Espanha quer acabar com exploração sexual na prostituição

O Executivo espanhol aprovou uma declaração institucional que descreve a prostituição como “escravatura moderna”

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Em cada 10 mil mulheres residentes em Espanha, 56 estão em situação de prostituição Paulo Pimenta
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Em Espanha, há pelo menos 114.576 mulheres em situação de prostituição — dessas, 80% estão em risco de exploração sexual. A ministra da Igualdade espanhola, Ana Redondo, apresentou os dados esta semana, após o Conselho de Ministros. A informação surge de um estudo “pioneiro” na Europa sobre tráfico e exploração sexual que será publicado em Outubro. E que será a base para Espanha começar a abolir a prostituição.

“Aquilo de que não se fala, não existe”, disse a ministra. “É necessário ter dados aproximados de uma população oculta e de difícil acesso, como é o caso das mulheres e raparigas vítimas de tráfico, exploração sexual e prostituição, para conhecer a magnitude do problema e, consequentemente, enfrentá-lo através de políticas públicas”.

Analisaram-se mais de 645 mil anúncios e foi possível identificar 114.576 mulheres, cerca de 0,56% do total de mulheres maiores de idade residentes em Espanha. Através da análise de vários parâmetros como “novidade, disponibilidade, traço de personalidade, exotismo, serviços prestados ou fotografias incluídas”, lê-se no comunicado do Ministério da Igualdade, o estudo concluiu que mais de 92 mil mulheres estão em risco de exploração sexual. Pelo menos nove mil aparentam estar em risco elevado de serem traficadas para exploração sexual.

Ana Redondo destacou ainda outro ponto que o estudo pretende desvendar: a dimensão das organizações que funcionam como proxenetas destas mulheres, já que “até 363 mulheres diferentes são anunciadas através do mesmo número de telefone”.

As mulheres de origem latina representam 51% da população analisada, 16% são europeias e para as restantes não há dados fiáveis. Quanto à nacionalidade 25% são colombianas, 13% espanholas e 5% do Brasil e Venezuela. 28% das mais de 110 mil mulheres têm entre 18 e 24 anos, 32% têm entre 25 e 36 anos, entre os 37 e 45 anos 7% e entre os 46 e 55 anos são 1,6%.

Em cada 10 mil mulheres residentes em Espanha, 56 estão em situação de prostituição. A proporção é mais significativa nas Ilhas Baleares, onde em cada 10 mil, 121 vivem nessa condição. Na Catalunha, 103, em Valência e Cantábria, o valor baixa ligeiramente, para 73 mulheres.

Ao analisar os valores absolutos, o cenário é diferente, e é na Catalunha que se concentram a maior parte das mulheres dos anúncios analisados: são 34.759. Em Madrid, são 20.549, em Valência 16.314 e Andaluzia cerca de nove mil. Segundo dados do Centro de Informação contra o Terrorismo e Crime Organizado espanhol, 97.6% das vítimas de tráfico para fins de exploração sexual são mulheres e raparigas. A ministra da Igualdade recorre a essa informação para sustentar a “inegável dimensão de género” da problemática.

Executivo compromete-se a progredir para erradicar violência contra mulheres

No mesmo Conselho de Ministros em que foram apresentadas as primeiras conclusões do estudo que deve sair no próximo mês, o Executivo espanhol aprovou uma declaração institucional que descreve a prostituição como “escravatura moderna”, que usa pessoas vulneráveis “como mercadoria, violando de forma flagrante os direitos humanos”. “As vagas de migração e a deslocação forçada de pessoas devido a conflitos armados são um terreno fértil para o tráfico de seres humanos”, lê-se no comunicado. As “novas tecnologias” são apontadas como um factor que tanto pode criar meios “para prevenir e abordar o fenómeno do tráfico” como também ajudar “o recrutamento e controlo das vítimas”.

A declaração incluiu o compromisso do Executivo de “continuar a progredir no sentido da erradicação de todas as formas de violência contra as mulheres”.

Em Março deste ano, no dia da Mulher, o actual executivo tirou da gaveta a Lei Orgânica Integral contra o Tráfico e a Exploração de Seres Humanos, que tinha sido aprovada em 2022, na legislatura anterior, e acabou por cair devido à convocação de eleições. Aprovou-a e voltou a reforçar que a sua aplicação é uma das formas de promoção de igualdade de género.

O projecto de lei propõe medidas de apoio às vítimas, como acesso a rendimento mínimo vital, assistência jurídica e acesso prioritário a habitação pública. Imigrantes em situação irregular podem aceder a uma autorização provisória de trabalho e residência de forma a não serem expulsos. E para ser abrangido por estas medidas não é necessário que a vítima apresente queixa. “Muitas mulheres não apresentam queixa por medo, pelo que a lei vai muito mais longe, protegendo-as desde o primeiro momento", sublinhou, em Março, Ana Redondo. A ministra explicou que será levada a cabo uma investigação para comprovar que a requerente é vítima de tráfico.

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