Na Champions, o Benfica decidiu que queria sofrer
O Estrela Vermelha esteve mais vezes perto da baliza “encarnada” do que seria suposto e assustou com um golo aos 87’. O Benfica colocou-se “a jeito”, mas a falta de engenho sérvio não deu para mais.
Não é preciso chamar um génio do futebol para nos dizer que o Benfica é muito superior ao Estrela Vermelha. E isso ficou claro desde o primeiro minuto do jogo desta quinta-feira, na Liga dos Campeões, que deu triunfo português por 2-1.
Por que motivo houve, então, tanto sofrimento do Benfica, que foi “apertado” minutos a fio e acabou encostado à sua área? A explicação não é evidente.
Por um lado, uma equipa como o Benfica poderia ter tido facilidade em controlar, com bola, uma equipa como esta sérvia. Por outro, a postura mais expectante e submissa poderá ter sido a que sugeria ao Benfica maior probabilidade de “matar”, em transição, um jogo que estava em 2-0.
Os “encarnados” optaram pela segunda via e, com isso, sofreram mais do que seria necessário. Os sérvios foram muito perigosos? Não foram. Mas remataram bastante, marcaram um golo e estiveram mais vezes perto da baliza do que seria suposto – e só a falta de engenho técnico impediu mais problemas para Trubin e para o Benfica.
Foi, em geral, um jogo fraco da equipa portuguesa, que foi eficaz na finalização e se colocou a jeito de sofrer um empate que seria bizarro. E a euforia de Lage no final do jogo, depois de um desempenho deste tipo, não era algo provável de ser visto.
Rollheiser como segundo avançado
Bruno Lage lançou, como se esperava, o mesmo “onze” que defrontou o Santa Clara e repetiu-se também uma dúvida: Rollheiser seria mais um médio-interior do 4x3x3 ou mais o segundo avançado do 4x4x2? Tal como com os açorianos, a ideia que era apontada como mais provável, a do 4x3x3, não se confirmou.
E a presença de Rollheiser foi muito relevante neste jogo, por bons e maus motivos. Ofensivamente, o argentino ainda tentou pedir a bola no corredor direito algumas vezes, compensando os movimentos interiores de Di María, além de que a presença na meia-direita mobilizava sempre marcações e será uma sociedade interessante de ver com Di María e Bah. E é daí que poderão vir lances como o do minuto nove.
A equipa do Benfica mobilizou-se ao corredor direito, atraiu marcações e usou essa transição rápida para aproveitar a ausência do lateral-direito sérvio, que tinha ficado perdido no ataque. Houve Di María a lançar Bah, Pavlidis e Rollheiser a atraírem marcações e Akturkuglu a finalizar ao segundo poste, com marcação deficiente do médio Krunic.
Mas a presença de Rollheiser também prejudicou o Benfica noutro domínio. Após o golo, a equipa baixou muito as linhas e expôs-se a um problema por resolver: a posição do argentino no momento defensivo.
O Benfica estava sempre em 4x4x2 sem bola, porque o argentino saía sempre na pressão ao central. A posição como terceiro médio seria a grande vantagem de o ter ali, já que daria ajuda aos dois médios, além de compensar a falta de ajuda de Di María, mas Rollheiser não pareceu ver-se como médio.
Recuperou várias vezes a passo, deixando a equipa tão descompensada como na Era Schmidt: com Florentino, Kokçu e a defesa a levarem com os adversários de frente, em transição.
Benfica tirou o pé
O Estrela Vermelha criou algum perigo aos 14’ e 15’ e, sobretudo, aos 18’, fruto da também já repetida atracção de Otamendi pelo desarme. Tal como já fez em muitas outras ocasiões, arriscou o desarme sem necessidade alguma, sendo batido facilmente antes da defesa de Trubin.
Nunca foi um fã de contenção, mas com idade mais avançada e menor fulgor físico seria uma boa hora para o argentino ser menos audaz nos desarmes, já este tipo de abordagens desequilibram uma equipa já de si pouco equilibrada. E fez o mesmo aos 87', no golo do Estrela Vermelha.
Ofensivamente, apesar da indefinição com Rollheiser, há algo que já parece ser marca de água de Lage neste Benfica: o papel de Kokçu.
O turco pega na bola em construção e aparece também na definição – algo que vai acarretar desgaste (visível neste jogo) e desposicionamento defensivo, mas que, quando resultar, vai promover oportunidades de golo.
Aos 29’, o turco marcou de livre-directo, numa falta ganha fruto de aparecer na zona de definição, no corredor central, a fazer uma tabela com Akturguklu, compatriota com o qual parece estar a fazer uma grande sociedade na meia-esquerda do terreno.
Em relação a Aursnes ou João Mário, Akturkoglu tem a vantagem de não vir sempre para dentro, algo que obriga os defensores a não se comprometerem apenas com a zona interior – e isso permite ao turco combinações como a que fez com Kokçu.
Lage protegeu Kaboré
O Benfica entrou na segunda parte sem querer ter a bola e foi empurrado pelos sérvios, que tentavam castigar sobretudo o lado direito do Benfica, para onde entrou Kaboré depois de uma lesão de Bah – e entrou mal, obrigando até Lage a colocar Akturkoglu à direita, para ajudar um lateral em agonia minuto sim, minuto sim.
E foi bem visto pelo treinador, que estancou a ferida que estava aberta. Os sérvios iam, ainda assim, somando lances de perigo, mesmo que não evidente, em lances de bola parada e cruzamentos.
As dificuldades de Rollheiser sem bola também não passaram em claro a Bruno Lage, que lançou Aursnes ainda antes da hora de jogo. A entrada do norueguês colocou Kokçu na posição na qual teoricamente mais rende: como médio-interior do 4x3x3, mas como o mais livre e não como o que baixa para ajudar o 6.
O Benfica estava apenas à espera de uma transição que ajudasse a “matar” o jogo, mas ela não surgiu e um erro de Otamendi, mais um por atracção incontrolável pelo desarme, deixou Milson na cara de Trubin, que nada pôde fazer. Colocou-se a jeito o Benfica e bem pode respirar de alívio.