IPO vai construir “fábrica” de células CAR-T no Porto

Investimento deverá custar entre 2,5 e três milhões de euros. Presidente do IPO do Porto adianta que já há avanços para esta infra-estrutura, que deverá estar pronta até daqui a um ano e meio.

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A nova infra-estrutura no IPO do Porto deverá custar entre 2,5 e 3 milhões de euros Nelson Garrido
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O Instituto de Oncologia Português (IPO) do Porto quer criar em Portugal uma “fábrica” de células CAR-T, uma imunoterapia para o cancro. Júlio Oliveira, presidente da instituição, afirma que o processo já está em andamento e que poderá ser uma realidade em 2025 ou 2026. “Já estamos a avançar, também junto do próprio Infarmed, no sentido de num horizonte temporal previsível – que agora é um ano a um ano e meio – podermos vir a produzir células CAR-T no IPO”, afirmou ao PÚBLICO.

Em Portugal, não existe produção de células CAR-T. Embora esta imunoterapia esteja disponível desde 2019 no IPO do Porto e de Lisboa, os linfócitos T dos pacientes são modificados em centros europeus na Alemanha ou nos Países Baixos – consoante o fabricante.

O tratamento com células CAR-T é uma técnica de imunoterapia em que as células do doente são “fortificadas” para criar uma resposta imunitária contra o cancro. Assim, depois de recolher os linfócitos T de um paciente, os mesmos são enviados para a Alemanha ou os Países Baixos, onde lhes são acrescentados receptores que identificam os antigénios (moléculas estranhas ao nosso organismo) específicos do cancro. Depois, estes linfócitos T modificados (já com os receptores) são infundidos nos pacientes para atacarem e eliminarem as células cancerosas.

Além de ser uma técnica recente, esta é uma resposta a quem já não tem as linhas de tratamento habituais para alguns tipos de cancro de células do sangue – linfoma difuso de células grandes, linfoma do manto e leucemia linfoblástica aguda. Mas além disso também é cara e uma produção “caseira” poderia permitir reduzir custos, numa altura em que se prevê um alargamento dos cancros que poderão ser abrangidos por esta imunoterapia (por exemplo, o mieloma múltiplo).

Sérgio Chacim, hematologista do IPO do Porto, admite que “faz toda a diferença” ter um centro de produção em Portugal. “Por causa dos custos e, sobretudo, para oferecer [o tratamento] a mais doentes”, diz.

“A produção dentro de portas de células CAR-T é a tendência de vários centros académicos, hospitais académicos e institutos de oncologia similares [ao IPO do Porto]. E se não se dá este passo, não vamos conseguir criar um ambiente competitivo e atractivo para que esta tecnologia se desenvolva”, frisa Júlio Oliveira.

O investimento previsto rondará os 2,5 a três milhões de euros, a maioria em infra-estrutura, segundo o presidente do IPO do Porto (1,5 a dois milhões de euros). O restante montante será repartido entre os equipamentos e a formação dos recursos humanos. O IPO do Porto inspira-se no exemplo reconhecido do Hospital Clínic de Barcelona (Espanha) que, desde 2021, tem desenvolvido este tipo de terapias avançadas sem fins comerciais.

O intuito, segundo o IPO do Porto, não será competir com a indústria farmacêutica, mas complementá-la através de investigações em contextos ainda mais raros, por exemplo. Além disso, o desenvolvimento desta infra-estrutura também pode contribuir para a atracção de ensaios clínicos – área em que Portugal ainda tem um baixo desempenho.

“Num país da dimensão de Portugal, é importante que exista pelo menos um centro dedicado à investigação e tratamento da doença oncológica, para que, rapidamente, a inovação possa beneficiar os doentes oncológicos que tenham doenças graves e incuráveis o mais cedo possível, antecipando o acesso a estas tecnologias em vários anos”, sublinha Júlio Oliveira.

Primeiro doente em Coimbra para breve

Em Janeiro de 2023, como o PÚBLICO noticiou, o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) estava a caminho de ser o quarto centro acreditado para tratar pacientes com células CAR-T. Na altura, a expectativa dos responsáveis do hospital conimbricense era de que o primeiro doente fosse tratado no início desse mesmo ano – o que não aconteceu.

“Uma vez que existe um número crescente de indicações aprovadas para esta forma de tratamento, é previsível que surjam dificuldades nos centros já qualificados em Lisboa e no Porto em dar resposta a doentes de todo o país”, dizia Catarina Geraldes, directora do Serviço de Hematologia Clínica do CHUC em 2023.

Agora, já depois da acreditação, o tratamento do primeiro paciente deverá estar para breve, sendo expectável que tal aconteça entre o final deste ano e o início de 2025.

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