Fed tenta aterragem suave com o resto do mundo a ver

A autoridade monetária dos EUA decide esta quarta-feira se corta os juros em 0,25 ou 0,5 pontos percentuais. Uma escolha importante para uma economia mundial em crise.

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Jerome Powell, presidente da Reserva Federal norte-americana KEVIN LAMARQUE / REUTERS
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“Uma recessão nos EUA nesta altura - com nenhum outro motor de crescimento à vista - constituiria um problema sério para o mundo”. O alerta, dado pelo líder do departamento de estudos económicos do banco Barclays em declarações à agência Bloomberg, revela a importância da decisão que irá ser esta quarta-feira anunciada pelos responsáveis máximos da Reserva Federal norte-americana (Fed) no final da reunião de dois dias do comité que define o nível das taxas de juro nos EUA.

Nos mercados não há dúvidas de que a Fed irá realizar o primeiro de uma série de cortes nas suas taxas de juro, que actualmente se encontram no intervalo entre 5,25 % e 5,5%, o nível mais alto das últimas duas décadas. Mas a incerteza persiste sobre se esse corte será, como é mais habitual, de 0,25 pontos percentuais ou se, num esforço claro para evitar a entrada em recessão da economia, a Fed optará por ser logo mais agressiva, realizando um corte de 0,5 pontos percentuais.

Num momento em que a economia da zona euro, com a sua maior potência, a Alemanha, em recessão, não consegue sair de um ritmo de crescimento muito lento e em que a China parece cada vez mais em risco de cair na armadilha da deflação, esta escolha pode revelar-se decisiva para o futuro próximo da economia mundial.

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Se os EUA não conseguirem assegurar uma aterragem suave da sua economia - isto é, assegurar que o combate à inflação através da subida das taxas de juro não tem como consequência uma recessão profunda -, a economia mundial arrisca-se a cair numa situação ainda mais precária, sem qualquer motor de crescimento significativo para a fazer acelerar.

Para além disso, só por si, uma descida das taxas de juro dos EUA pode também contribuir para ajudar diversas economias, como a japonesa, que têm tido dificuldades crescentes em lidar com a força do dólar face às suas divisas.

Há um mês, o presidente da Fed, Jerome Powell, numa das suas mais recentes intervenções públicas na conferência anual em Jakson Hole, garantiu que a autoridade monetária norte-americana está preparada para, através da redução do nível das taxas de juro, apoiar o mercado de trabalho nos EUA (que também é uma das competências da Fed) e assegurar uma aterragem suave da economia.

No entanto, há sinais que apontam para que o mercado de trabalho nos EUA, que até há alguns meses permanecia muito forte, já tenha entrado numa fase mais negativa.

A taxa de desemprego já subiu um ponto percentual para 4,2% e o ritmo a que nos últimos três meses se criaram novos empregos é tão baixo como o registado na sequência da crise financeira de 2008.

É por isso que, nos mercados, são muitos os que receiam que a Reserva Federal se tenha já atrasado na tarefa de começar a baixar as taxas de juro. Ao contrário do BCE, que realizou o primeiro corte de juros em Junho, colocando a principal referência para os custos de financiamento neste momento em 3,5%, a Fed optou por adiar esse passo, mantendo a sua principal taxa de juro de referência no intervalo entre 5,25% e 5,5%. Isto apesar de a taxa de inflação estar, neste momento, a níveis semelhantes nos EUA e na zona euro.

A inacção da Fed explicava-se, até há alguns meses, com o facto de tanto a criação de emprego como o aumento dos salários darem ainda sinais muito positivos. Esse argumento, contudo, parece agora ter desaparecido e vários analistas dizem que já na reunião anterior, em Julho, havia motivos para que a Fed tivesse começado a cortar os juros.

Jerome Powell tem agora a oportunidade de tentar recuperar esse tempo perdido, realizando logo um corte de 0,5 pontos percentuais. No entanto, com este corte mais abrupto também vem um risco, o de passar uma mensagem aos mercados de forte preocupação com a economia.

Em Agosto, a divulgação de dados do emprego nos EUA surpreendentemente negativos foram o suficiente para provocar uma quebra muito acentuada nos mercados accionistas na América, Europa e Ásia. E agora, o mesmo pode acontecer se a Fed der sinais de que está já a correr atrás do prejuízo, tentando com um corte de taxas de juro mais forte, reanimar o consumo e o investimento, evitando uma recessão.

Jerome Powell deverá tentar, com aquilo que irá dizer na conferência de imprensa a seguir à decisão, minimizar os danos. E dar indicações mais precisas sobre qual deverá ser o rumo da política monetária dos EUA nos próximos meses.

Para já, de acordo com os indicadores dos mercados, a expectativa é a de que, até ao final deste ano, as taxas de juro da Fed baixem pelo menos um ponto percentual, prolongando essa tendência de descida rápida dos juros na primeira metade de 2025.

No caso do BCE, que fez dois cortes de taxas de juro de 0,25 pontos percentuais em Junho e Setembro, a expectativa é de apenas mais um corte de 0,25 pontos em Dezembro, seguido de um período ao longo da primeira metade do próximo ano de reduções mais rápida dos juros.

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