Ex-director-geral das prisões aponta falhas de segurança aos guardas de Vale de Judeus

Rui Abrunhosa Gonçalves diz que “é óbvio que houve falhas na segurança que foram exploradas pelos reclusos”. Falta saber se foi desleixo, se foram propositadas ou se foi “uma circunstância fortuita”.

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O diretor-geral dos serviços prisionais, Rui Abrunhosa Gonçalves, estranhou o silêncio político e percebeu que a sua cabeça teria de rolar FILIPE AMORIM / LUSA
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O ex-director-geral dos Serviços Prisionais Rui Abrunhosa Gonçalves considerou esta sexta-feira que as falhas de segurança na fuga de cinco reclusos de Vale de Judeus têm também de ser apontadas aos guardas prisionais de serviço.

Em entrevista à RTP e ao ser questionado sobre quem falhou na fuga que levou à sua demissão, Rui Abrunhosa Gonçalves respondeu: "Os guardas".

"Na prisão temos estas duas grandes populações, os reclusos e os guardas e os guardas estão lá sobretudo para exercer segurança. Logo, é óbvio que houve falhas na segurança que foram exploradas pelos reclusos. É isso que está a ser fundamentalmente apurado", disse, aludindo ao processo de averiguações interno da Auditoria e Inspecção dos Serviços Prisionais e ao inquérito-crime dirigido pelo Ministério Púbico (MP).

No entender do recém-demitido director dos serviços prisionais, é agora "preciso perceber se essas falhas foram falhas de desleixo, se foram propositadas ou se, pelo contrário, existe uma outra circunstância fortuita".

Rui Abrunhosa Gonçalves explicou que na central de videovigilância da cadeia o guarda é rendido de hora a hora e que o caso aponta para a mudança de turno e os cinco minutos seguintes.

"As pessoas estão lá, as câmaras estão lá", acrescentou o ex-responsável máximo das prisões portuguesas, notando que apesar de haver muitas câmaras na central apenas algumas (as que davam para o perímetro da cadeia) tinham interesse para o guarda de serviço, porque aos sábados as oficinas e outras instalações estão fechadas.

"Ninguém se chegou à frente"

Questionado sobre se admite que poderá ter havido conivência ou cumplicidade de algum guarda ou outro funcionário da prisão na fuga, Rui Abrunhosa Gonçalves salientou que "neste momento e neste cenário tudo é admissível", mas enfatizou que é "preciso esperar pelo resultado das investigações" em curso para apurar a verdade dos factos.

O entrevistado não deixou contudo de reconhecer que em outras situações, como entrada de telemóveis, droga e outros objectos proibidos nas cadeias verificaram-se ligações a funcionários dessas cadeias, incluindo guardas.

De todo o modo, vincou que não pretende "fazer qualquer tipo de julgamento apressado" sobre o que realmente sucedeu em Vale de Judeus.

Quanto à sua saída do cargo, Rui Abrunhosa Gonçalves afirmou que estava consciente que "nestas circunstâncias há sempre cabeças que rolam" e sendo ele na altura o dirigente máximo das prisões percebeu que isso poderia acontecer, tanto mais que, disse, "nada e ninguém se chegou à frente para fazer algum tipo de declaração em defesas dos dirigentes" das cadeias.

Foi aí, confessou, que percebeu que "provavelmente o seu futuro estava anunciado".

Rui Abrunhosa Gonçalves revelou que há mais de um ano, ou seja desde o anterior Governo socialista, que tinha pedido ao Ministério da Justiça o reforço do efectivo de guardas prisionais. Reiterou no entanto que os 33 guardas existentes no dia da fuga em Vale de Judeus eram suficientes para assegurar o serviço de segurança e restantes tarefas.

Cinco reclusos fugiram no sábado do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, em Alcoentre, no concelho de Azambuja, distrito de Lisboa.

Os evadidos são dois cidadãos portugueses, Fernando Ribeiro Ferreira e Fábio Fernandes Santos Loureiro, um cidadão da Geórgia, Shergili Farjiani, um da Argentina, Rodolf José Lohrmann, e um do Reino Unido, Mark Cameron Roscaleer, com idades entre os 33 e os 61 anos.

Foram condenados a penas entre os sete e os 25 anos de prisão, por vários crimes, entre os quais tráfico de droga, associação criminosa, roubo, sequestro e branqueamento de capitais.