Clima tornou condições propícias a incêndios no Pantanal quatro vezes mais prováveis, diz WWA
Altas temperatura, vento e seca permitiram a força dos incêndios em Junho no Pantanal brasileiro com um impacto 40% mais forte devido às alterações climáticas, adianta o World Weather Attribution.
Os fortes incêndios que queimaram 440 quilómetros quadrados (km2) de terras durante o mês de Junho no território brasileiro do Pantanal, no Sudoeste do país, foram possíveis devido a condições recorde de temperatura, de vento, de seca e a uma humidade relativa muito baixa. Porém, esta situação tornou-se quatro a cinco vezes mais provável e teve um impacto 40% mais forte devido ao aquecimento global produzido pelos humanos, de acordo com um estudo da World Weather Attribution (WWA) divulgado nesta quinta-feira.
“As alterações climáticas superalimentaram os incêndios no Pantanal”, refere a investigadora Clair Barnes, uma das autoras do estudo, citada num comunicado da WWA. Este projecto internacional feito de uma forma colaborativa tem tentado avaliar de uma forma rápida se fenómenos extremos, como foi o caso dos recentes incêndios do Pantanal em Junho, são mais prováveis devido às emissões de gases com efeito de estufa, provocadas pela actividade humana.
Nos últimos anos, a WWA tem divulgado vários estudos que comprovam este tipo de relação. Este é mais um. “À medida que os combustíveis fósseis aquecem o clima, as zonas húmidas [como as do Pantanal] aquecem, ficam mais secas e tornam-se uma caixa de fósforos. Isto significa que pequenos incêndios podem tornar-se em incêndios devastadores, independentemente de como se iniciaram”, sublinha Clair Barnes, que pertence ao Instituto Grantham, do Imperial College.
O impacto dos incêndios do Pantanal em 2024 arrisca-se a atingir as mesmas proporções do dos incêndios de 2020, quando 39.000 km2 foram queimados (a área de Portugal é cerca de 92.000 km2), matando 17 milhões de vertebrados, de acordo com as estimativas da altura.
Este ano já foram queimados ao todo 12.000 km2 — cerca de metade da área da Bélgica e 8% do bioma do Pantanal no Brasil —, naquilo a que o comunicado já descreve como sendo “uma temporada de incêndios florestais devastadora”. O Pantanal é um território marcado por uma enorme área de zonas húmidas, a maior do mundo. Anualmente, a época de inundações vai de Novembro a Abril, e a época seca vai de Maio a Outubro, com o pico dos incêndios em Agosto e Setembro. Mas em 2024 o impacto deste fenómeno veio mais cedo.
“Os incêndios iniciaram-se no final de Maio, invulgarmente cedo no ano, a seguir a uma temporada de chuvas extremamente seca”, lê-se no comunicado. Em Junho, o problema aumentou. A média da área incendiada no mês de Junho é apenas de 8,3 km2. Mas este ano foi de 440 km2, um valor recorde que em termos de área fica um pouco abaixo da do Algarve, com 5018 km2. Por comparação, o anterior recorde de área queimada no Pantanal para o mês de Junho foi de 257 km2.
Vem aí o pior ano?
A equipa da WWA foi analisar as particularidades meteorológicas de Junho, facilitadoras da propagação de incêndios florestais, e, a partir dos modelos climáticos, avaliou o papel das alterações climáticas no surgimento daquelas condições meteorológicas. “Foi o Junho mais seco, mais quente e mais ventoso desde o início das observações. Apenas a humidade relativa foi a segunda mais baixa nos registos”, de acordo com o sumário do estudo.
A partir do que analisaram, os cientistas concluíram que as probabilidades de haver aquelas condições foram 4,6 vezes superiores, com um aumento médio de temperatura global de 1,2 graus Celsius à superfície. Dito de outro modo, antes da época pré-industrial e do aquecimento global de origem antropogénica, a probabilidade de aquelas condições ocorrerem num mês de Junho era de uma em 161 vezes. Com uma temperatura mundial 1,2 graus acima da média pré-industrial — que será próximo do que estamos a viver —, a probabilidade passou a ser de uma em 35. Se a temperatura média da Terra continuar a subir e atingir os dois graus, então a probabilidade passará para uma em 17, o dobro da actual.
Mas, para já, a temporada de incêndios no Pantanal ainda não acabou. “Os incêndios florestais no Pantanal deste ano têm o potencial de se tornarem os piores de sempre”, adiantou Filippe Santos, investigador da Universidade de Évora, que também esteve envolvido no estudo. “São esperadas condições ainda mais quentes nos próximos meses e há uma ameaça considerável de que os incêndios possam queimar mais do que 30.000 km2 quadrados de área”, disse, citado no comunicado.