Vice-presidente iraniano demite-se por causa de um governo de segundas escolhas
Zarif afirma que falta reformismo na proposta apresentada pelo Presidente, apesar de contar com um moderado nos Negócios Estrangeiros e de incluir aquela que é apenas a segunda ministra desde 1979.
O vice-presidente para os Assuntos Estratégicos do Irão, Mohamad Javad Zarif, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros e principal negociador iraniano com a comunidade internacional, anunciou, no domingo, a sua demissão do cargo, em protesto pelas escolhas do Presidente, Masoud Pezeshkian, para o seu Governo.
Pouco depois de a lista de ministros ter sido submetida ao Parlamento, um desiludido Zarif recorreu às redes sociais para manifestar a sua tristeza com um executivo carregado de segundas escolhas e que em nada se assemelha a um governo reformista como a eleição do moderado Pezeshkian poderia antecipar.
"Não estou satisfeito com o resultado do meu trabalho e envergonho-me de não ter conseguido obter aquilo que tinha sido o parecer dos peritos das comissões, bem como a inclusão das mulheres, dos jovens e dos grupos étnicos, como tinha prometido", afirmou, antes de anunciar o seu regresso à universidade, onde era professor, e de pedir desculpa ao povo iraniano pela sua "incapacidade para acompanhar os assuntos da política interna".
De acordo com o vice-presidente agora demissionário, dos 19 ministros nomeados pelo Presidente apenas três são primeiras escolhas da comissão responsável pela selecção dos candidatos. Mais de metade dos novos detentores das pastas (dez) nem sequer fazia parte da lista de recomendações da comissão.
O Governo de Pezeshkian é visto como um retrocesso até na questão da idade: o novo Presidente prometera que 60% dos ministros teriam menos de 50 anos, mas, na verdade, a média de idades do executivo é de 52 anos. Mais do que isso, mais de uma dúzia de ministros já o tinham sido em governos anteriores, o que sugere uma continuidade.
Depois de ter sido um dos membros mais activos na campanha eleitoral de Pezeshkian, Zarif tinha sido nomeado há menos de duas semanas para o cargo de vice-presidente para os Assuntos Estratégicos, um cargo que não requer a aprovação do Parlamento, e chefe do conselho de administração responsável pela selecção dos candidatos a vários cargos governamentais.
A lista de 19 nomes apresentada no domingo começou a ser analisada nesta segunda-feira pelo Parlamento, onde os ultraconservadores que o dominam terão de a confirmar. O facto de Pezeshkian ter escolhido o moderado Abbas Araghchi, um diplomata de carreira de 61 anos, para liderar o Ministério dos Negócios Estrangeiros é visto como um bom sinal pela ala reformista. Araghchi foi o chefe dos negociadores iranianos nas conversações com as grandes potências sobre o programa nuclear iraniano e exerceu como vice-ministro de Zarif quando este chefiou o ministério.
Outro sinal de avanço na lista apresentada pelo novo Presidente é a inclusão de uma mulher, Farzaneh Sadegh, como ministra de Desenvolvimento Urbano e das Estradas. Se passar pelo crivo dos deputados, a actual chefe de uma das direcções do ministério será apenas a segunda ministra desde que a República Islâmica foi criada em 1979, depois de Marzieh Vahid Dastjerdi ter sido nomeada ministra da Saúde em 2009. Mas a julgar pelos apupos no Parlamento quando o seu nome foi apresentado no domingo, Farzaneh Sadegh terá de superar muitas resistências.
A proposta apresentada por Pezeshkian passará primeiro pelas comissões especializadas antes de ser votada no plenário do Parlamento iraniano no próximo sábado.