Comecemos pelas boas notícias: esta quinta-feira, numa decisão inédita no continente asiático, o Tribunal Constitucional da Coreia do Sul declarou que as leis em vigor no país para combater as alterações climáticas não protegem os direitos humanos básicos e carecem de objectivos para proteger as gerações futuras. Até Fevereiro de 2026, determinou o tribunal, a lei da neutralidade carbónica terá que ser revista para passar a estar em conformidade com a Constituição da Coreia do Sul. Isso mesmo: falhar na acção climática é inconstitucional. A decisão pode ser um ponto de viragem para um país que está entre os "vilões do clima" a nível global.

A vitória celebrada do outro lado do planeta contrasta com as notícias que tivemos na Europa: na quarta-feira, o governo suíço anunciou que vai refutar a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH). Em Abril, o tribunal tinha dado razão à associação KlimaSeniorinnen, as "Avós pelo Clima", e determinou que a acção climática da Suíça é insuficiente, violando direitos como o respeito pela vida privada e familiar (ao interferir com as suas vidas) e o acesso aos tribunais. A posição do Governo, que ainda tem de ser comunicada oficialmente ao Comité de Ministros do Conselho da Europa, é um balde de água fria no percurso de implementação da decisão histórica (ou "uma bofetada na cara dos cidadãos", como afirmam as KlimaSeniorinnen).

Mas a luta nos tribunais europeus não pára. Enquanto os processos apresentados ao TEDH aguardam um desfecho, um conjunto de ONG reacendeu uma outra frente de batalha: o Tribunal de Justiça da União Europeia. Aqui, a grande questão será saber se as medidas executadas pela Comissão Europeia estão a violar a própria Lei do Clima, caso se confirme que são claramente insuficientes para atingir os objectivos assumidos pelo bloco, como alegam as associações. Do outro lado do Atlântico, também o Tribunal Interamericano dos Direitos Humanos promete novidades ainda este ano, depois de ter realizado audiências em toda a região, numa decisão sobre as obrigações dos Estados decorrentes dos deveres de prevenção e garantia dos direitos humanos em contexto de emergência climática.

Por fim, no final do ano, irá avançar outra grande frente de batalha climática nos tribunais: está agendado para 2 de Dezembro o início das audiências públicas do pedido de um parecer consultivo do Tribunal Internacional de Justiça sobre as obrigações dos Estados no que diz respeito às alterações climáticas.

Em suma, a justiça climática continua em força – e não apenas nos tribunais. O debate sobre os direitos humanos relacionados com o impacto das alterações climáticas também tem sido feito a nível mais profundo de que direitos, afinal, estamos a falar? Quem tem direito a usufruir de facto dos direitos?

Em Setembro, na 79.ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, o Relator Especial para o Desenvolvimento, Surya Deva, vai apresentar dois relatórios com reflexões sobre os direitos que temos e os que deveríamos considerar. Por um lado, defende que os direitos das gerações futuras não devem ser apenas "necessidades e interesses" (como têm sido tratados), nem devem ser restritos à espécie humana, já que a nossa existência está intrinsecamente associada à ligação com os outros seres vivos que habitam o planeta (isso mesmo, uma abordagem ecológica deve considerar uma "justiça multi-espécies").

Outra ideia que será apresentada perante a Assembleia Geral da ONU é um novo enquadramento para a justiça climática, que olha para a reparação por perdas e danos causados pelas alterações climáticas como uma forma de remediação que deve ser da responsabilidade dos grandes emissores históricos. Além da mitigação, da adaptação e da remediação, Surya Deva propõe um quarto pilar, que é verdadeiramente desafiante: o da transformação, ou seja, reconhecer que não conseguiremos atingir justiça climática no actual sistema consumista, obcecado com o crescimento do PIB, desligado de obrigações vinculativas com os direitos humanos e mudar o chip.

Enfim, em matéria de justiça climática (aquela que vai além dos tribunais), o ponto alto desta rentrée talvez seja a Cimeira do Futuro, o grande encontro a 22 e 23 de Setembro que o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, convocou para tentar harmonizar uma agenda transformadora para (finalmente) atingir os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável.

Certamente, e infelizmente, não será uma agenda "transformadora" no mesmo sentido que Surya Deva propõe. Mas podemos esperar que, pelo menos, sirva para nos darmos conta dos direitos que temos mas não conseguimos usufruir, assim como os direitos que ainda não estão no papel, mas já começamos a perceber que serão essenciais para o nosso futuro em comum.


Na próxima semana, estarei em Berlim num retiro de jornalistas da Clean Energy Wire (CLEW) Network para reflectir sobre a transição energética, explorar caminhos de escrutínio para garantir uma transição justa e construir redes para colaborações entre países. A que questões devemos dar atenção no meio desta transição complexa? Existem padrões de desigualdade que fazem sentido aprofundar em conjunto com outros países? Se tiver dúvidas, ideias ou sugestões, envie um email!