À cautela, PSP só deteve um indivíduo por maltratar animais em 2024

No ano passado tinham sido detidos em flagrante 32 agressores. Crime de abandono também divide juízes do Constitucional, com um deles a defender que lei protege mais os animais do que as pessoas.

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Inês Sousa Real, do PAN, lamenta a “falta de formação dos agentes da autoridade e dos magistrados” no que respeita aos crimes cometidos contra animais. Nuno Ferreira Santos
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Ao contrário do que sucedeu no ano passado, em que deteve em flagrante 32 pessoas por maltratarem ou matarem animais de companhia, em 2024 a PSP limitou-se a uma única detenção, já este mês.

Foi em Alcântara, em Lisboa, quando o dono de um cão atacou o animal ao soco em público, depois de o bicho ter tentado morder outro canídeo. Quando o animal se virou ao dono, este atirou-o contra o chão com um pontapé na cabeça, ao qual se seguiram vários socos. Alegou que estava a dar-lhe educação. Um polícia que ia a passar deu-lhe voz de prisão e o bicho foi-lhe retirado.

Segundo os registos da PSP, em 2020, altura da pandemia, foi o único ano em que se registaram zero detenções em flagrante por este crime. Em 2022 houve 15 detenções e em 2021 houve 29. De Janeiro até Agosto deste ano foram identificados 117 suspeitos de maus tratos por esta polícia, mas apenas detido este homem em Alcântara. Porquê?

Ressalvando que os dados agora apresentados ainda são provisórios, a PSP alega que, tratando-se de um crime que depende de perícias, “apesar de muitas vezes se presumir que se conhecem os suspeitos, são necessárias diligências que confirmem que efectivamente o são, pelo que se torna difícil existirem detenções em flagrante delito”. Muitos dos suspeitos acabam assim por ser detidos não no momento das agressões mas mais tarde, fora de flagrante, depois de a respectiva investigação ser aberta pelo Ministério Público e de a polícia ter recolhido mais indícios do crime, continua o gabinete de imprensa da PSP. Que não explica, porém, o que mudou entre 2023 e 2024 para os resultados serem tão díspares.

Juízes questionam legalidade das detenções

Os problemas que os agentes da autoridade têm enfrentado em tribunal, com alguns juízes a questionarem a necessidade e a legalidade destas detenções, podem estar na origem destas cautelas acrescidas na actuação nestes casos. Mas também poderão não ser alheias ao sucedido as sucessivas reservas à lei dos maus tratos que o Tribunal Constitucional foi colocando, muito embora date já de Janeiro de 2024 a decisão tomada em plenário pelos conselheiros de manter afinal a criminalização em vigor.

Para Inês Sousa Real, do PAN, as mudanças de posição no Palácio Ratton podem efectivamente ajudar a explicar que praticamente não tenham existido detenções este ano. Mas também a “falta de formação dos agentes da autoridade e dos magistrados” neste tema.

As denúncias mais comuns que têm chegado às polícias através da Linha Defesa Animal relacionam-se com cães a ladrar nas varandas, pátios sujos com fezes e urina e animais presos sem água nem comida, mas também com canídeos a passear sem trela e com tutores que educam os seus animais com base na violência.

A propósito do Dia Internacional do Animal Abandonado, que se celebrou esta quinta-feira, a PSP divulgou mais algumas estatísticas, que dão conta de que recebeu mais de 2900 denúncias por este crime desde 2015. O pico deu-se em 2017, com 396 denúncias, número que no ano passado desceu para 249. De Janeiro até agora registaram-se 125 denúncias por abandono.

Do lado da GNR também se verifica um decréscimo das denúncias por maus tratos (626 no ano passado contra 367 de Janeiro até agora) muito embora no que respeita ao abandono os números se mantenham idênticos.

Tal como o crime de maus tratos, também o de abandono de animais de companhia tem dividido os juízes do Tribunal Constitucional. E já há dois conselheiros a deixar claro, nos acórdãos em que se debruçaram ultimamente sobre estes casos, que a validação constitucional do crime de maus tratos não significa a do de abandono.

Num acórdão de Maio passado em que votou vencida, a juíza Mariana Canotilho dizia-se perplexa com a ideia de punir o abandono de cobras, pássaros ou rãs quando estes constituem animais de companhia: “Na realidade, tais actos, longe de implicarem uma desprotecção intolerável do bem-estar animal, permitirão, muitas vezes, preservar a dignidade animal (…), permitindo-lhes viver de acordo com a sua natureza.

Entendimento semelhante da questão tem sido expresso pelo conselheiro Afonso Patrão, para quem a lei protege actualmente mais os animais abandonados do que os seres humanos nessa situação.

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