Só o ouro, o total de medalhas ou a população: como medir o êxito olímpico?

O medalheiro olímpico não é consensual e têm surgido outros modelos de medição do sucesso, incluindo um que cruza as probabilidades com a população de cada país.

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Os EUA terminaram os Jogos de Paris na primeira posição, pela métrica do ouro e do total de medalhas Brian Snyder / REUTERS
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A Grã-Bretanha encerrou a prestação em Paris 2024 com um total de 65 medalhas, mais do que os Países Baixos, a França, a Austrália ou o Japão, tudo países que ficaram em melhor posição no medalheiro final. Os britânicos terminaram no sétimo posto e, na prática, só a China (em segundo lugar, com 91 medalhas) e o campeão EUA (126) somaram mais presenças no pódio. Porquê? Simples. Porque o Comité Olímpico Internacional (COI) utiliza como métrica o número de títulos conquistados.

A discussão é recorrente e, em rigor, não há uma fórmula que seja consensual. Os EUA, por exemplo, não concordam com este critério e usam a sua própria bitola, que privilegia o conjunto das medalhas conquistadas. Ou seja, o Comité Olímpico norte-americano ordena o medalheiro em função do total de medalhas arrecadadas por cada país, o que significa que a Grã-Bretanha, só para utilizar a referência de há pouco, fechou os Jogos no terceiro posto.

Podemos considerar que seja por uma questão de conveniência, tendo em conta que em muitos casos a China acaba por ganhar o braço-de-ferro porque coloca mais ouro na balança, mas isso não retira interesse à discussão. É especialmente delicado encontrar parâmetros que reflictam efectivamente o potencial e as condições de cada país se atendermos somente a qualquer uma destas duas abordagens. Mas qual seria a alternativa?

Bem, antes de mais, é imperioso notar que a escala faz toda a diferença. Basta ver que neste século só a China e os EUA lideraram o medalheiro no final de cada edição dos Jogos, dois países que integram o top três dos mais populosos do mundo e que, curiosamente (ou talvez não), também encabeçam a lista quando o tema é Produto Interno Bruto (PIB). Talvez por isso existam sites que permitem uma leitura comparada, que considere, por exemplo, as medalhas per capita.

E o que aconteceria se fosse este o barómetro usado? Bem, o primeiro do ranking seria Granada, país do Caribe que em Paris 2024 somou duas medalhas apenas mas tem uma população pouco superior a 112 mil habitantes. A título de curiosidade, Portugal terminaria em 46.º (no ranking oficial foi 50.º), enquanto as grandes potências do desporto, os EUA e a China, terminariam num improvável 47.º e 75.º postos.

Há, porém, uma “corrente” alternativa na contabilização do mérito olímpico. O astrofísico aposentado Robert C. Duncan e o consultor de estratégia Andrew Parece publicaram, no Journal of Sports Analytics, um artigo em que sugerem um ranking distinto, que trabalha essencialmente com probabilidades. Chamaram-lhe rankings nacionais de probabilidades ajustadas, um nome complexo para um sistema que procura minimizar os desequilíbrios na análise.

No fundo, pretender seriar os países nos Jogos Olímpicos segundo uma lógica que calcula quão provável seria ganhar uma medalha se todos os competidores tivessem a mesma propensão per capita para a vitória. Ou, traduzido de forma mais simples, procura fazer corresponder a expectativa de medalhas à população residente em cada território. Um exemplo: como Espanha tem um número de habitantes sensivelmente quatro vezes superior ao de Portugal, teria quatro vezes mais possibilidades de vencer medalhas.

Andrew Parece ajuda a compreender o raciocínio da seguinte forma: “O modo como eu o descrevo é quantas medalhas esperaríamos que um país ganhasse se a única coisa que soubéssemos sobre ele fosse a sua população”. E para isso cruza duas perspectivas: quantas medalhas é expectável que um país ganhe e quão improvável é que venha a ganhar mais do que se projectava. Com recurso, claro, a fórmulas matemáticas e estatísticas assentes no conceito de distribuição binomial.

E o que acontece, na prática, quando aplicamos este método? A Portugal, nada de muito diferente, já que terminaria em 48.º lugar. O mesmo não pode dizer-se da China, que passaria do segundo lugar para o penúltimo, só atrás da Índia (para este efeito, a equipa olímpica de refugiados e os atletas que competem como neutros não são contabilizados). Lá está, é a escala populacional a fazer a diferença. O vencedor, já agora, seria a Austrália, enquanto a França e a Grã-Bretanha fechavam o pódio. Os EUA terminariam em quinto, atrás também dos Países Baixos.

Claro que, como noutros modelos, há nuances que podem enviesar os resultados, como o número de provas em que cada país se qualifica ou até o investimento específico que é dedicado a uma determinada modalidade. Certo é que haverá sempre quem prefira um ou outro prisma e esta abordagem será apenas mais uma a juntar à lista. A que conta, para efeitos “oficiais”, continua a ser a dos títulos olímpicos.

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