O buraco de ozono de 2024 está a formar-se devagarinho

Dois momentos de aquecimento súbito na estratosfera terão feito com que o fenómeno de destruição da camada que protege a Terra da radiação perigosa esteja atrasado este ano.

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Imagem do buraco de ozono a 14 de Setembro: a área azul tem cerca de 220 unidades dobson. Quando há menos que isto, forma-se o buraco NASA
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O buraco de ozono sobre a Antárctida está a formar-se mais tarde do que é hábito este ano, e isso tem que ver com dois episódios de subida de temperatura e alterações no padrão de ventos da estratosfera, durante o Inverno antárctico (o nosso Verão). Mas este atraso não deve ser lido directamente como um sinal de recuperação do buraco de ozono, salienta o Copérnico, serviço de alterações climáticas e observação da Terra da União Europeia.

O anúncio do Copérnico foi feito nesta segunda-feira, 16 de Setembro, em que se assinala o Dia Internacional para a Preservação da Camada de Ozono, em que se comemora o tratado ambiental com mais sucesso de sempre: o Protocolo de Montreal, assinado em 1987, que levou a que deixassem de ser utilizados produtos químicos que destroem a camada de ozono. O ozono forma um manto protector que protege os seres vivos na Terra da perigosa radiação ultravioleta do Sol.

Em condições meteorológicas normais, o buraco de ozono começa a formar-se em meados ou no fim de Agosto, e perdura até ao fim de Novembro, quando começa a fechar-se. Mas este ano está a desenvolver-se mais lentamente, devido a perturbações no vórtex polar – uma grande área de baixas pressões localizada sobre cada um dos pólos do nosso planeta, que contém grandes quantidades de ar extremamente frio e gera ventos com velocidades à volta dos 300km/hora.

Buraco na camada de ozono na Antártida CAMS/ECMWF

Essas perturbações, explica um comunicado de imprensa do Copérnico, foram dois episódios de súbito aquecimento que ocorreram em Julho e Agosto na estratosfera, a cerca de 30km de altitude sobre o continente gelado.

A temperatura típica na estratosfera sobre a Antárctida em Julho é de 80 graus Celsius negativos, mas a 7 de Julho, deram um salto de 15 graus, estabelecendo um recorde para aquele mês, naquele local, salientou um comunicado da agência espacial norte-americana NASA.

O frio regressou ao normal a partir de 22 de Julho, mas a 5 de Agosto deu outro salto rumo ao calor: uma subida de temperatura de 17 graus. Tudo isto durante o Verão na Antárctida.

“O episódio de Julho foi o aquecimento mais antecipado na estratosfera [sobre a Antárctida]” em 44 anos de observações pelos cientistas do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA, afirmou Lawrence Coy, cientista atmosférico deste centro de investigação, citado no comunicado da agência espacial dos Estados Unidos.

Este aquecimento perturbou os ventos do vórtex polar, que se alongaram, em vez de fazerem um círculo. Isto desacelerou os ventos e levou e contribuiu para o aquecimento da estratosfera. Este tipo de fenómeno só acontece mais ou menos de cinco em cinco anos na Antárctida, enquanto no Árctico é muito mais comum.

E quando o vórtex polar enfraquece, com temperaturas mais altas e ventos mais lentos na estratosfera, o processo de destruição do ozono não é tão agressivo, diz o comunicado do Copérnico. Portanto, em vez de o buraco de ozono ter começado a formar-se em Agosto, como é típico, arrastou-se mais para Setembro.

Actualmente, a concentração de ozono sobre a Antárctida ainda ronda as 220 unidades Dobson. A partir daí para baixo é que se considera que começa a formar-se o buraco de ozono.

O que ainda falta fazer

Podemos ler neste fenómeno que está a haver uma recuperação? A tendência tem sido positiva, nos últimos anos, mas não é fácil. “Tal como um período de frio excepcional não revela nada sobre a tendência a longo prazo do clima, um início lento do buraco de ozono não pode ser automaticamente atribuído à recuperação da camada de ozono, ou ao sucesso do abandono das substâncias químicas que destroem o ozono”, afirma, cauteloso, o comunicado do Copérnico.

Apesar de o Protocolo de Montreal ter sido um sucesso, os químicos que destroem o ozono estratosférico continuam na atmosfera, e demorará décadas a reduzirem-se até aos níveis anteriores à Revolução Industrial. E, entretanto, continuarão a influenciar o desenvolvimento do buraco de ozono – em conjunto com factores meteorológicos e com a poluição emitida pelos humanos, além do impacto das alterações climáticas.

O fumo dos grandes incêndios florestais, o vapor de água e os óxidos de enxofre libertos pelas erupções vulcânicas são outros factores que aceleram a destruição do ozono. E alguns gases que destroem a camada de ozono, nomeadamente os hidrofluorocarbonetos (HFC), têm também um potente efeito de estuda. Internacional para a Preservação da Camada de Ozono

A Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal concentra-se na eliminação dos HFC, mas há dificuldades em pô-la em prática, e até mesmo contrabando destes gases, incluindo na Europa.

"Se for totalmente posto em prática, pode evitar até 0,5 graus Celsius de aquecimento até ao fim deste século”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, citado numa declaração da Organização Meteorológica Mundial a propósito do Dia Internacional para a Preservação da Camada de Ozono.