São os documentos da viatura e os milhões que tem na mala, s.f.f.

Um ladrão engenhoso e com a dose certa de sangue-frio ludibriou quatro funcionários de um banco para meter ao bolso milhões de ienes. Quem ficou de mãos a abanar foram os trabalhadores da Toshiba.

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Mais um crime não resolvido José Alves
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Mistérios por Arquivaré uma série de textos sobre crimes nunca resolvidos do P2 de Verão 2024 – porque os casos até podem estar arquivados, mas o mistério não prescreve.


Os quatro funcionários do banco Nippon Trust entraram no carro com a missão de ir à fábrica da Toshiba entregar o dinheiro que serviria para pagar o prémio natalício a cerca de 4500 trabalhadores. Parecia coisa simples. Era de manhã, chuviscava, o caminho entre a agência de Kokubunji e a fábrica fazia-se num quarto de hora.

Quando já estavam quase a chegar ao destino, numa estrada paralela ao grande muro da prisão de Fuchu, um subúrbio de Tóquio, repararam que um agente da polícia numa motorizada lhes fazia sinais de luzes. Pouco depois, a mota ultrapassava-os e o agente pedia-lhes que encostassem.

Ryoichi Sekiya, o motorista do Nissan preto, baixou o vidro e perguntou o que se passava. O agente disse-lhes que acabara de receber a informação de que a casa do gerente do banco tinha explodido e que havia a suspeita de que aquele carro estava armadilhado com dinamite. Sekiya ainda lhe disse que tinha a certeza de que não havia ali explosivos, mas já o agente estava a rastejar para debaixo da viatura.

Os quatro homens saíram do automóvel e puseram-se junto à bagageira, onde transportavam a sua valiosa mercadoria. De repente começou a sair fumo da parte de baixo do carro e o polícia gritou que este estava prestes a explodir. Os bancários correram para longe – e viram o agente sentar-se ao volante e a partir tranquilamente. Com ele foram 294 milhões de ienes (qualquer coisa como 6,7 milhões de euros ao câmbio actual).

Um dos maiores roubos do pós-guerra no Japão foi também um dos mais fáceis. Ao ladrão bastou-lhe um casaco de cabedal preto, um capacete branco e uma motorizada igualmente branca para se fazer passar por polícia. Da mesma forma, apenas precisou de um foguete para produzir fumo e simular que havia dinamite prestes a explodir.

O crime, que aconteceu a 10 de Dezembro de 1968 e nunca foi resolvido, apaixonou a opinião pública japonesa. Logo no dia seguinte, o Japan Times – que fez manchete com o caso – dizia que a polícia suspeitava de que se tratava de um roubo meticulosamente preparado. O ladrão tinha de conhecer bem os procedimentos do banco para saber que naquela bagageira ia dinheiro e que o carro ia passar ali às 9h20.

Havia um pormenor fundamental. Nos dias anteriores ao roubo, o gerente da agência bancária de Kokubunji tinha recebido ameaças de morte, pelo que os funcionários não desconfiaram quando o homem lhes falou na suposta explosão.

A polícia montou logo uma operação de grande envergadura. Nas primeiras horas, foram bloqueadas auto-estradas e outras vias e inspeccionados milhares de veículos. A motorizada, o Nissan e as caixas metálicas onde estava o dinheiro – abandonados a meio caminho – foram analisados a pente fino. Ao longo dos anos terão estado envolvidos detectives às centenas e milhares de pessoas foram interrogadas.

Um rapaz de 19 anos, filho de um polícia que trabalhava em motorizada, e que já tinha estado detido por crimes menores, foi um dos primeiros suspeitos. Acabaria por morrer de suicídio apenas quatro dias depois do roubo, ao ingerir cianeto de potássio. Isto veio a reforçar teorias sobre o seu envolvimento, mas a polícia nunca o confirmou.

A 10 de Dezembro de 1975, exactamente sete anos depois do sucedido, foi com “um pesar fúnebre” e “cabeças cabisbaixas”, segundo uma descrição da AP, que responsáveis policiais compareceram em conferência de imprensa para anunciar que o crime prescrevera. “Peço muitas desculpas pelo fim da investigação a este incidente, mas quero transformar o nosso falhanço numa lição para o futuro”, disse um polícia, cujo nome não é citado na notícia, mas que a agência fotográfica Getty identifica como sendo o superintendente Kuniyasu Tsuchida. Existe uma fotografia dele a fazer uma vénia enquanto assumia o fracasso. A investigação acabou por custar quase o triplo do valor do roubo.

Em 1988 expirou também o prazo para poder ser exigida uma indemnização, pelo que o ladrão poderia ter vindo a público assumir tudo sem que rigorosamente nada lhe acontecesse. Para desilusão dos trabalhadores da Toshiba que viram o seu dinheiro voar, mas para felicidade desta série de textos, ninguém o fez.

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