Reino Unido encerra última central a carvão — é o primeiro país do G7 a fazê-lo

O fecho da central de Ratcliffe-on-Soar pôs fim a mais de 140 anos do uso de carvão nas Ilhas Britânicas. A nível mundial, o seu uso na geração de enegia tem ser reduzido de 35,5% para 4% em 2030.

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A central eléctrica a carvão de Ratcliffe-on-Soar, no Nottinghamshire, que encerrou nesta segunda-feira Molly Darlington/REUTERS
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O Reino Unido é o primeiro país do grupo dos sete mais industrializados (G7) a pôr termo à produção de electricidade a partir do carvão. Com o encerramento da sua última central a carvão nesta segunda-feira, a de Ratcliffe-on-Soar da Uniper, nas Midlands de Inglaterra, terminarão mais de 140 anos de produção de energia a carvão no Reino Unido.

Em 2015, o Reino Unido anunciou planos para encerrar as suas centrais a carvão durante a próxima década, como parte de medidas mais amplas para atingir os seus objectivos climáticos. Nessa altura, mais de 30% da electricidade era produzida a partir do carvão, no país que começou a Revolução Industrial, com a construção da primeira central a vapor em 1882. Mas, no ano passado, essa percentagem caiu para pouco mais de 1%, segundos dados oficiais citados pela Associated Press.

Em 1990, o carvão garantia 80% da geração de electricidade britânica, mas agora cerca de metade vem de fontes renováveis como eólicas e solar. O resto é produzido com recurso ao gás natural e à energia nuclear. A diminuição da produção de electricidade a partir do carvão contribuiu para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa no Reino Unido para mais de metade desde 1990.

Aposta nas renováveis

Portugal era, até agora, na lista dos dez países mais avançados no abandono do carvão, o único que tinha já deixado completamente este combustível, com o encerramento da central do Pego, em Abrantes, em 2021. O objectivo avançado pelo Governo português na actualização do Plano Nacional de Energia e Clima 203o (PNEC 2030), em Julho, é aumentar a contribuição das energias renováveis no consumo de electricidade para 93% até 2030 [actualmente a quota estará já nos 87%], como parte do seu esforço de descarbonização.

O objectivo nacional britânico é atingir a neutralidade climática (não emitir mais gases com efeito de estufa do que aqueles que são removidos da atmosfera) até 2050. A descarbonização do sector da electricidade, no entanto, deverá ser atingida até 2030, o que exigirá um rápido aumento das energias renováveis, como a eólica e a solar. A geração renovável representou 51,6% da produção eléctrica entre Abril e Junho deste ano, segundo um relatório do Departamento de Segurança Energética e Neutralidade Climática divulgado no início de Setembro.

O ritmo de diminuição do uso do carvão para produzir electricidade acompanhou no Reino Unido o ritmo que os cientistas calculam ser necessário fazer a nível global para evitar um aquecimento global superior a 1,5 graus acima da temperatura média da Terra anterior à Revolução Industrial, salientou o Instituto Mundial de Recursos Naturais, numa nota de imprensa.

Em termos globais, no entanto, há ainda um longo caminho a percorrer: é preciso reduzir o uso de carvão na produção de energia de 35,5% em 2023 para apenas 4% em 2030 para que o aquecimento global não ultrapasse de forma definitiva 1,5 graus Celsius, definidos como limite no Acordo de Paris. As emissões relativas à produção de energia representam cerca de três quartos do total das emissões de gases com efeito de estufa.

"O Reino Unido provou que é possível eliminar gradualmente a energia a carvão a uma velocidade sem precedentes", afirmou Julia Skorupska, directora do secretariado da Powering Past Coal Alliance, um grupo de cerca de 60 governos que procuram acabar com a energia a carvão.

Em Abril, os países do G7 concordaram em eliminar a produção de energia a carvão na primeira metade da próxima década (até 2035), mas também deram alguma margem de manobra às economias que dependem fortemente do carvão, o que suscitou críticas dos grupos ecologistas.

G7 tem muito trabalho a fazer

"Há muito trabalho a fazer para garantir que o objectivo de 2035 seja cumprido e antecipado para 2030, particularmente no Japão, nos EUA e na Alemanha", disse à Reuters Christine Shearer, analista de Investigação do Global Energy Monitor.

A energia do carvão continua a representar mais de 25% da electricidade da Alemanha (32.406 centrais) e mais de 30% da energia do Japão (54.751 centrais em operação, segundo a Global Energy Monitor). China, Índia e Estados Unidos são os países com mais centrais de carvão em funcionamento.

Mais de 800 centrais eléctricas alimentadas a carvão em economias de mercado emergentes poderiam ser desactivadas e substituídas de forma rentável por energia renovável a partir do final da década, de acordo com um estudo divulgado em Junho.

Embora apenas 10% das actuais centrais a carvão estejam programadas para encerrar até 2030, muitas mais poderiam encerrar se fossem feitos esforços para identificar oportunidades, mostra uma análise do Institute for Energy Economics and Financial Analysis (IEEFA).

"O Reino Unido está a abrir caminho com uma velocidade impressionante no abandono do carvão para gerar electricidade. Políticas como estabelecer preços para o carbono e leilões renováveis [de emissões] ajudaram a dar escala à economia da energia renovável", salientou Jennifer Layke, director global para a energia do Instituto Mundial de Recursos Naturais, citada no comunicado a que o Azul teve acesso.

"Para continuar o progresso, o Governo deve agora debruçar-se sobre políticas e metas de transição da indústria britânica para abandonar o petróleo e o gás natural fóssil", aconselhou Jennifer Layke. Aumentar a taxação sobre os lucros excepcionais das petrolíferas e reduzir os subsídios de que goza o comércio de combustíveis fósseis são caminhos a seguir.

Em Setembro, o Tribunal Superior de Londres determinou que a aprovação pelo Reino Unido da sua primeira mina de carvão em profundidade em décadas foi ilegal, na sequência de uma acção judicial interposta por activistas ambientais e apoiada numa deliberação do Supremo Tribunal tomada no início deste ano. A Friends of the Earth e a South Lakeland Action on Climate Change contestaram a aprovação, pelo anterior governo conservador, de uma mina de carvão de coque no noroeste de Inglaterra, em 2022.