Missão da SpaceX para colocar civis a caminhar no espaço lançada com sucesso

A empresa de Elon Musk envia a primeira de três missões da Polaris Dawn para o espaço. Entre os objectivos desta viagem de cinco dias está a primeira caminhada espacial privada.

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A missão conduzirá os quatro tripulantes a uma viagem em órbita durante cinco dias Polaris Dawn
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O relógio já marcava as 10h23 (hora de Portugal continental) quando a SpaceX lançou com sucesso a primeira de três missões apelidadas de Polaris Dawn. O que são? A concretização de parte das ambições da SpaceX, de Elon Musk, em tornar o voo espacial acessível a quem não seja astronauta (desde que consiga pagar as dispendiosas viagens), mas também uma série de novas conquistas para o mundo espacial – na última década cada vez mais alicerçado nas empresas privadas.

Revendo as conquistas que as missões Polaris Dawn, e esta primeira em particular, conseguirão, há várias novidades. Pela primeira vez, um voo espacial totalmente privado vai tentar um passeio espacial – sem astronautas das agências espaciais, como até aqui foi feito. Pela primeira vez, também, a cápsula Crew Dragon, que transporta os quatro tripulantes civis, conduzirá os passageiros mais longe do que qualquer viagem espacial tripulada desde a última missão Apolo à Lua, em 1972. Mais: se tudo correr como previsto, pela primeira vez duas mulheres baterão a marca dos 621 quilómetros de altura da astronauta norte-americana Kathryn Sullivan (recorde do voo mais alto na História, para já). A missão Polaris Dawn prevê alcançar uma altura máxima de 1400 quilómetros já neste primeiro dia de voo – duplicando o recorde actual para tripulantes espaciais femininas.

A bordo seguirão o multimilionário Jared Isaacman, fundador da empresa tecnológica de processamento de pagamentos Shift4, Scott Poteet, antigo piloto da Força Aérea norte-americana, Sarah Gillis, engenheira espacial e responsável pelas operações da cápsula, e Anna Menon, também engenheira espacial e responsável médica da Polaris Dawn.

Numa missão repleta de “primeiras”, não é, no entanto, a primeira vez que o financiador das missões Polaris Dawn, Jared Isaacman, vai ao espaço. Já em 2021, o empresário norte-americano tinha voado para o espaço noutra missão da SpaceX, naquela que foi a primeira missão espacial apenas com civis. Neste caso, no entanto, a missão Polaris Dawn terá cinco dias e marcará uma série de recordes – caso tudo corra como previsto.

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A descolagem da missão Polaris Dawn no Centro Espacial Kennedy, nos Estados Unidos Joe Skipper/Reuters

Já no final de Agosto, a missão Polaris Dawn viu o seu lançamento adiado devido a uma pequena fuga de hidrogénio. Na manhã desta terça-feira (madrugada nos Estados Unidos), a descolagem do Centro Espacial Kennedy, na Florida, não contou com qualquer imprevisto.

Milhões e milhões de euros

“Ao contrário de uma missão na Estação Espacial Internacional, não temos a opção de prolongar a presença em órbita, portanto temos de assegurar que a meteorologia é tão favorável quanto possível antes do lançamento”, escreveu Jared Isaacman na rede social X (de Elon Musk) aquando do cancelamento do voo, a 28 de Agosto. A missão Polaris Dawn tem tudo contabilizado: há quantidades limitadas de ar, comida e outros suplementos necessários para estes cinco dias.

O empresário é o principal financiador das missões Polaris Dawn, mas recusou-se a dizer quanto custou o pagamento das mesmas. Segundo a agência Reuters, estas três missões financiadas terão custado centenas de milhões de euros.

Após o lançamento bem-sucedido, a tripulação ficará em órbita apenas a 190 quilómetros da superfície da Terra, antes de dar o “salto” para os tão ambicionados 1400 quilómetros de altura. Mais um recorde: esta será a maior altura alcançada por tripulantes que não iam para a Lua. E esse é um marco já de 1966, no programa Gemini – apenas o segundo projecto de exploração espacial a cargo da NASA.

“Ao olhar para a Estrela Polar, lembrem-se de que a vossa coragem ilumina o mapa para futuros exploradores”, disse o director de lançamento da SpaceX, Frank Messina, aos quatro tripulantes, via rádio.

A esta distância, como a SpaceX explica, a cápsula Crew Dragon, que protege os tripulantes desta primeira missão Polaris Dawn, atravessará vários cinturões de radiação que circundam o planeta Terra. Aproveitando isso, outro dos intuitos da missão é realizar algumas experiências científicas nas quais possam avaliar os riscos de trabalhar e manobrar em ambientes mais hostis (em termos de radiação) do que os habituais para os astronautas. Por exemplo, a missão vai recolher dados sobre o ambiente radioactivo nestes cinturões e também utilizar ferramentas de ultra-som para detectar e quantificar êmbolos gasosos, ou seja, perceber os níveis de obstrução do gás no fluxo sanguíneo no espaço – um problema que pode culminar na redução da irrigação sanguínea e num ataque isquémico.

A caminhada espacial está marcada para meio do percurso, esta quinta-feira, o terceiro dia da viagem, quando toda a tripulação sairá pela comporta da Crew Dragon e tentará caminhar no espaço – aí já terão descido para 700 quilómetros acima da superfície da Terra. E farão isso com um novo fato espacial criado pela SpaceX, que será testado pela primeira vez nesta mesma missão.

Até agora, apenas astronautas treinados e financiados por agências governamentais – como a NASA, a Roscosmos (Rússia) ou a Agência Espacial Europeia – tinham feito caminhadas espaciais. Na próxima quinta-feira isso poderá mudar. Para lá das 270 caminhadas espaciais na Estação Espacial Internacional – e outras 16 da estação chinesa Tiangong –, poderemos ver os primeiros civis a avançar lentamente para uma caminhada flutuante.

Este será o principal marco da primeira de três missões que pretendem demonstrar que as empresas privadas (ou melhor, a SpaceX) são capazes de desenvolver programas espaciais sem os astronautas das agências governamentais. Apesar de estarem dependentes das condições atmosféricas, está previsto que a tripulação regresse após cinco dias – ou seja, este sábado –, com uma amaragem no Golfo do México ou no Oceano Atlântico.

Apesar de ter civis e um multimilionário a bordo, não será um passeio no parque. A caminhada espacial será o momento mais difícil, mas todo o percurso terá contornos perigosos, quer pelas altitudes e diferenças de pressão, quer pela exposição ao vácuo e potenciais toxinas que isso libertará no corpo. Para já, o primeiro passo revelou-se um sucesso. Os próximos dias ditarão se esta é ou não mais uma nota na afirmação espacial da empresa de Elon Musk.

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