Sult Cascais: baptismo dinamarquês, origem brasileira e gastronomia italiana
Nelson Soares trouxe do Rio de Janeiro o conceito para o centro de Cascais e espera o sucesso conquistado do lado de lá do Atlântico, mas com um toque português.
Nelson Soares recebe-nos de braços abertos e vai interrompendo a apresentação do espaço à medida que chegam clientes. A hora do almoço ainda é uma novidade e há que acolher bem os curiosos. O Sult Cascais fica numa das ruas com mais restaurantes da vila, perto da Lota da Esquina, de Vítor Sobral. Uma localização muito diferente da casa-mãe, no Rio de Janeiro, numa "área degradada", onde havia "muito potencial", no bairro de Botafogo, conta o chef e responsável pela abertura em Portugal. Sult significa "fome" em dinamarquês e o nome é uma homenagem ao Mangia, um restaurante italiano, em Copenhaga.
Se no Rio de Janeiro a decoração é muito nórdica, em Cascais não há dúvidas de que estamos num restaurante de gastronomia italiana. As molduras douradas e todas de diferentes dimensões evocam a Itália e os italianos, a preto e branco. À entrada existe uma mesa alta e mais próximo da cozinha (parcialmente aberta) está a mesa do chef. Tudo foi pensado pelo estúdio do arquitecto brasileiro Sidney Quintela. Lá fora há uma esplanada de 25 lugares.
É sexta-feira, hora de almoço, e o Sult Cascais decidiu recentemente expandir o seu horário para a hora do almoço, mas apenas ao fim-de-semana, de sexta-feira a domingo. O resto da semana, a partir de terça-feira, mantém-se aberto só à hora de jantar. O menu não varia muito do jantar, mas Nelson Soares propõe um tártaro de peixe, tudo depende do que trouxer da lota; um crudo de vieiras e ostras. "E vinho", acrescenta o brasileiro, de garrafa na mão para servir os jornalistas. Há uma aposta grande no vinho, diz, fazendo referência a uma série de novos produtores, em regiões portuguesas, que também são brasileiros, congratula-se.
A carta tem cerca de 150 referências, apostando em pequenos produtores, mas também em vinhos diferentes dos clássicos, como os naturais e biodinâmicos, sem esquecer os espumantes e champanhes, cerca de duas dezenas de referências. A consultoria cabe a Julieta Carrizzo — "consagrada sommelier italiana" com "inúmeros prémios no Brasil", e que também está radicada em Portugal e assume o papel de chefe de sala —, mas Nelson Soares também tem uma palavra a dizer. "A paixão pelos vinhos nasceu com a paixão pela comida", justifica.
Nelson Soares lembra que era criador de carneiros e que se tornou conhecido por gostar de cozinhar, quando decidiu abrir o restaurante do Rio de Janeiro, em 2019, com um sócio cuja mulher é dinamarquesa. A pandemia rebentou pouco tempo depois, foram anos difíceis como aconteceu com toda a restauração, mas o espaço começou a ser conhecido. "É um restaurante italiano com influência brasileira e começou a sair [na comunicação social]", mas também a ser reconhecido, o que foi criando uma "clientela muito fiel".
O Sult Botafogo recebeu reconhecimento do Bib Gourmand, do Guia Michelin, um selo que reconhece os restaurantes com "boa qualidade e bom preço". Está na lista dos 50 Best Discovery e na Louis Vuitton City Guide. E todos estes selos geraram fenómenos como "duas horas de espera" para experimentar um prato italiano, orgulha-se Nelson Soares.
Entretanto, o sócio investidor veio viver para Cascais, onde confirmou que existe uma "cultura italiana muito forte" e o desejo foi replicar o sucesso do restaurante do Rio perto da baía de Cascais, continua o chef-executivo, à medida que pede os pratos à cozinha. "Vamos ter outros projectos, como em Tróia, para o ano", promete. Mas o Sult Cascais não é uma réplica do de Botafogo, salvaguarda. "Há pratos que são icónicos lá e trouxe para cá, como a lasanha ou o cogumelo grelhado", exemplifica. Outros são inspirados, mas têm ingredientes tipicamente portugueses com o Arancini com queijo de Azeitão e não da Serra da Canastra. "Queria misturar o regionalismo português com o italiano", resume.
Há laranja do Algarve, lingueirão do Sado, porco alentejano, alheira — "eu sempre amei alheira, mas esta é mais delicada", diz, servindo o Arancini de Alheira com queijo de Azeitão. As massas são todas feitas no restaurante, excepto o esparguete que chega de Puglia. A carta foi muito pensada. "Acho que foi a minha carta que nos pôs no mapa no Brasil", reconhece Nelson Soares que partilha com os jornalistas a Lasanha com fonduta de parmigiano reggiano; o tortellini de espargos e mascarpone com molho de pecorino, gemas e trufa; o Cabrito de leite assado com puré de batata doce e bimi grelhado; o Risoto de pato confit com foie gras e funghi porcini; e o Parpadelle ao ragu de porco preto.
Segue-se uma partilha das sobremesas que o chef elege: o Bolo de chocolate com praliné de avelã; o Tiramisù al pistacchio; e a Torta al limone e basilico. Depois de provar tantos pratos, a sobremesa de limão é a eleita pela Fugas para limpar o palato e saborear o doce da telha de amêndoa e o lemon curd que a acompanha. "Barriga cheia, companhia desfeita", diz o ditado, é tempo de despedidas. Nelson Soares despede-se com um abraço igual ao das boas-vindas e promete: "Estamos para ficar a longo prazo."
O Fugas almoçou a convite do Sult Cascais