma porta-voz do governo das ilhas Canárias, ainda no domingo.

O naufrágio aconteceu num fim-de-semana que se esperava ser de festa na região, aponta o El País, com uma travessia a nado que estava agendada no sábado de manhã. O clima mudou quando as tripulações de duas embarcações de socorro foram chamadas por causa de um naufrágio ao largo da localidade de El Hierro. "A tripulação está arrasada...", admitiu Ismael Furio, porta-voz dos socorristas que participaram na missão: "Foi um salvamento aterrador. Só conseguíamos ouvir os gritos durante a noite..."

O número de migrantes que atravessam da África Ocidental para as ilhas Canárias aumentou 154% de Janeiro a Julho, totalizando 21.620 nos primeiros sete meses do ano, revelam os dados da agência fronteiriça da União Europeia, Frontex, numa altura em que o número de migrantes diminuiu nas rotas do Mediterrâneo central e ocidental no mesmo período. As travessias da Turquia para a Grécia aumentaram 57% e as do canal da Mancha para a Grã-Bretanha 22%.

Eram 1h13 locais (menos uma hora em Portugal continental) quando os serviços de emergência espanhóis receberam uma chamada do barco, que se encontrava a cerca de quatro milhas a leste de El Hierro. O barco afundou-se durante a tentativa de salvamento. O vento, que soprava a 37 km/h, e a fraca visibilidade, com a Lua em fase minguante, visível em apenas 20%, tornaram o salvamento extremamente difícil. "Depois do que aconteceu ontem [sábado], e se a previsão da chegada dos barcos de migrantes se concretizar, será a maior tragédia humana a acontecer nas ilhas Canárias em 30 anos", disse Candelaria Delgado, do governo das ilhas Canárias, aos jornalistas no domingo.

Três das pessoas resgatadas sofriam de hipotermia e desidratação, informaram os serviços de salvamento no domingo. Já tinham viajado durante seis dias e passaram os últimos dois sem comida ou água potável. "Fomos avisados para estarmos preparados para atender 84 sobreviventes em La Restinga”, recorda o director das emergências da Cruz Vermelha, Íñigo Vila: "Infelizmente, quando desembarcaram em La Estaca devido ao mau tempo, verificámos que eram muito menos."

Anselmo Pestana, representante do Governo, apontou que o primeiro contacto com a embarcação foi "o momento mais crítico de todo o resgate". "O barco estava inclinado, provavelmente porque tinha água lá dentro", descreveu Ismail Furio: "Foram os migrantes que salvaram a própria vida e explicaram que foram eles os causadores do naufrágio quando todos se viraram para um lado depois de verem o navio de salvamento. Imagino que tenham sido os nervos antes do resgate e o desespero pela falta de comida e água. Tudo indica que beberam água salgada e isso pode ter afectado as suas faculdades cognitivas."

Os nove migrantes que morreram serão enterrados na segunda e na terça-feira. Entre os mortos estava uma criança, que terá entre os 12 e os 15 anos, segundo a organização não-governamental Walking Borders, que ajuda os migrantes. Como as esperanças de encontrar mais sobreviventes diminuíram, a polícia montou uma morgue em El Hierro.

Entretanto, outros barcos chegaram às ilhas Canárias durante a noite de sábado para domingo, transportando 208 migrantes. Já no domingo à noite, duas embarcações carregadas de imigrantes chegaram ao mesmo destino: um desses barcos transportava 81 imigrantes e chegou a Tenerife, a maior ilha das Canárias; enquanto outro chegou à segunda maior ilha das Canárias, Fuerteventura, mas não se sabe quantas pessoas tinha a bordo. Uma terceira embarcação com cerca de 80 migrantes estava esta madrugada a aproximar-se da ilha mais pequena, El Hierro.

"Crise humana"

Os mares calmos e os ventos suaves associados ao final do Verão no oceano Atlântico, ao largo da África Ocidental, provocaram um novo fluxo de migrantes, segundo as autoridades locais este mês. Em cerca de 30 anos de travessias de migrantes para as ilhas, o naufrágio mais mortífero registado até à data ocorreu em 2009, ao largo da ilha de Lanzarote, quando morreram 25 pessoas.

Após o naufrágio deste fim-de-semana, o Governo das Canárias voltou a apelar a um acordo para transferir alguns dos 5500 migrantes menores de idade que estão ao cuidado das autoridades da região para outras comunidades do país. “Estamos numa situação de crise humana com letra maiúscula”, declarou o presidente regional, Fernando Clavijo, citado pelo El País: "Precisamos de ajuda."

Depois de cinco meses de impasse, as negociações entre o Governo central, o governo regional e o Partido Popular devem ser retomadas esta semana. Havia um encontro marcado para a quarta-feira passada, mas foi adiado enquanto se esperava pelos dados sobre a capacidade de acolhimento das comunidades autónomas que estão a ser recolhidos pelo Ministério da Juventude e da Infância. Segundo Fernando Clavijo, as negociações devem terminar em duas a três semanas.