Rádio SBSR despede-se do ar esta segunda-feira

A rádio dedicada à música independente sai de antena, após a sua aquisição pela MediaLivre, com “um enterro à Nova Orleães”. MediaLivre, que detém Correio da Manhã ou o NewsNow, prepara nova estação.

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Rádio SBSR foi nos últimos oito anos um espaço privilegiado de divulgação da música independente Rui Gaudêncio
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A rádio SBSR, no ar desde 2016, em antena em Lisboa e no Porto (90.4, e 91.0, respectivamente), fará a sua emissão de despedida na próxima segunda-feira. A rádio, que nasceu associada, desde logo no nome, ao festival Super Bock Super Rock, assumiu-se ao longo destes últimos oito anos como espaço privilegiado de divulgação da música independente, com especial atenção aos nomes emergentes no cenário português e sem descurar a memória histórica, numa grelha onde abundavam os programas de autor.

O fim já se antecipava desde que, em Junho, foi concluída a compra da rádio SBSR e da Rádio Festival, que emite no Grande Porto em 94.8, ambas detidas até então pela Música no Coração, do empresário Luís Montez, pela MediaLivre, proprietária do Correio da Manhã, dos canais televisivos CMTV e NewsNow, este último a emitir desde Junho, bem como dos jornais Record e Jornal de Negócios e das revistas Sábado e TV Guia. Como foi anunciado quando da aquisição e como é agora reforçado ao PÚBLICO por Carlos Rodrigues, director-geral editorial da MediaLivre, a compra das duas rádios insere-se no projecto do grupo de media de assegurar “uma estratégia de comunicação 360º”: “Trabalhamos os públicos no digital, na imprensa, na televisão e agora na rádio.” A nova rádio que nascerá nas sintonias da SBSR e da Rádio Festival será, portanto, uma componente desse ecossistema específico.

Neste momento, não existe ainda data para o início das emissões, nem pormenores a revelar sobre a identidade e formato da nova emissora. “O futuro ainda está a ser planeado e estamos a tratar das autorizações legais”, afirma Carlos Rodrigues. Decorre neste momento o obrigatório processo regulatório.

Certa, garante Carlos Rodrigues, é a manutenção na nova emissora dos profissionais da SBSR e da Rádio Festival que assim o desejem. O projecto delineado implicará a contratação de mais profissionais. “Vai começar em breve a formação profissional e o alargamento das competências de todos e seguramente que precisaremos de mais pessoas para aquilo que planeamos.”

Na SBSR ultimam-se os preparativos para a despedida oficial. “Um último dia para celebrar, um enterro à Nova Orleães”, diz ao PÚBLICO Tiago Castro, coordenador da rádio. “Estamos a convidar músicos, programadores, assessores de imprensa, a malta que ajudou a construir a rádio, porque a rádio não foi nossa, foi de toda a gente.” A equipa da SBSR quer que a despedida seja uma partilha. “Estamos a lançar um apelo para a malta passar por lá a pedir música. Discos pedidos.” Sem “choradeiras e palmadinhas nas costas”.

Funcionando num “diálogo muito forte entre o que era a gestão da antena pela equipa e a marca [que baptizava a rádio]”, a emissora nascida em 2016 na frequência da antiga Rádio Nostalgia foi pensada como “mais um veículo do que é o festival Super Bock Super Rock”. Tornou-se, ao longo dos anos, mais do que isso, fruto da generosa programação de autor (e premiada: Floresta Encantada, de Tiago Castro, foi distinguido como Melhor Programa de Rádio no Prémio Autores 2023), da atenção ao passado e presente da música independente, âncora no rock, mas sem fronteiras estéticas definidas (o Ciência Rítmica Avançada, do rapper portuense Keso, era um clássico da programação). Havia concertos semanais em directo, nos seus estúdios, de bandas emergentes (foi ali, numa das emissões do 5.ª Viriato, que Ana Lua Caiano se estreou na rádio, por exemplo). Isto, sem esquecer a cobertura de festivais pelo país fora, dando especial atenção aos que florescem fora dos grandes centros.

Quando se aproxima o momento da despedida, Tiago Castro prefere olhar para o que foi construído. “A rádio vai acabar, mas o trabalho ficou feito. Conseguimos provar que o underground existe e está vivo.” O espólio ficará, “para já”, no YouTube (encontramos lá os concertos semanais do 5.ª Viriato, por exemplo) e no próprio site da SBSR. “Aproveitem para sacar”, recomenda Tiago Castro.

“A SBSR acaba, mas fica a Radar, a Antena 3, ficam as rádios online por todo o país”, afirma o radialista, também músico enquanto Acid Acid. “E tenho a esperança de que no FM apareçam mais rádios com mentalidade aberta, alternativa, que não tenham medo de apostar no que é diferente e de dar voz a todos.” Como faz questão de notar: “Os Capitão Fausto não nascem do zero, o Vaiapraia não nasce do zero. Têm de passar por rádios assim, têm de passar pelos palcos pequeninos para eventualmente chegarem a um patamar maior. Se acabarmos com esses palcos e estas rádios, os artistas deixam de ter essa voz.”

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