A dura realidade de encarar o fracasso no retorno forçado para casa

Brasileiros que acreditaram no sonho de uma vida melhor em Portugal pedem ajuda para voltar para casa. A maior parte dessas pessoas não se preparou para construir uma nova história em outro país.

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Muitos brasileiros não se preparam adequadamente para se mudar para Portugal e o sonho de viver em outro país se transforma em pesadelo Vicente Nunes
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Mudar de país é uma experiência enriquecedora, mas, também, pode apresentar desafios e mesmo o fim de um sonho acalentado há anos. São muitos os brasileiros em Portugal que têm conseguido driblar as dificuldades e levar adiante a nova vida, no entanto, tem aumentado o número de cidadãos retornando para o Brasil, seja pela saudade de casa, seja pela dificuldade de adaptação ou pelo acúmulo de frustrações.

Dados da Organização Internacional para as Migrações (OIM) apontam que cerca de 5,5 mil brasileiros pediram, entre 2016 e março de 2024, ajuda para retornar ao Brasil. Nem sempre, porém, é possível atender a todos, e o processo é demorado. Em 2023, por exemplo, apenas 367 brasileiros conseguiram cruzar o Atlântico novamente. São, no geral, pessoas que não se prepararam para a jornada da imigração, como sempre ressalta Fábio Knauer, da consultoria Aliança Portuguesa.

Normalmente, os brasileiros que têm o sonho interrompido se iludiram com base em informações falsas, difundidas por influencers, pessoas que usam as redes sociais para vender facilidades, mas não entregam nada. Eles se disseminaram de uma tal forma, que o Ministério Público de Portugal abriu uma investigação para apurar possíveis irregularidades. Pelo menos 22 youtubers brasileiros estão sob suspeição. Especialista em imigração, o advogado Bruno Gutman tem sido uma voz importante contra esse tipo de golpe, pois muitos desses influencers se apresentam como advogados.

O sonho acabou

Assumir o fracasso não é fácil para muita gente. “Minha mudança para Portugal foi um sonho que durou pouco”, conta Carlos da Silva. Cabisbaixo, ele pede para se apresentar com um pseudônimo para não virar motivo de chacota. “As pessoas não perdoam quem fracassa. Voltei para o Brasil com uma mão na frente e outra atrás”, ressalta. “Mas tenho certeza de que vou me reerguer”, complementa.

Carlos conta que nunca ganhou salário mínimo no Brasil. Por isso, não se iludiu com a versão de que, em Portugal, o mínimo era maior. “Antes de me mudar para Portugal, era motorista de aplicativo. Tirava R$ 7 mil (1,1 mil euros) líquidos por mês, mas acreditei que poderia faturar mais no novo país. Me deixei influenciar por um youtuber e me dei mal. Em Portugal, tudo está muito caro, um salário mínimo não cobre boa parte das despesas”, relata. “Fui ficando sem dinheiro e passando necessidade. O jeito foi voltar para o Brasil antes que a situação piorasse de vez”, acrescenta.

Pedro Rocha, também nome fictício, está pronto para retornar ao Brasil. Depois de meses tentando trabalhar na área em que se formou, de Recursos Humanos, teve de se render a subempregos para sobreviver. “Mas, cansei. Infelizmente, em Portugal, não reconheceram meu diploma. E o tempo foi passando e percebi que a minha qualidade de vida estava melhor no Brasil. Além de tudo, estarei próximo da minha família, o que é o principal. Quero retornar logo para minha casa”, afirma.

Para Vera Lúcia, a palavra certa para definir a passagem dela por Portugal é frustração. Também sob um nome fictício, ela conta que vendeu a casa e o carro no Brasil para construir uma nova vida em Portugal. “Mas, pelo que vejo, os brasileiros que estão estruturados no país chegaram há muito mais tempo e encontraram um país menos caro e com mais facilidades para os imigrantes. Eu estou em Portugal há um ano e meio e posso dizer que não deu certo. Queimei a minha poupança e estou correndo atrás do prejuízo para juntar dinheiro e voltar para o Brasil”, frisa.

Reforço na ajuda

Diante de tantos casos de imigrantes querendo voltar para os países de origem, o governo de Portugal anunciou um reforço do orçamento de apoio à Organização Internacional para as Migrações, para auxiliar nesse processo, que inclui serviços de apoio para a reintegração à vida que as pessoas tinham antes de mudarem para o país europeu.

Esse suporte, contudo, ficou suspenso por seis meses, sendo retomado somente em junho deste ano. A OIM é uma organização intergovernamental independente, que atua na promoção da migração humana ordenada e segura, não estando ligada a nenhuma outra organização internacional específica. É financiada por meio de contribuições voluntárias de seus Estados membros, observadores e outros parceiros. Por isso, os recursos disponíveis para ajudar imigrantes a voltar para seus países são restritos.

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