Maioria dos brasileiros compra passagem aérea parcelada para caber no bolso

Mesmo aqueles que têm dinheiro para pagar à vista preferem dividir valores. Várias empresas aéreas internacionais só parcelam os bilhetes no Brasil. As prestações, sem juros, vão de oito a 10 meses.

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Para viajar, brasileiros dividem o valor das passagens aéreas. Aeroporto de Lisboa é um dos destino dos viajantes Vicente Nunes
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A maior parte dos brasileiros — nove em cada 10 — que viajam de avião compram passagens aéreas parceladas no cartão de crédito ou por meio de boletos bancários. A divisão do valor do bilhete é uma característica do Brasil, que recorre a esse mecanismo para fazer a compra caber no orçamento doméstico. Essa forma de pagamento está tão enraizada entre os brasileiros, que várias companhias aéreas, mesmo as internacionais, como a TAP Air Portugal, se renderam ao parcelamento.

“Entre os meus clientes, 90% parcelam o valor das passagens”, diz Cláudio Del Bianco, diretor da DelBianco Travel Experience, do Rio de Janeiro. Edilson Miranda do Amaral, diretor da Trans Aero Viagens e Turismo, em João Pessoa, Paraíba, acrescenta: “Quase a unanimidade das pessoas que atendemos pagam as passagens de forma dividida”. No geral, ressaltam os dois empresários, o parcelamento varia entre oito e 10 vezes. A partir daí, há incidência de juros.

Para a servidora pública aposentada, Magda Myron, 64 anos, não há outra forma de se comprar passagens aéreas, a não ser dividindo o valor. “Normalmente, no cartão de crédito, pode-se dividir em até 10 parcelas iguais. Isso nos permite planejar bem a viagem, pois vamos pagando devagar”, diz. “Recorro ao parcelamento tanto para passagens nacionais quanto internacionais”, complementa.

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A aposentada Magda Myron diz que parcela os valores tanto de passagens nacionais quanto internacionais Arquivo pessoal

A servidora Lu Caldas, 64, esteve recentemente em Portugal para um reencontro com suas origens — tem cidadania por ser descendente de portugueses. Para viajar de classe executiva, ela comprou a passagem com seis meses de antecedência. “Dividi o valor em oito prestações, que era o máximo que a TAP permitia. Agora, a empresa estendeu esse prazo para 10 meses”, afirma. “Foi mais tranquilo pagar assim. E viajei com mais conforto”, emenda.

A TAP informa, por meio de sua assessoria de imprensa, que o Brasil é o único local para onde voa — são quase 60 destinos saindo de Portugal — em que o valor das passagens aéreas pode ser pago em prestações. Mas o parcelamento só é aceito em cartão de crédito emitido no Brasil.

Capacidade financeira

Del Bianco, que está há décadas no mercado, assinala: “É hábito dos brasileiros pagar os bilhetes aéreos por meio de cartão de crédito ou de boleto bancário, em 10 vezes sem juros. De 12 a 24 vezes, os parcelamentos têm juros, que, no Brasil, são altos”. Há, ainda, aqueles que pagam as passagens em até 36 meses. “Cada um adequa a forma de pagamento segundo a capacidade financeira”, frisa.

A jornalista Rozane Oliveira, 61, gosta de planejar muito bem as viagens, para não se enredar em dívidas. “Compro sempre as passagens com antecedência e sempre parcelo os valores. Assim, quando vou viajar, praticamente não estou devendo nada. Isso faz com que a volta da viagem, normalmente de férias, seja tranquila, sem preocupações com dívidas”, ensina. Outra dica de Rozane é sempre pesquisar os preços, pois é possível encontrar boas promoções.

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Para a jornalista Rozane Oliveira, é preciso planejar bem o parcelamento de passagens aéreas para não acumular muitas dívidas Arquivo pessoal

Popular operadora de viagens no Brasil, a CVC refinou o relacionamento com os clientes criando o seu marketplace de crédito. Por meio dele, é possível parcelar as passagens em até 24 vezes. “É uma boa estratégia”, reconhece Rozane. Mas, no entender dela e de Magda Myron, a prioridade deve ser sempre por comprar os bilhetes aéreos sem juros. E isso também pode ser feito por meio das páginas das companhias na internet.

Segundo Miranda do Amaral, da Trans Aero Viagens, o parcelamento de passagens aéreas no Brasil é tão comum que, mesmo as pessoas que têm dinheiro para pagar à vista, optam por dividir o valor. “Vejo isso pelos nossos clientes. A primeira pergunta que fazem quando chegam às nossas lojas é se os valores dos bilhetes podem ser parcelados. Essa opção, inclusive, é garantia de vendas”, diz.

Funcionária aposentada do Banco Central do Brasil, Teresa Alves, 72, ressalta que todas as empresas áreas brasileira parcelam o valor das passagens, mas, entre as internacionais, há algumas que se recusam a dividir o pagamento, como a Emirates. “Quem pode pagar a passagem à vista, fica mais tranquilo quando o parcelamento não é permitido. Mas, se houver essa opção, divido o valor”, afirma.

Dicas de especialista

Para Felipe Vailant, diretor da Foca Tur, do Espírito Santo, não há como abrir mão do parcelamento das passagens aéreas. Ele conta que, entre abril e junho últimos, embarcou 300 pessoas para o exterior. Delas, 90% dividiram o pagamento nos cartões de crédito. Do grupo, 40% seguiram para Portugal para turismo de lazer e corporativo. “Creio que, ao final do verão europeu, esse número deve aumentar consideravelmente”, prevê.

Para especialistas, é compreensível que a maior parte dos brasileiros prefira dividir o valor das passagens áreas, pois fica mais confortável para pagar, pois cabe no bolso. Contudo, é importante ficar atento para se evitar o endividamento. Às vezes, as pessoas se empolgam e compram vários bilhetes ao mesmo tempo e, quando vão ver a fatura do cartão, o valor a ser pago é altíssimo.

"Não há nada de errado em comprar parcelado, mas é preciso ter disciplina, para não acumular dívidas que levem à inadimplência", indica Ricardo Rocha, professor de finanças da escola de negócios Insper. Ele ressalta que um bom caminho para quem compra a prazo é monitorar todas as prestações a vencer e separar uma quantia para os pagamentos mensais. "É o que chamamos de controle do fluxo de caixa", explica.

Ele chama a atenção para outro ponto: "No Brasil, não há desconto para pagamento à vista. Portanto, as pessoas preferem parcelar. Isso ocorre com as passagens aéreas, que não são itens baratos, e também com artigos de lojas de luxo", detalha. "Imagine uma família de quatro pessoas sem renda elevada, que queira ir para Portugal. Pelo valor das passagens, do hotel e da alimentação, só mesmo dividindo no cartão de crédito", completa.

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