No SNS metade dos partos são normais. Nos privados, os normais são menos de 20%

“Privados não têm capacidade para ser alternativa aos públicos”, diz presidente da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia. Os três grandes hospitais privados de Lisboa fizeram 10.236 partos em 2023.

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O médico Nuno Clode diz que “os privados não têm capacidade para ser alternativa aos públicos” STRINGER/MEXICO / REUTERS
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Como se nasce em Portugal? Basicamente nos hospitais que, segundo os últimos dados detalhados disponíveis, do Instituto Nacional de Estatística (INE), fizeram 82,8 mil partos em 2022 — e quase 80% foram realizados no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Aqui, metade (50,2%) foi efectuada sem intervenção instrumental ou cirúrgica, nomeadamente cesariana (os chamados partos eutócicos ou normais). Já os hospitais privados efectuaram" 14,7 mil partos", pouco mais de um sexto do total e perto de 82% destes (cerca de 12 mil) implicaram a realização de cesariana ou o recurso a instrumentos de apoio como fórceps ou ventosas (partos distócicos).

O PÚBLICO pediu à Direcção-Geral da Saúde (DGS) e à Entidade Reguladora da Saúde (ERS) organismos a que todos os hospitais estão obrigados a prestar contas por portaria datada de 2016 e da autoria de Fernando Araújo, que era então secretário de Estado adjunto da Saúde os números de 2023 dos blocos de parto, públicos e privados. A DGS remeteu para os dados dos hospitais do SNS que estão disponíveis no Portal da Transparência (têm apenas o número de partos e de cesarianas) e, quanto aos privados, mandou consultar as estatísticas do INE de 2022.

A ERS tem esses dados detalhados, mas são de 2021 e resultam de uma monitorização divulgada no ano passado. E estes dados de 61 instituições de saúde que fizeram 75.468 partos em 2021 em Portugal continental entre públicas, privadas e do sector social permitiram perceber que, nesse ano, três privadas realizaram 100% dos partos por cesariana, e outras usaram este método com quase todas as grávidas assistidas.

Quanto aos dados recentes dos partos nos hospitais privados, sem um portal da transparência para este sector, ficamos dependentes dos números que os grupos de saúde decidem disponibilizar. O PÚBLICO solicitou os números de 2023 de partos e de ginecologistas-obstetras que trabalham nos três grandes hospitais privados de Lisboa, onde os problemas das urgências de ginecologia-obstetrícia se concentram.

A Luz Saúde adiantou que, no ano passado, fez 3891 partos em Lisboa, enquanto os Lusíadas realizaram 3205 na capital e a Cuf Descobertas totalizou 3140. Sobre o número de ginecologistas-obstetras, apenas os Lusíadas responderam, adiantando que na região da Grande Lisboa “colaboram mais de 130 médicos" desta especialidade "com diversos vínculos contratuais, quer em regime de dedicação completa, quer em regime de dedicação parcial”.

Comparando com os números de 2021, os três grandes hospitais privados terão feito mais cerca de 900 partos do que dois anos antes, quando os nascimentos em Portugal ficaram, pela primeira vez, abaixo dos 80 mil. Mas Nuno Clode, presidente da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal​ e coordenador do serviço de ginecologia e obstetrícia do Hospital CUF de Torres Vedras, volta a defender que “os privados não têm capacidade para ser alternativa ao SNS”, até porque estão “no limite", uma vez que "foram dimensionados para um determinado número de partos.

O ex-ministro da Saúde Manuel Pizarro anunciou, por diversas vezes, a intenção de fechar maternidades privadas e do sector social sem condições para continuarem abertos. Mas para isso avançar era necessário definir regras para os licenciamentos. Uma fonte adiantou ao PÚBLICO que a portaria que permitiria concretizar esta intenção — obrigando a que as maternidades com menos de 700 partos por ano e taxas de cesarianas superiores a 50% fechassem portas, exceptuando as localizadas nos distritos do interior, como Bragança, Guarda, Castelo Branco, Portalegre, Beja ficou na pasta de transição do Governo. Questionado sobre esta matéria, o gabinete da ministra da Saúde não respondeu.

A actual legislação determina que nas unidades de obstetrícia e neonatologia sem urgência aberta (como é o caso dos privados) é obrigatório ter um obstetra responsável pela grávida, um pediatra com diferenciação em neonatologia e um anestesiologista em regime de prevenção. Já nas unidades de apoio perinatal com urgência aberta no SNS, segundo as regras da Ordem dos Médicos, o número de obstetras deve oscilar entre um mínimo de dois em presença física, nos hospitais mais pequenos, mas pode chegar até os cinco ou seis nos mais diferenciados (quando fazem mais de 2500 ou mais de 3500 partos por ano, respectivamente).

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