Depois da proibição, manifestação por melhor espaço público regressa às ruas do Porto

Organização da Kidical Mass não espera entraves ao desfile de adultos e crianças em bicicletas. Em Maio, PSP impediu realização, por considerar que estava em causa a segurança dos participantes.

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Manifestação deste domingo pretende exigir melhores condições para a mobilidade activa Manuel Roberto
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É uma manifestação em forma de passeio, um comboio de bicicletas que pretende chamar a atenção para a falta de condições para pedalar em segurança nas cidades. Neste domingo, a Kidical Mass, um movimento global, regressa às ruas do Porto.

Apesar de já ter havido várias edições na cidade, a manifestação de Maio acabaria por ser travada pelas autoridades. Neste domingo, prevê Sandra Alves, membro da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta –​ Mubi –, não deverá haver obstáculos ao percurso entre a Praça da República e o Castelo do Queijo.

O desfile composto por adultos e crianças, semelhante ao que se tem registado ao longo da última semana em várias localidades portuguesas, serve para reivindicar medidas como rotas seguras para as escolas, a aplicação do limite de 30 quilómetros por hora dentro das localidades, ciclovias largas, contínuas e com cruzamentos seguros e mais espaço público dedicado a andar a pé e de bicicleta.

“Os mais velhos orgulham-se do tempo em que brincavam na rua. Isso pode voltar a acontecer”, acredita Sandra Alves. Mas, para isso, é preciso que haja um compromisso das autoridades para redistribuir espaço público, diz.

Mas essa ainda não é a prática comum. O desfile deste domingo passa pela Avenida da Boavista, uma artéria da cidade que recentemente sofreu uma remodelação de fachada a fachada, retirando o espaço para bicicletas. A Kidical Mass não defende “a erradicação dos carros”, sublinha Sandra Alves, mas a “criação de espaço para todos, para as gerações mais novas e para quem se quer mover de outra forma”.

Face ao sucedido em Maio, quando a Polícia de Segurança Pública (PSP) travou a Kidical Mass, explica Sandra Alves, houve “um cuidado adicional” no processo de preparação e comunicação com as autoridades. Refere também que já houve uma resposta afirmativa da Câmara Municipal do Porto (CMP), a quem deve ser enviado o formulário para a realização de manifestações. À autarquia, junto da qual o PÚBLICO tentou obter confirmação, sem resposta, cabe pedir um parecer à PSP.

PSP negou acesso a documentos

Em Maio, a PSP deu um parecer negativo à Kidical Mass do Porto, impedindo o percurso de bicicleta. Na altura, a polícia justificou com a falta de segurança para os participantes, algo que a organização registou com ironia: uma manifestação por ruas seguras para pedalar era impedida por falta de segurança para pedalar.

Para perceber melhor os argumentos, e porque estava em causa o direito à manifestação, o PÚBLICO pediu ao Comando Distrital da PSP do Porto o parecer que fundamentava a decisão. O gabinete de imprensa da polícia começou por recusar enviar o documento por se tratar de um “posicionamento técnico” e, perante a insistência, referiu que, sendo um parecer que iria contribuir para a tomada de decisão de outra entidade – o município do Porto, no caso –, o mesmo “não poderia ser fornecido”.

Entendimento diferente teve a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), à qual o PÚBLICO recorreu. Num parecer de 24 de Julho, a CADA decidiu que a documentação administrativa que esteja na posse de uma entidade “deve ser por ela directamente facultada a quem a solicita, mesmo que documentação idêntica também exista na posse de outra entidade”. A CADA deliberou que deveria “ser cumprido o direito de acesso”.

Passado o prazo legal, a PSP do Porto continuou sem fornecer os documentos requeridos, um pedido que incluía pareceres de edições anteriores da Kidical Mass na cidade. Só o fez já em Setembro, e após o PÚBLICO ter avançado com uma intimação para o efeito junto do Tribunal Central Administrativo do Sul.

Nos documentos enfim enviados pela PSP, há dois pareceres sobre a Kidical Mass do Porto. Um de Setembro de 2022 e o de Maio de 2024, que resultou no impedimento da manifestação. Ambos são negativos, apesar de as autoridades não terem travado a de 2022. Cada um oferece argumentos diferentes. No de 2022, a PSP referia que “os desfiles previstos na lei” ao abrigo do direito à manifestação devem ser “exclusivamente apeados” e que a manifestação deveria seguir apenas um trajecto.

Já em Maio de 2024, a PSP não fazia menção à necessidade de não usar bicicletas, mas assinalava que a sua utilização “conflitua com a liberdade de circulação dos demais cidadãos, podendo originar constrangimentos à circulação na zona envolvente e no acesso às unidades hospitalares próximas ao trajecto do desfile, bem como colocar em perigo a segurança dos participantes”. Sugeria, em alternativa, “a concentração, sem desfile”.

“A PSP nunca nos disse expressamente quais eram as partes do percurso que punham em causa o acesso a hospitais”, referia então Duarte Brandão, da organização, acrescentando que estava disposto a alterar o trajecto. Neste domingo, o desfile deve voltar às ruas do Porto. O percurso será o mesmo de Maio de 2024 e das edições anteriores da Kidical Mass.

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