ONU pede missão de paz para o Sudão face a prováveis crimes de guerra

Comissão de inquérito das Nações Unidas diz que face à gravidade da situação é preciso “uma acção urgente e imediata para proteger os civis”.

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Mohamed Chande Othman, presidente da missão de inquérito da ONU, na apresentação das conclusões SALVATORE DI NOLFI / EPA
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Ambos os lados da guerra civil do Sudão cometeram abusos em grande escala que podem equivaler a crimes de guerra ou crimes contra a humanidade, afirmou uma missão mandatada pela ONU nesta sexta-feira, recomendando um embargo de armas e uma força de manutenção da paz para proteger os civis.

O relatório de 19 páginas de uma missão de inquérito da ONU, baseado em 182 entrevistas com sobreviventes, familiares e testemunhas, afirma que tanto o Exército sudanês como o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (RSF) foram responsáveis por ataques a civis e recorreram a tortura e a detenções arbitrárias.

"A gravidade destas conclusões sublinha a necessidade de uma acção urgente e imediata para proteger os civis", afirmou o presidente da missão, Mohamed Chande Othman, apelando ao envio imediato de uma força independente e imparcial.

O relatório é o primeiro da missão de três membros desde a sua criação, em Outubro de 2023, pelo Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra.

A população civil do Sudão está a enfrentar um agravamento da fome, deslocações em massa e doenças após 17 meses de guerra entre o Exército e os paramilitares das RSF.

Um grupo de mediação liderado pelos EUA disse no mês passado que tinha garantias de ambas as partes em conversações na Suíça para melhorar o acesso à ajuda humanitária, mas que o processo não tinha avançado porque o Exército sudanês esteve ausente das discussões.

O Programa Alimentar Mundial (PAM) diz que a comida a chegar é muito menos do que a que seria necessária, e ambos os lados são acusados de bloquear a ajuda para territórios controlados pelos rivais, de roubar comida e causar danos.

A BBC diz que há uma zona em que foi declarada fome, no campo de Zamzam no Darfur, mas isto porque este é um dos poucos locais em que a ONU tem informação fiável.

Num campo de deslocados de Porto Sudão, a BBC ouviu histórias de pessoas deslocadas que fugiram de zonas de combates. Num grupo de mulheres, muitas com bebés ao colo ou filhos pequenos, não houve uma que não contasse ter sido violada ou torturada pelas RSF.

"Todos os dias levavam o meu filho para um quarto no fim do corredor, e eu ouvia-o chorar enquanto me violavam", contou uma das mulheres. "Aconteceu tantas vezes que tentava focar-me no choro dele enquanto o faziam."

Em muitos casos os maridos ficaram para trás. "Todos os dias os meus filhos me perguntam pelo pai, quando vai chegar", contou outra mulher. "Mas não sei nada dele desde Janeiro, não sei se ainda está vivo."

Não é a única coisa que o filho de dez anos pergunta, também pede para ir para casa. "Passámos de viver numa casa, de ele ir à escola, para viver numa tenda."