Número de alunos migrantes aumentou 160% em cinco anos. São hoje 140 mil
Desde 2018, as escolas receberam mais 90 mil alunos estrangeiros, que representam já 14% dos estudantes do básico e secundário. “Um problema bom” para o qual o Governo diz ter um plano “em breve”.
É uma realidade cada vez mais presente nas escolas portuguesas e um desafio que se impõe a directores, professores e comunidade escolar: o aumento do número de alunos imigrantes. E os números são muito claros: em cinco anos, chegaram às escolas mais 90 mil estudantes estrangeiros, passando de 53 mil em 2018/2019 para 140 mil em 2023/2024. É um crescimento de mais de 160%.
“Não são números pequenos. Temos mais 90 mil alunos estrangeiros. Estão no país todo. Isto coloca imensos desafios”, notou o ministro da Educação na apresentação do novo relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Education at a Glance 2024, divulgado nesta terça-feira de manhã.
À boleia da chegada de mais imigrantes ao país, o número de alunos nas escolas também tem estado aumentar, depois de mais de uma década a decrescer: se em 2021/2022 os estabelecimentos escolares receberam mais 15 mil estudantes, no ano lectivo seguinte, esse aumento foi ainda mais expressivo, chegando quase aos 19 mil alunos. O crescimento tem-se reflectido, sobretudo, no 1.º ciclo.
Para o ano lectivo que se inicia, prevê-se que esse número seja superado, já que estão já matriculados mais 20 mil alunos só no básico e secundário, notou o ministro da Educação. Ao longo do ano lectivo, é expectável que cheguem ainda mais.
Em termos nacionais, os alunos estrangeiros representam 14% dos alunos do ensino básico e secundário. “Em muitas escolas na região de Lisboa e do Algarve os [números] são muito mais elevados”, sublinhou.
Para Fernando Alexandre, este é “um problema bom”. “O que seria trágico era começar a fechar escolas, a fechar salas.”
Para que as escolas tenham mais ferramentas para garantir uma melhor integração e aprendizagem destes estudantes, o Governo está a preparar um plano, que deverá ser apresentado "muito em breve" e que procurará responder, por exemplo, ao "desafio" que é ter 25 a 30% destes alunos dentro das salas de aula sem falarem português.
“A integração dos imigrantes é essencial para o funcionamento da economia e para que a nossa sociedade se mantenha coesa. A integração destas pessoas passa pela educação e começa nos filhos destes imigrantes. Se falharmos na integração dos imigrantes, falhamos na nossa política de imigração”, notou.
Mais estudantes estrangeiros no superior
Além do aumento de alunos estrangeiros no ensino básico e secundário, o relatório Education at a Glance 2024, que analisa vários sistemas de ensino pelo mundo, revela também que são cada vez mais os estudantes estrangeiros (incluindo-se aqui também os internacionais) que escolhem instituições de ensino superior portuguesas para estudar: entre 2013 e 2022, essa proporção passou de 4% para 12%.
O relatório mostra ainda que, em Portugal, 17% das pessoas entre os 25 e os 64 anos que frequentaram o ensino superior são estrangeiras. Comparando com os que têm uma escolarização inferior ao 9.º ano, essa percentagem desce para os 9%. Quer isto dizer que, no país, “há uma maior proporção de estrangeiros com níveis superiores de qualificação do que com níveis inferiores”, destaca o chefe da Divisão de Assessoria e Implementação de Políticas da Direcção da Educação e Competências da OCDE, Paulo Santiago, também na apresentação do Education at a Glance 2024.
Por isso, no país, “há um nível de qualificação maior entre os imigrantes” quando comparado, por exemplo, com a Suíça, onde 75% das pessoas dessa faixa etária que não completaram o 9.º ano são estrangeiros; com o ensino superior são 39%.
“Isto associa-se a um conjunto de políticas que são necessárias no ensino que tem a ver com a língua, com apoio extra, que muitos países já implementam”, sublinhou Paulo Santiago, lembrando que a origem e o próprio contexto familiar dos alunos têm muito impacto no seu sucesso académico.
“Os estudantes socioeconomicamente desfavorecidos de origem imigrante têm mais probabilidades de repetir os anos de escolaridade do que os estudantes mais favorecidos, o que também pode conduzir a uma taxa de conclusão mais baixa e, além disso, a desigualdades socioeconómicas persistentes”, realça o relatório.
Isso reflecte-se, por exemplo, na percentagem de jovens “nem-nem”, que não estudam nem trabalham: é maior entre os estrangeiros. “As taxas de conclusão do ensino superior revelam disparidades relacionadas com a origem dos pais e da imigração dos estudantes. Os estudantes com pais menos instruídos e oriundos de famílias imigrantes tendem a registar taxas de conclusão inferiores às dos estudantes com pais mais instruídos ou oriundos de famílias não imigrantes.”
30% dos alunos de Lisboa e Setúbal não chegam ao superior
Sobre este tema, o ministro da Educação notou que a "igualdade de oportunidades ainda não existe em Portugal", sublinhando que a origem social e familiar dos alunos continua a ter "forte impacto no seu percurso" académico. A par disso, permanecem ainda "desigualdades territoriais no acesso à educação", dando como exemplo os casos de Lisboa, Setúbal ou Faro, onde cerca de 30% dos alunos "nunca chegaram ao ensino superior".
“Em Lisboa, 29% dos alunos não chegam, não entram, nunca apareceram no ensino superior e cerca de 33% dos jovens de Setúbal nunca estiveram inscritos em nenhum curso superior, nem num Tesp [curso técnico superior profissional]", sublinhou.
Para o governante, o parco acesso ao pré-escolar ou até a falta de professores — que é precisamente mais notória nestas zonas — pode ser uma justificação. “Temos áreas em que a igualdade de oportunidades não é alcançada (...) Ao não garantirmos que todos têm aulas, isso reflecte-se no acesso ao ensino superior.”