AIMA deixa de obedecer a notificações judiciais e dificulta mais a vida de imigrantes

Advogadas denunciam que agência responsável pela legalização de estrangeiros há cerca de mês não cumpre ordens judiciais. Consideram um ataque aos direitos fundamentais dos imigrantes.

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A AIMA deixou de responder aos tribunais Nuno Ferreira Santos
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Um dos princípios do Estado de Direito é que as instituições do Estado devem obedecer as decisões de tribunais. Não é isso o que tem acontecido no caso da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA). O órgão não responde mais às demandas da Justiça.

Essa situação chegou ao nível atual, segundo advogados, por causa da falta de resposta da AIMA às demandas de imigrantes que estão ávidos por regularizarem a documentação no país. No escuro, muitos deles decidiram recorrer aos tribunais. “Fomos forçadas a recorrer a ações de intimação apresentadas junto de tribunais contra a AIMA por falta de agendamento ou falta de resposta em tempo útil aos imigrantes”, diz a advogada Vera Matos Pereira.

Para ela, o processo na Justiça não costuma demorar muito. “Ao entrar com uma ação, muito rapidamente, o juiz despacha, dando um prazo de sete dias à AIMA para se pronunciar. Até final de julho, os tribunais recebiam as ações e citava a AIMA, que respondia. Muitas vezes, a resposta era o agendamento", relata.

Há cerca de um mês, porém, a forma de atuação da agência mudou. “Desde julho, os tribunais passaram a receber as petições, tratando dos casos com agilidade, mas não há retorno por parte da AIMA. Há casos em que o atraso da agência chega a um mês”, afirma.

Ela não sabe informar quantos processos a AIMA não tem respondido à Justiça. “Trata-se de cumprir a lei. Se tiver um caso em que a AIMA não está respondendo, é muito. Eu tenho pelo menos três situações sem resposta”, acrescenta.

Outra advogada, Cátia Neves Tavares, tem no seu escritório um número maior de casos sem resposta. “Temos 10 processos em que a AIMA foi citada. Em todos, até agora, não tivemos qualquer tipo de retorno. A agência tinha 10 dias para responder, e já se passou um mês”, assinala

Ela diz que todos são processos urgentes, o que significa que correm mesmo durante as férias judiciais. Seis desses processos são de reagrupamento familiar e um de Visto Gold, em que o investidor em Portugal deve ter seus dados biométricos (foto e impressão digital) recolhidos para dar andamento ao processo para obter a autorização de residência.

“É vergonhoso o que está acontecendo. Tenho casos de reagrupamento familiar de cidadãos europeus casados com brasileiras. Tenho também um francês casado com uma marroquina e um francês casado com uma argelina. Eles não podem viajar com as mulheres, porque elas não têm a autorização de residência. A falta de documento inibe o direito de ir e vir”, frisa Cátia.

Barrada no hospital

A falta de resolução por parte da AIMA coloca em risco de vida uma imigrante. “Tenho uma cliente grávida, a quem foi negado o acesso ao acompanhamento gestacional, porque no hospital disseram que só com a Manifestação de Interesse ela não tem direito de acesso ao sistema de saúde”, diz a advogada Izabella Schroeder.

Com cinco processos em tribunal contra a AIMA, Izabella afirma que o desrespeito às decisões dos tribunais vai mais longe do que não atender às citações. “Quando a agência é citada, ela tem de responder e apresentar a cópia do processo da pessoa. Eles nem respondem nem entregam o processo”, explica.

Não é o direito de ir e vir e de tratamento de saúde que a falta de cumprimento de decisões judiciais por parte da AIMA atinge. “Tenho várias pessoas que querem mudar de emprego e não podem. Tenho também um cliente que veio fazer doutorado e não conseguiu o agendamento”, complementa a advogada.

Multa

Segundo Izabella, o não cumprimento das decisões judiciais vai acarretar punições. “Nós vamos informar os tribunais de que a citação não foi cumprida. A Justiça vai impor contraordenações (multas) pelo não cumprimento do prazo”, afirma.

Ela explica que a multa não vai pesar no bolso só da agência governamental. “A AIMA vai averiguar a responsabilidade de quem não cumpriu o despacho e cobrar dessa pessoa. Mas não vai ser só o funcionário que não cumpriu que vai pagar. A AIMA também é responsável”, acrescenta.

Até o fechamento desta edição, a AIMA não havia respondido aos questionamentos do PÚBLICO Brasil. Mas o espaço continua aberto para qualquer pronunciamento.

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