Ainda não estamos a passar uma onda de calor, mas é provável que chegue em breve

Nos últimas décadas, as ondas de calor têm sido mais frequentes, mais intensas e estendem-se para períodos menos comuns, como a Primavera e o Outono.

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Beja, Évora e Portalegre vão estar sob aviso laranja na sexta-feira Rui Gaudêncio
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Nas últimas semanas, têm-se repetido os avisos amarelos devido ao calor um pouco por todo o país. As temperaturas (ainda) não configuram uma onda de calor, mas “há uma probabilidade elevada” de o fenómeno chegar nos próximos dias, explica Ricardo Deus, responsável pela Divisão de Clima do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).

Nesta quinta-feira, 15 de Agosto, 11 distritos estão sob aviso amarelo e na sexta-feira, 16, Beja, Évora e Portalegre vão estar com aviso laranja. Nos Açores, o aviso amarelo — o mais baixo de três níveis foi emitido para quinta e sexta-feira e a Região Autónoma da Madeira está sob aviso amarelo, prevendo-se que entre sexta-feira e sábado suba para aviso laranja.

O que se tem sentido é “perfeitamente usual” no Verão, diz o especialista. O calor está a ser provocado pela crista anticiclónica dos Açores, que se vai deslocar até ao território continental e “estimular uma circulação de leste que transporta massas de ar mais quentes e secas” provenientes do interior da Europa.

Esta “fórmula” é a que, de forma geral, dá origem a vários dias seguidos de calor. Se durante pelo menos seis dias consecutivos a temperatura máxima do ar for superior em cinco graus Celsius relativamente ao valor médio das máximas diárias entre 1961 e 1990, a Organização Meteorológica Mundial considera que um território está a ser atingido por uma onda de calor.

As ondas de calor são um fenómeno relativamente recorrente em Portugal, mas, nas últimas décadas, além de serem mais frequentes, “também se espalham para períodos do ano que não eram tão comuns”, como o final da Primavera ou nos meses de Outono, acrescenta Ricardo Deus.

“Pontualmente, também aumenta o número de dias da onda de calor”, e esta já não fica restringida à região sul, no Alentejo. Têm-se verificado ondas de calor que podem chegar a Trás-os-Montes, por exemplo.

Associando estas mudanças às alterações climáticas, o especialista do IPMA sublinha que “num cenário de um clima, em termos médios, mais quente, poderá criar algumas situações mais alarmistas do que temos vindo a assistir”. O continente europeu é o que regista o aquecimento mais rápido a nível global. Na Europa, de acordo com um relatório do Instituto de Saúde Global de Barcelona, o calor matou mais de 47 mil pessoas em 2023, o ano mais quente de que há registo no mundo. Em Portugal, fez 1432 vítimas mortais.

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Por ano, em contexto laboral, morrem 18.970 pessoas devido ao excesso de calor, segundo um relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No mesmo documento, a entidade refere que, de entre os 3,4 mil milhões de trabalhadores em todo o mundo, cerca de 71% sofre de exposição ao excesso de calor e, num relatório de Abril, alerta para os perigos do trabalho num mundo em alterações climáticas.

A única solução para ir mitigando o problema é “adaptar” o dia-a-dia, as casas, as cidades, nunca esquecendo que este é “um problema à escala global e tem de ser visto dessa forma”, sublinha Ricardo Deus.

Um relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) dá conta dos vários cenários que os europeus podem enfrentar em termos de stress térmico entre 2040 e 2060. As projecções baseiam-se no desenvolvimento socioeconómico e no tipo de medidas de mitigação que os governos decidirem implementar e usa como base o cenário de stress térmico entre 1986 e 2005. Os valores são calculados tendo em conta os dias de onda de calor, a vulnerabilidade da população e a sua exposição a altas temperaturas.

Só num cenário em que há redução imediata das emissões e é possível parar o aumento da concentração de gases com efeito de estufa na atmosfera, Portugal não viverá em alto stress térmico. Mas mesmo no cenário mais optimista há zonas onde o vermelho denuncia um nível de stress bastante superior ao registado entre 1986 e 2005.

Nos cenários menos positivos, em que pouco ou nada é feito para travar os efeitos das alterações climáticas e a tendência do mundo é tornar-se mais desigual, prevê-se que o sul da Europa sucumba a níveis muito altos de stress térmico, o que poderá, entre outras consequências nefastas, causar cada vez mais óbitos devido ao calor.

No primeiro semestre de 2024, segundo noticia o The Guardian, 15 países quebraram recordes de temperatura máxima. Maximiliano Herrera, especialista em clima, diz que “esta quantidade de eventos de calor extremo vai para além de tudo o que já viu e achava possível”. O México atingiu 52 graus Celsius, no Egipto sentiram-se 50,9. No Chade, os termómetros já marcaram 48 graus Celsius duas vezes este ano e os recordes continuam a ser superados desde as Maldivas até ao Gana, de Mali até Laos.