Portugal considera alinhar com outros países para reduzir protecção do lobo na Europa

Portugal deve apoiar países europeus preocupados com impactos negativos do aumento de populações de lobos, mas só se garantir que tal não implica baixar a protecção da espécie no território nacional.

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Em alguns países europeus, têm aumentado os relatos de ataques de animais selvagens ao gado FOCKE STRANGMANN / EPA
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É numa resposta a um "pedido de solidariedade dos outros Estados-membros que têm tido problemas" que Portugal deverá, esta quarta-feira, 25 de Setembro, apoiar a proposta da Comissão Europeia para baixar o estatuto de protecção do lobo de “estritamente protegido” para “protegido”. A ministra do Ambiente e Energia, Graça Carvalho, confirmou ao Azul que essa deverá ser a posição defendida por Portugal na reunião do Comité dos Representantes Permanentes da União Europeia (Coreper).

A ministra assegura, contudo, que os representantes portugueses vão garantir que "fica por escrito que Portugal não muda a sua política em relação ao lobo", ou seja, qualquer mudança a nível europeu não obrigará o país a baixar o estatuto de protecção da espécie Canis lupus no nosso território. "Estamos determinados em proteger o lobo, e vamos proteger."

Nos últimos dias, mais de 300 organizações da sociedade civil de toda a Europa, incluindo a Associação Natureza Portugal (ANP/WWF), têm feito uma campanha para incentivar cidadãos a insistir junto dos seus governos para que o estatuto de protecção do lobo não seja mitigado. Em Portugal, o Ministério do Ambiente poderá ter recebido algumas dezenas de e-mails a começar com as palavras: "Escrevo para pedir que fique do lado certo da História – e que esta quarta-feira vote contra a proposta de desprotecção do lobo."

Convenção de Berna

A Comissão Europeia apresentou em Dezembro de 2023 uma proposta para rebaixar o estatuto do lobo de espécie "estritamente protegida" para espécie "protegida" na Convenção de Berna sobre a Protecção da Vida Selvagem e dos Habitats Naturais na Europa, para que a protecção deste grande carnívoro nos países da União Europeia (UE) possa vir a ser também enfraquecida.

“A concentração de alcateias de lobos em algumas regiões europeias tornou-se um perigo real, especialmente para o gado”, afirmou na altura a presidente da Comissão Europeia, ​Ursula von der Leyen. “Para gerir mais activamente as concentrações críticas de lobos, as autoridades locais têm vindo a pedir mais flexibilidade – devemos, a nível europeu, facilitar este processo.”

As populações de lobo na UE são protegidas pela directiva Habitats, que só poderá ser alterada se houver uma mudança na Convenção de Berna, que inclui outros países além da União Europeia.

Segundo uma decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) em Julho deste ano, não se pode permitir a caça ao lobo numa região de um Estado-membro da União Europeia enquanto o seu estado de conservação for considerado desfavorável. “Uma decisão que autoriza a caça de uma espécie tem de ser justificada e tem de se basear nos dados de vigilância do seu estado de conservação”, e deve ter-se especial atenção quando estamos perante uma espécie considerada de interesse comunitário, diz o acórdão.

Grandes carnívoros incómodos

Os predadores de topo são uma parte fundamental da estratégia de biodiversidade de 115 mil milhões de euros da UE, porque a sua presença assegura a saúde de toda a cadeia alimentar. Graças à protecção da União Europeia, em poucas décadas houve uma recuperação do número de lobos-ibéricos e as alcateias expandiram-se.

Agora, a proposta da Comissão Europeia baseia-se no aumento da população deste grande carnívoro para baixar o seu estado de conservação — um aumento que, no entanto, não é uniforme em todo o território europeu.

Ora, como também afirmou o TJUE, para avaliar o estado de conservação de uma espécie e a eventual adopção de medidas de gestão (como a caça em condições específicas), é preciso “levar em consideração o relatório elaborado pelos Estados-membros de seis em seis anos ao abrigo da directiva Habitats, bem como os dados científicos mais recentes, obtidos graças à vigilância efectuada pelos Estados-membros”.

Ou, como escrevem as organizações não-governamentais na proposta de e-mail para ser enviado aos responsáveis políticos: "A ciência e a opinião pública são claras: a alteração do estatuto de protecção do lobo — quer ao abrigo da legislação da UE, quer da Convenção de Berna — não se justifica."